sábado, 16 de fevereiro de 2008

Os poderes contra os cidadãos - 15 -

Como eu lia a "Història de um lavrador", de Erckmann-Chatrian, eu vivia, pela imaginação, no tempo da Revolução francesa; eu procurava compreender como esse povo, tanto tempo tiranizado, despojado e desprezado, havia mostrado tão de repente sua potência, simplesmente através sua confiança nele mesmo; mas eu admirava também essa astùcia dos privilegiados que prometiam sempre e depois retiravam suas promessas, e que passavam de uma louca confiança ao terror louco, segundo às aclamações e os estrondos populares. Assim que as coisas voltavam a uma espécie de equilibrio, eles tinham novamente esperança na velha arte de governar, experimentada por tantos séculos; sempre a moderação deslizava para a traição, sempre o poder absoluto se fechava em uma espécie de cristalização inevitàvel. O Império, a Restauração, o Império novamente, agrouparam as mesmas forças; toda a elite sempre se encontrou no centro, se recrutando da mesma maneira, tentando a mesma resistência enfurecida; e sempre os sucessos surpreendentes lhe deram razão. Aqueles que dizem que a monarquia é um estado natural no qual nòs voltamos sempre, dizem uma coisa assaz evidente. E para mim os reacionàrios de hoje se parecem com aqueles desses tempos de outrora.
Existe uma corte, hoje como outrora, e cortejadores, mesmo sem rei. Existe uma vida rica e enfeitada; o homem que se permite de entrar nela perde para sempre a liberdade de seu julgamento. È inevitàvel. A vida que acontece no baile, no jantar, no teatro, na arte de se vestir, é uma espécie de prova por ela mesma, e muito poderosa. E a opinião acadêmica, que é a opinião das mulheres mais brilhantes, dos escritores, dos dansarinos, dos advogados, dos médicos, de todos os ricos enfim e seus parasitas, a opinião acadêmica logo vai limpar o espìrito de qualquer ambicioso.
Que um homem de boa fé queira voluntariamente refletir nisso, que um sucesso qualquer, no mundo que faz sucesso, possa se medir exatamente à quantidade do espìrito monàrquico que pode se mostrar.
E a elite, apesar de uma frivolidade aparente, sabe muito bem reconhecer o mais pequeno grão de traição; cada um é pago na hora, e segundo seu mérito. De maneira que é preciso dizer que a medida que um homem se empurra no mundo, ele é mais estreitamente amarrado. " O pensamento de um homem no seu lugar, é seu tratamento", essa forte màxima de Proudhon encontra sua aplicação desde que nòs temos um elevador, um carro e um dia de recepção. Não tem nenhum escritor que possa viver de sua pluma e ao mesmo tempo desprezar abertamente esse gênero de avantagens. Nòs podemos considerar, mas é preciso passar nesse caminho; ou então viver como um selvagem, eu quero dizer renunciar a toda espécie de Importância.
Nòs nos perguntamos sempre porquê os reacionàrios têm confiança nos traidores, que seguiram visivelmente o pròprio interesse deles, e vão ingenuamente do lado onde està a lisonja. Mas justamente a traição é uma espécie de garantia, se nòs ousamos dizer; pois o interesse nunca muda, ele não està ora aqui, ora ali; ele puxa sempre à direita. De maneira que aquele que traiu seu povo aparece como dominado para sempre pelo luxo, pela vida fàcil, pelos elogios, pelo salàrio enfim do Homem de Estado. O outro partido não oferece nada igual. Então nunca existe duas espécies de traição, sò existe uma. Toda fraqueza de qualquer homem o puxa do mesmo lado. A declive està na direita.

- 12 mars 1914 -

- Alain - Propos sur les pouvoirs - Pg. 61 - 62 -

Nenhum comentário: