Nòs falamos de instrução, de reflexão, de cultura; nòs anunciamos que isso mudarà tudo; nòs observamos que isso não muda nada. Na realidade, é exercida uma pressão contìnua e muito hàbil destinada ao espìrito. Existe uma maneira de ensinar, que seja ciência, ou lìnguas, ou història, que se dirige obstinadamente contra o espìrito. O antigo aprendizado, que é apenas escravidão, està de retorno em todos os lugares, [.....]. Em suma, eu digo que o espìrito ainda não fez nada; mas é porque ele ainda não despertou. Nòs veneramos um amontoado de pedras enormes, e os verdadeiros crentes trazem cada dia uma pedra a mais. Tal é a sepultura de Descartes.
Seria preciso ousar, nòs não ousamos de maneira alguma. Mas nòs sabemos exatamente alguma coisa? A doutrina do julgamento livre està profundamente enterrada. Eu vejo apenas crentes. Eles têm esse escrùpulo, de sò acreditar no que é verdadeiro. Mas o que nòs acreditamos nunca é verdadeiro. O pensamento desperta um pouco, às apalpadelas e cai no ser; de repente, ele é coisa e tratado como coisa. Imaginem um estudante que procura uma solução que seja um nùmero, ou uma construção geométrica, ou a tradução de um verso em latim ou de um verso inglês.
Ele a procura, e é um mal estar e um pequeno suplìcio de procurar. Se ele a lê do canto do olho por cima do ombro de seu vizinho, ele se joga nela, ele é salvo; enfim ele pensa. Se ele a lê no seu pròprio papel, ou no seu pròprio discurso interior, ele se joga nela mais ainda; ele chama isso seu pensamento. Ele ganhou, tudo foi dito. Eu o comparo a um homem que cava, e que não sabe se preservar, nem pular para tràs; ele deixa seu instrumento sobre o caderno, talvez sua mão, talvez ele mesmo inteiramente. As provas são como armadilhas, um homem instruìdo é um homem em uma gaiola; cada conhecimento acrescenta um novo obstàculo. A regra de três prende o pequeno estudante, e o sistema prende o grande homem. Na Bastille também, existiam prisões mobiliadas, e outras desprezìveis para o pequeno povo.
Do que se trata então? È preciso dizer. Trata-se do espìrito de Sòcrates, do espìrito de Montaigne, do espìrito de Descartes. Trata-se de uma certa maneira de acreditar, e mesmo do verdadeiro, que deixa o espìrito inteiramente livre e todo novo. Descartes, em momentos admiràveis, pesa sua pròpria fìsica, reconhece nela suposições, ele diz, certamente falsas, e outras com certeza duvidosas. È essa maneira de se assegurar que salva o espìrito. Uma bela proposição de matemàtica é verdadeira segundo o espìrito, pela ordem e pela sequência das noções; mas, com relação ao objeto, ela é apenas uma razoàvel preparação para pensar. O quìmico inventa os àtomos e em seguida os decompõe em àtomos menores que gravitam como planetas em torno de algum sol; bela màquina para pensar mais adiante; bela construção; idéia. Mas se ele acredita que é uma coisa, que é verdade, que o objeto é dessa maneira, não existe mais pensador.
Aonde eu vou ? Sò existe um objeto que é o homem na sociedade e no mundo. E cada um, apòs séculos, tomou o partido de acreditar antes de saber. Ora, esse acreditar fanàtico é a fonte de todos os males humanos; pois nòs não analisamos o acreditar, nòs nos jogamos nele, nòs nos fechamos nele, e até esse ponto extrêmo de loucura onde é ensinado que é bom acreditar cegamente. È sempre religião; e a religião, por causa de seu pròprio peso, desce até a superstição.
Sigam as atitudes de uma partidàrio; mesmo os gritos, mesmo um empurrão feliz lhe fazem o efeito de provas. O poder volta, como régua do espìrito; e segundo a lei de potência, ele volta inteiro. Tal é o espìrito de guerra e de dominação que não està apenas no déspota, mas também no escravo. Existem coisas provadas; està claro; nòs não pensamos mais nelas; e voilà o pensamento. Ora, olhem bem, eu digo que o conteùdo não importa, e que a maneira de acreditar estraga tudo. Sobretudo que o déspota razoàvel não é durante muito tempo razoàvel. È preciso então que os homens tomem o partido de julgar, de pensar, de duvidar.
Obedecer, é preciso; mas nada é mais simples e nada é mais sadio, se simplesmente nòs recusamos de acreditar, se simplesmente o espìrito se preserva. E vocês verão, sob esses olhares atentos e livres, fortalecidos pelo saber verdadeiro, vocês verão como o déspota seria rapidamente um bom pequeno rei.
- 14 décembre 1929-
Alain - Propos sur les pouvoirs -
Seria preciso ousar, nòs não ousamos de maneira alguma. Mas nòs sabemos exatamente alguma coisa? A doutrina do julgamento livre està profundamente enterrada. Eu vejo apenas crentes. Eles têm esse escrùpulo, de sò acreditar no que é verdadeiro. Mas o que nòs acreditamos nunca é verdadeiro. O pensamento desperta um pouco, às apalpadelas e cai no ser; de repente, ele é coisa e tratado como coisa. Imaginem um estudante que procura uma solução que seja um nùmero, ou uma construção geométrica, ou a tradução de um verso em latim ou de um verso inglês.
Ele a procura, e é um mal estar e um pequeno suplìcio de procurar. Se ele a lê do canto do olho por cima do ombro de seu vizinho, ele se joga nela, ele é salvo; enfim ele pensa. Se ele a lê no seu pròprio papel, ou no seu pròprio discurso interior, ele se joga nela mais ainda; ele chama isso seu pensamento. Ele ganhou, tudo foi dito. Eu o comparo a um homem que cava, e que não sabe se preservar, nem pular para tràs; ele deixa seu instrumento sobre o caderno, talvez sua mão, talvez ele mesmo inteiramente. As provas são como armadilhas, um homem instruìdo é um homem em uma gaiola; cada conhecimento acrescenta um novo obstàculo. A regra de três prende o pequeno estudante, e o sistema prende o grande homem. Na Bastille também, existiam prisões mobiliadas, e outras desprezìveis para o pequeno povo.
Do que se trata então? È preciso dizer. Trata-se do espìrito de Sòcrates, do espìrito de Montaigne, do espìrito de Descartes. Trata-se de uma certa maneira de acreditar, e mesmo do verdadeiro, que deixa o espìrito inteiramente livre e todo novo. Descartes, em momentos admiràveis, pesa sua pròpria fìsica, reconhece nela suposições, ele diz, certamente falsas, e outras com certeza duvidosas. È essa maneira de se assegurar que salva o espìrito. Uma bela proposição de matemàtica é verdadeira segundo o espìrito, pela ordem e pela sequência das noções; mas, com relação ao objeto, ela é apenas uma razoàvel preparação para pensar. O quìmico inventa os àtomos e em seguida os decompõe em àtomos menores que gravitam como planetas em torno de algum sol; bela màquina para pensar mais adiante; bela construção; idéia. Mas se ele acredita que é uma coisa, que é verdade, que o objeto é dessa maneira, não existe mais pensador.
Aonde eu vou ? Sò existe um objeto que é o homem na sociedade e no mundo. E cada um, apòs séculos, tomou o partido de acreditar antes de saber. Ora, esse acreditar fanàtico é a fonte de todos os males humanos; pois nòs não analisamos o acreditar, nòs nos jogamos nele, nòs nos fechamos nele, e até esse ponto extrêmo de loucura onde é ensinado que é bom acreditar cegamente. È sempre religião; e a religião, por causa de seu pròprio peso, desce até a superstição.
Sigam as atitudes de uma partidàrio; mesmo os gritos, mesmo um empurrão feliz lhe fazem o efeito de provas. O poder volta, como régua do espìrito; e segundo a lei de potência, ele volta inteiro. Tal é o espìrito de guerra e de dominação que não està apenas no déspota, mas também no escravo. Existem coisas provadas; està claro; nòs não pensamos mais nelas; e voilà o pensamento. Ora, olhem bem, eu digo que o conteùdo não importa, e que a maneira de acreditar estraga tudo. Sobretudo que o déspota razoàvel não é durante muito tempo razoàvel. È preciso então que os homens tomem o partido de julgar, de pensar, de duvidar.
Obedecer, é preciso; mas nada é mais simples e nada é mais sadio, se simplesmente nòs recusamos de acreditar, se simplesmente o espìrito se preserva. E vocês verão, sob esses olhares atentos e livres, fortalecidos pelo saber verdadeiro, vocês verão como o déspota seria rapidamente um bom pequeno rei.
- 14 décembre 1929-
Alain - Propos sur les pouvoirs -
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