quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A loucura dos direitos humanos


Ao ministro não ocorreu que a multiplicação de direitos se faz sempre por oposição: da criança contra a família biológica, da mulher contra o marido, do adolescente contra os progenitores, dos consumidores contra os produtores, e assim por diante.

Eu ganhei de um dileto amigo um exemplar do livro Tratado Luso-brasileiro da Dignidade Humana, em sua segunda edição atualizada e ampliada (Editora Quartier Latin do Brasil, São Paulo, 2009), obra gigantesca que contem quase 1500 páginas, escrita por dezenas de autores. De imediato ela me chamou a atenção, menos pelo volume e mais pelo conteúdo. Ali está condensada a nossa loucura coletiva vista desde o ponto de vista jurídico. Para mim, que tenho estudado de forma sistemática a questão da lei natural e do direito natural, foi um convite para debruçar-me imediatamente à leitura.

Comecei a ler aleatoriamente e hierarquizei por tema e autores. Fui direto à Seção II, Direitos Humanos. Acabei de ler agora os trabalhos de Carlos Velloso ("Os direitos humanos e os mecanismos constitucionais de sua defesa"), Enrique Lewandowski ("A formação da doutrina dos direitos fundamentais") e Flávia Piovesan ("Dignidade humana e a proteção dos direitos sociais nos planos global, regional e local"). Os dois primeiros integrantes do Supremo Tribunal Federal e a última procuradora e professora da cadeira de Direitos Humanos da PUC-SP.

I

O trabalho do ministro Veloso espanta porque ele foi presidente de um dos poderes da Nação e, enquanto tal, o guardião da Constituição e da ordem constitucional, da própria soberania nacional. Seu texto, levado ao pé da letra, é uma espécie de traição à nacionalidade. Ele escreveu:

"O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido da paridade hierárquica entre o tratado (internacional) e a lei federal. Esta é, também, a minha opinião. Todavia, tratando-se de tratado internacional de direitos humanos, sempre sustentei a superioridades destes. Os tratados firmados a partir da Emenda Constitucional 45/2004, terão tal superioridade, se aprovados pelo voto de três quintos dos membros das duas casas do Congresso Nacional... A doutrina sufraga o entendimento no sentido da superioridade hierárquica dos tratados de direitos humanos. Invoco, por todos, as lições de Flávia Piovesan".

O ex-ministro cassou a soberania nacional em favor da crendice dos direitos humanos emanada de entidades como a ONU e outras entidades coletivas, que se propõem a ser o germe do governo mundial. Claro que ele jamais teve delegação alguma para isso. Claro também que, como ministro oriundo da carreira jurídica, sequer obteve a legitimidade das urnas para dar um passo dessa envergadura. Ainda assim, não teve dúvida de dizer que a Nação brasileira se subordina a essa alucinação dos que lutam pelo governo mundial e fazem dos direitos humanos um instrumento para idiotizar as pessoas.

Além de Flávia Piovesan, autora que comento abaixo, uma jovem procuradora que virou militante radical da causa dos direitos humanos, Velloso invoca a autoridade de Norberto Bobbio e de Celso Lafer. O primeiro nem comento, pois já é patente que virou o maior divulgador e legitimador das idéias de Gramsci na segunda metade do século XX, terá sido o maior advogado do igualitarismo enquanto viveu. Bobbio tem sido o responsável pela guinada à esquerda de todos os operadores do direito no Brasil. O segundo, Celso Lafer, é também discípulo de Bobbio, mas dada a sua importância individual para as questões jurídicas e de direitos humanos no Brasil merecerá um comentário à parte, que farei brevemente em outro texto.

O ministro Velloso deveria saber que nenhum poder pode imperar acima da soberania nacional, menos ainda aquele oriundo de alucinações coletivas como essas idéias ridículas sobre direitos humanos.

II

O segundo texto é mais denso. O ministro Enrique Lewandowsky fez um esboço histórico da doutrina dos direitos fundamentais e também se apóia em Bobbio e Piovesan, entre outros. Vê-se que é portador de grande erudição, mas comete alguns erros crassos que, sei, não são meros erros, são expressão de sua visão de mundo, que procura adaptar os fatos históricos aos seus próprios preconceitos.

Ele está correto ao escrever que "o humanismo ocidental funda-se, basicamente, na idéia da sacralidade essencial das pessoas e na crença de que existem determinadas regras transcendentais às quais súditos e governantes estariam indistintamente submetidos". Obviamente aqui ele se remete à grande herança judaico-cristã e grega que molda a cultura ocidental.

Errou, todavia, quando escreveu: "A doutrina simples de Cristo foi mais tarde aperfeiçoada pelo apóstolo Paulo, o qual, ao longo de sua jornada em direção à Roma, passando pelo mundo helênico, introduziu na filosofia cristã os ideais estóicos do cosmopolitismo e da fraternidade entre os homens". Ora, o universalismo cristão vem de Cristo ele mesmo e nada deve aos degenerados filósofos da decadência helenística, todos eles ateus, materialistas e niilistas. Paulo jamais foi filósofo e sim, teólogo, e sua doutrina não foi além daquela professada pelo próprio Cristo. O estoicismo nada teve a dar ao cristianismo, que incorporará da Grécia as doutrinas de Platão e Aristóteles.

Esse erro inicial fará com que o ministro não compreenda o que aconteceu no século XVI, quando o mundo ocidental abraçou decisivamente os filósofos dos tempos helenísticos da Grécia, especialmente os discípulos de Epicuro e Zenon. Esses filósofos moldarão o direito moderno, bem como a ciência política, a começar por introduzir o conceito de contrato social, que fundará os direitos humanos como os conhecemos. Os direitos humanos negam não apenas Platão e Aristóteles - no que tange especificamente ao conceito de lei natural e direito natural - mas negam sobretudo a essência do cristianismo. Os direitos humanos têm raízes sofísticas, materialistas e atéias e não poderiam ser o fundamento de qualquer doutrina cristã.

Quando o ministro Lewandowsky escreveu que "Os primeiros diplomas que surgiram a partir das idéias jusnaturalistas e contratualistas assumiram o caráter de declaração porque se acreditava que os direitos dos indivíduos não constituíam uma criação do Estado, existindo antes do advento desse", esqueceu-se de informar que a idéia de direito natural clássica já estava morta nessa época, emergindo no seu lugar a visão estóica mais pura, na sua versão ciceroniana. Não custa recordar que esta visão é sempre materialista e que a divindade que suporta o direito "anterior" ao Estado é razão esparramada panteisticamente pelos homens, eles mesmos assumindo uma face divina. É o homem divinizado que dará substância à máxima de Protágoras: "o homem é a medida de todas as coisas".

Ignorar esse salto fundamental dos tempos do Renascimento é ignorar a essência da formação do direito moderno, quero dizer, do próprio conceito de direitos humanos.

Ao final do artigo ele enumera e historia a gênese dos direitos humanos de segunda, terceira e quarta geração, assunto de menor interesse aqui. Encerro frisando um trecho do que ele escreveu: "Como repara Bobbio, o problema fundamental dos direitos do homem, nos dias que correm, já não é mais conhecê-los ou justificá-los, mas protegê-los eficazmente, sobretudo para evitar as rupturas periódicas, que impedem a sal fruição, estudadas por Lafer com base nos ensaios de Arendt sobre a 'banalização do mal'".

Ao ministro não ocorreu que a multiplicação de direitos se faz sempre por oposição: da criança contra a família biológica, da mulher contra o marido, do adolescente contra os progenitores, dos consumidores contra os produtores, e assim por diante. O fracionamento e a proclamação de direitos criam enorme confusão jurídica que na prática institui a hipertrofia do aparelho judicial e policial do Estado, burocratizando e ossificando as relações outrora naturais. Ele deveria ler a obra de Michel Villey sobre o assunto.

III

O trabalho mais substantivo é o de Flavia Piovesan, que já vimos "faz a cabeça" dos autores anteriores e de muita gente do meio jurídico brasileiro. Flavia é uma ideóloga que se pretende teórica dos direitos humanos. A mim foi gratificante ler seu texto porque ele é honesto e vai direto ao ponto: "Os direitos humanos refletem um construído axiológico, a partir de um espaço simbólico de luta e ação social". Não tenta nos convencer de que haveria qualquer coisa de "natural" por detrás do discurso de direitos humanos, que é essencialmente político, propagandístico. Ela completa: "No dizer de Joaquim Herrera Flores, compõem uma racionalidade de resistência, na medida em que traduzem processos que abrem e consolidam espaços de luta pela dignidade humana. Invocam uma plataforma emancipatória voltada à proteção da dignidade humana. No mesmo sentido, Celso Lafer, lembrando Danièle Lochak, realça que os direitos humanos não traduzem uma história linear, não compõem a história de uma marcha triunfal, nem a história de uma causa perdida de antemão, mas a história d eum combate".

Retirando o floreio benevolente da suposta dignidade do homem, Piovesan nos diz que o slogan dos direitos humanos não passa de marxismo-leninismo em sua versão de Gramsci. Nem mais e nem menos. Seu texto deve portanto ser lido com o cuidado de que estamos diante de uma peça de militância política revolucionária e não de um mero tratado científico no âmbito do direito e da ciência política.

Sua grande mentira está no seguinte parágrafo: "Essa concepção é fruto do movimento de internacionalização dos direitos humanos, que surge, no pós guerra, como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o nazismo". E as atrocidades do comunismo? Claro, ela nem pode citá-las porque a causa dos direitos humanos é bandeira do movimento comunista internacional. Obviamente que ligar a bandeira de luta dos direitos humanos ao combate ao nazismo é uma falsificação primária. Primeiro porque o próprio conceito de direitos humanos nasce com Hobbes e tem na Revolução Francesa e na Americana seus precedentes declaratórios e a eles estão umbilicalmente ligados. Nada tem a ver com o nazismo, que foi morto e enterrado quando acabou a Segunda Guerra Mundial. Essa bandeira tem sido usada tão somente para implantar a alucinação igualitarista em toda parte, é inimiga da sociedade liberal e das soberanias particulares.

Os defensores da causa dos direitos humanos estão engajados na revolução mundial, em marcha para fundar a moderna Cosmópolis. O texto é uma exaltação das sucessivas declarações de direitos, dando destaque para aquela feita em Viena, em 1993. A autora, reiteradas vezes, insiste na tese de que a concepção dos direitos humanos é "marcada pela universalidade e indivisibilidade desses direitos". Ora, quando mais direitos são proclamados, mais divisões acontecem. É a esquizofrenia levada ao mais alto grau, que equipara o que é mais sagrado com o que é mais nefando, numa expressão maluca de relativismo.

A alucinação é tamanha que ela não enrubesce ao escrever: "O direito ao desenvolvimento demanda uma globalização ética e solidária", apoiando-se em autores como Joseph Stiglitz. O simples falar em direito ao desenvolvimento já mostra que a loucura escapou de qualquer parâmetro controlável, mas se justifica pela ânsia de formar a unidade das soberanias, a Cosmópolis, supostamente responsável por garantir tal direito. No fundo, essa gente que milita na causa busca mesmo a ditadura mundial, certamente o maior perigo que paira contra a humanidade neste começo de século XXI.

A autora concluiu dizendo: "Há que se fortalecer a perspectiva integral dos direitos humanos, que tem nos direitos sociais uma dimensão vital e inalienável, aprimorando os mecanismos de sua proteção e justicialidade, dignificando, assim, a racionalidade emancipatória dos direitos sociais como direitos humanos, nacional e internacionalmente garantidos". A autora é maluca e está enlouquecendo os operadores do direito com seus escritos, inclusive os ministros dos tribunais superiores. A judicialização de tudo é a mais completa maluquice que alguém poderia proferir.

Se nada for feito, em menos de uma geração o Brasil se tornará um país inviável, por força da hipertrofia jurídica derivada da proclamação em série de direito. É a forma mais satânica de fazer a revolução socialista, desde dentro do aparato legal.


http://www.midiasemmascara.org

domingo, 14 de novembro de 2010

Soberania, jusnaturalismo e contrato social

"Jusnaturalismo é a teoria do direito natural configurada nos séculos XVII e XVIII a partir de Hugo Grócio (1583 - 1645), também representada por Hobbes (1588 - 1679) e por Pufendorf (1632 - 1694). Essa doutrina, cujos defensores formam um grande contingente de autores dedicados às ciências políticas, serviu de fundamento à reivindicação das duas conquistas fundamentais do mundo moderno no campo político: o princípio da tolerância religiosa e o da limitação dos poderes do Estado. Desses princípios nasceu de fato o Estado liberal moderno. O Jusnaturalismo distingue-se da teoria tradicional do direito natural por não considerar que o direito natural represente a participação humana numa ordem universal perfeita, que seria Deus (como os estóicos julgavam) ou viria de Deus (como julgaram os escritores medievais), mas que ele é a regulamentação necessária das relações humanas, a que se chega através da razão, sendo, pois, independente da vontade de Deus. Assim, o Jusnaturalismo representa, no campo moral e político, reivindicação da autonomia da razão que o cartesianismo afirmava no campo filosófico e científico." (Nicola Abbagnano, Dicionário de Filosofia).

O liberalismo, no início da modernidade, é o correlato, na política, do individualismo e do subjetivismo na teoria do conhecimento. A concepção da existência de direitos naturais ao homem corresponde do ponto de visa epistemológico à concepção de idéia inatas e de faculdades da mente que tornam possível o conhecimento. A valorização da livre iniciativa e da liberdade individual no campo da política e da economia equivale no campo do conhecimento à valorização da experiência individual, tanto intelectual (racionalismo) quanto sensível (empirismo).

O problema central do liberalismo e da discussão política desse período é a necessidade conciliar as liberdades e os direitos individuais, concebidos como inerentes à própria natureza humana, com as exigências da vida em comunidade e, portanto, com o respeito ao direito do outro, imprescindível para o equilíbrio da vida social, bem como coma determinação de interesses e rumos comuns essenciais à vida social. No início do período moderno, a dissolução da ordem feudal, a contestação do poder temporal da Igreja e o combate à monarquia absoluta e ao estado centralizado, surgido principalmente na França do séc. XVII, criam a necessidade da busca e discussão e um novo modelo de ordem social, de organização política , de legitimação do exercício do poder, representado pelas teses dos teóricos do liberalismo e do contrato social. Essa discussão leva, em última análise, ao surgimento da democracia representativa e do sistema parlamentar, ao estabelecimento de constituições e cartas de direitos civis. O primeiro passo se dá com a Revolução Gloriosa na Inglaterra, em 1688, após a deposição de Jaime II, logo se seguindo a Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789).

Contrato Social ou contratualismo é uma doutrina que reconhece como origem ou fundamento do Estado (ou, em geral, da comunidade civil) uma convenção ou estipulação (contrato) entre seus membros. O contratualismo, na modernidade, juntamente com o jusnaturalismo (doutrina do direito natural) transforma-se em poderoso instrumento de luta pela reivindicação dos direitos humanos. Hobbes e Spinoza puseram a doutrina do contrato a serviço da defesa do poder absoluto. Assim Hobbes enunciava a fórmula básica do contrato: 'Transmito meu direito de governar-me a este homem ou a esta assembléia, contanto que tu cedas o teu direito da mesma maneira' (Leviatã). Essa, diz Hobbes, é a origem do grande Leviatã ou, com mais respeito, do Deus mortal a quem, depois de Deus imortal, devemos nossa paz e defesa, pois por essa autoridade conferida pelos indivíduos que o compõem, o Estado tem tanta força e poder que pode disciplinar à vontade todos para a conquista da paz interna e para a ajuda mútua contra os inimigos externos' (Leviatã).

Hobbes tem uma concepção da natureza humana que pode ser considerada negativa ou pessimista: considera o homem como naturalmente agressivo e belicoso. O 'estado de natureza, ou natural' em que o homem se encontraria, abstração feita da constituição da sociedade organizada e do governo, é o estado de 'guerra de todos contra todos'. O homem é o lobo do homem' e movido por suas paixões e desejos não hesita em matar e destruir o outro, seu semelhante. O estado de natureza não descreve o homem primitivo, ou o homem anteriormente a qualquer organização social, mas sim como o homem se comportaria, dada a natureza humana, caso se suspendesse a obrigação de cumprir as leis e contratos imposta pela sociedade. Teríamos então uma luta incessante dos indivíduos uns contra os outros, uma luta de cada um pelo poder sobre o outro. Trata-se, portanto, de uma hipótese teórica, deduzida de sua teoria sobre a natureza humana, e não de uma consideração histórica de um período anterior à formação da sociedade, embora pudesse existir em alguns lugares como entre 'os povos selvagens da América'. (Leviatã) No entanto, isso não poderia ser concebido como prevalecendo universalmente.

Hobbes analisa a natureza humana em uma perspectiva mecanicista: o homem é como uma máquina que age sozinha, na linha da concepção mecanicista de mundo típica da física da época, cujo problema central consistia em entender a natureza dos corpos e de seus movimentos. O homem é movido por suas paixões, que o impelem a agir; a vontade e a deliberação resultam apenas da soma dessas paixões em um sentido mais complexo, sendo que a liberdade nada mais é do que 'a ausência de impedimento' para a ação. Segundo Hobbes, os homens são essencialmente iguais, as diferenças entre os indivíduos sendo consideradas irrelevantes, já que 'mesmo o mais fraco tem poder de matar o mais forte'. O poder soberano existe assim para impedir o estado de natureza e permitir a coexistência entre os homens, já que nesse estado os indivíduos acabariam por se exterminar uns aos outros. A constituição e o funcionamento da sociedade pressupõem que os indivíduos cedam uma parte de seus direitos e os transfiram a um soberano. Essa cessão e transferência de direitos e poderes consiste em um contrato social, por meio do qual se institui a sociedade civil organizada e se evita 'a guerra de todos contra todos'. Por que isso ocorre? Porque, em última análise, o homem deseja sobreviver e a sobrevivência é também uma lei natural, sendo em nome dela que o homem estabelece este contrato. O poder passa a ser exercido, portanto, por um soberano, que pode ser tanto uma assembléia ou parlamento ou um rei.

Na verdade, Hobbes não defende propriamente a monarquia absolutista, baseado nas teorias tradicionais do direito divino dos reis, mas sim a idéia de que o poder, para ser eficaz, deve ser exercido de forma absoluta. Este poder absoluto resulta, no entanto, da transferência dos direitos dos indivíduos ao soberano, e é em nome desse contrato que deve ser exercido, e não para a realização da vontade pessoal do soberano. É nesse sentido que Hobbes é um contratualista - a sociedade civil organizada resulta de um pacto entre os indivíduos - sem ser um liberal, já que defende o poder absoluto, poder considerado legítimo enquanto assegura a paz civil. É a esse soberano todo poderoso que Hobbes denomina 'Leviatã', recorrendo ao nome de um monstro bíblico.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O inferno brasileiro

Calou-se, na alma de cada cidadão, a voz da consciência que, na escura solidão da sua alma, lhe trazia a lembrança amarga de seus delitos e de seus vícios.

A toda hora aparecem pastores, padres e, sobretudo, jornalistas e políticos - sim, jornalistas e políticos, essas personificações supremas da moralidade - clamando contra "a degradação dos costumes". O próprio termo, completamente deslocado, que empregam para nomear o mal, prova que são parte dele. "Degradação dos costumes" é uma expressão quantitativa, escalar: supõe a vigência permanente de uma escala contra a qual se mede o decréscimo da obediência rotineira aos valores que ela quantifica.

O que se passa no Brasil não é uma "degradação dos costumes": é, sim, a destruição premeditada de todas as escalas, a inversão sistemática de todos os valores.

Os costumes degradam-se quando a população já não consegue imitar, nem de longe, os modelos melhores de conduta que a História consagrou e que, ante o olhar de cada geração, se reencarnam de novo e de novo nas figuras das personalidades admiráveis, dos sábios, dos heróis e dos santos.

Quando, ao contrário, todas as personalidades admiráveis desapareceram ou foram postas para escanteio, e em seu lugar se colocam simulacros grotescos ou inversões caricaturais, o problema já não é a desobediência, mesmo generalizada, a valores que todos continuam reconhecendo da boca para fora; é, ao contrário, a obediência a modelos de malícia, perversidade e covardia que se impuseram, pela força da propaganda e da mentira, como as únicas encarnações possíveis do meritório e do admirável.

Quanto mais alto esses personagens sobem na hierarquia social, mais esfumada e distante vai ficando, até desaparecer por completo, a escala de valores que permitiria julgá-los e condená-los; e mais e mais eles próprios se consagram como unidades de medida de uma nova escala, monstruosamente invertida, que em breve passa a ser a única. Daí por diante, quem quer que não a siga e cultue dificilmente poderá evitar a sensação de marginalidade e isolamento que é, nesse quadro, o sucedâneo perfeito do sentimento de culpa.

Calou-se, na alma de cada cidadão, a voz da consciência que, na escura solidão da sua alma, lhe trazia a lembrança amarga de seus delitos e de seus vícios. Em lugar dela, desenvolve-se uma hipersensibilidade epidérmica à opinião dos outros, ao julgamento do grupo, ao senso das conveniências aparentes.

Preso na trama virtual dos olhares de suspeita, cada um vive agora em estado de sobressalto permanente, obsediado, ao mesmo tempo, pela compulsão de exibir equilíbrio, tranqüilidade e polidez para não se tornar o próximo alvo de desprezo. A essa altura, cada um se dispõe a renegar ideais, amizades, lealdades, admirações, promessas, ao primeiro sinal de que podem condená-lo a um ostracismo psíquico - que se anuncia tanto mais insuportável quanto mais tácito, implícito e não reconhecido como tal.

Há uma diferença enorme entre um "estado de medo" e uma "atmosfera de medo". O primeiro é patente, é público, todos falam dele e, não raro, encontram um meio de enfrentá-lo. A segunda é difusa, nebulosa, esquiva, e alimenta-se da sua própria negação, na medida em que acusar sua presença é, já, candidatar-se à rejeição, à perda dos laços sociais, ao isolamento enlouquecedor.

Nessa atmosfera, a única maneira de evitar o castigo ante cuja iminência se treme de pavor é negar que ele exista, e, com um sorriso postiço de serenidade olímpica, ajudar a comunidade a aplicá-lo a imprudentes terceiros que tenham ousado notar, em voz alta, a presença do mal.

Não digo que todos os brasileiros tenham se deixado submergir nessa atmosfera. Mas pelo menos as "classes falantes", se é possível diagnosticá-las pelo que publicam na mídia, já têm sua consciência moral tão deformada que até mesmo suas ocasionais e debilíssimas efusões de revolta contra o mal vêm contaminadas do mesmo mal.

Por exemplo, o fato de que clamem contra desvios de dinheiro público com muito mais veemência do que contra o massacre anual de 50 mil brasileiros (quando chegam a dar-lhe alguma atenção) prova, acima de qualquer possibilidade de dúvida, que por trás do seu ódio a políticos corruptos não há uma só gota de sentimento moral genuíno, apenas a macaqueação de estereótipos moralistas que ficam bem na fita. E que ainda continuem discutindo "se" o partido governante tem parceria com as Farc, depois de tantas provas documentais jamais contestadas, mostra que estão infinitamente menos interessadas em averiguar os fatos do que em apagar as pistas da sua longa e obstinada recusa de averiguá-los. Recusa que as tornou tão culpadas quanto aqueles a quem, agora, relutam em acusar, porque sentem que acusá-los seria acusar-se a si próprias.

Quando, por indolência seguida de covardia, os inocentes se tornam cúmplices ex post facto, já não sobra ninguém para julgar o crime: todos, agora, estão unidos na busca comum de um subterfúgio anestésico que o suprima da memória geral.

Não, não se trata de "degradação dos costumes", como nos Estados Unidos, na França, na Espanha ou em tantos outros países: trata-se, isto sim, da perda completa do senso moral, o que faz deste País uma bela imagem do inferno. No inferno não existe degradação, porque não há a presença do bem para graduá-la.

sábado, 18 de setembro de 2010

Terrorista marxisrta é a próxima presidente do Brasil

Os brasileiros parecem corrompidos o suficiente para aceitar o fato como normal. Mas a provável eleição de Dilma Rousseff escandaliza os observadores internacionais.

"Meu amigo, eles acharam a fórmula. Dê ao povo um celular, TV a cabo, a "sensação" de que eles estão participando da economia e eles não vão nem pensar em liberdade. Bilhões de peões, a assim chamada classe média da China, os pobres "em ascensão" do Brasil, não têm nenhuma idéia do que foi a Carta dos Direitos ou a Carta Magna. A soma total deles, como uma horda de bárbaros, vai esmagar os pobres americanos, o último povo do mundo que tem alguma tradição subsistente de liberdade e direitos individuais. Esse pessoal nouveau-riche do Terceiro Mundo vai queimar a constituição por uma TV nova, comprada em 12 prestações no cartão de crédito."


SÃO PAULO, 26 de agosto (Reuters) - A candidata do partido governante no Brasil, Dilma Rousseff, disparou na frente de seu principal adversário no próprio estado natal dele, como mostrou no sábado uma nova pesquisa de opinião, parecendo se encaminhar para uma vitória acachapante na eleição de 3 de outubro.

Rousseff, do partido governante, o Partido dos Trabalhadores, de Lula, tinha 49 pontos na última pesquisa Datafolha, 20 pontos à frente de Serra. O resultado é semelhante à sua vantagem de 47 contra 30% na pesquisa Datafolha anterior, lançada há cinco dias."

De nossa sucursal em São Paulo (postado originalmente em 8 de abril de 2009, atualizado em 26 de agosto de 2010, sob o subtítulo de "O Purgatório do Brasil está prestes a começar")

Caro Henry,

Depois de ver aquele artigo com a ficha policial de Hitler, veja que interessante esta outra. Dilma Rousseff, a atual chefe de gabinete de Lula (um cargo ministerial), foi escolhida pelo Partido dos Trabalhadores para secundar o ex-operário (e agora milionário) Lula na presidência. Lula é um dos mais corruptos presidentes da história e um instrumento dos marxistas.

O pai de Dilma foi um comunista búlgaro.

No topo da ficha: TERRORISTA / ASSALTANTE DE BANCOS

Embaixo:

Profissão: Desconhecida
Atividades:

1967 - agente do Movimento Política do Trabalhador.

06/10/68 - assalto ao banco Banespa, Rua Iguatemi, $ 80 00.

12/10/68 - planejou o assassinato do capitão [americano] Charles Chandler [levado a cabo com frieza, na frente de sua casa, sua mulher e filho].

11/12/68 - assalto à Loja de Armas Diana, Rua do Seminário, 48 armas [roubadas].

??/04/69 - Comando de Libertação Nacional [outra organização terrorista].

24/01/69 - Assalto ao Depósito de Armas Quitaúna - 63 fuzis FAU, 3 revólveres INA, 4 unidades de munição.

18/07/69 - Assalto à casa do Governador Ademar de Barro [o dinheiro nunca foi recuperado].

01/08/68 - Assalto ao Banco Mercantil de São Paulo.

??/09/69 - Congresso da VAR Palmares [organização terrorista] em Teresópolis.

20/09/69 - Assalto ao Quartel da Polícia de Rio Branco.

Estas pessoas receberam vultosas pensões vitalícias porque foram presas. As famílias das pessoas que elas mataram não recebem absolutamente nada. Ela galgou ao topo dentro do governo porque é comunista.

Outro importante amigo de Lula e dirigente do Partido, José Dirceu, também foi terrorista e foi treinado em Cuba [um traidor do Brasil, na verdade]. Dirceu foi o chefe do pior esquema de corrupção da história do Brasil e ainda está livre e trabalhando como "consultor" do governo (eminência parda).

Toda a máquina do governo foi posta a serviço de Dilma. Ela vai a todas as inaugurações de obras e é exaltada por Lula.

É este tipo de gente que está sendo usada pela Nova Ordem Mundial para nos escravizar. Eu deixo um aviso, especialmente para os americanos que gostam de Chavez e Castro: Obama, amiguinho de William Ayers, não está longe destes caras. É isto que está guardado para os Estados Unidos?

O Purgatório do Brasil está para começar

O triste das próxima eleição do Brasil é que ela não será decidida com base em princípios ou valores. Ninguém liga se Dilma matou ou assaltou. É só populismo na forma mais selvagem. Ela é a Dona Lula. Os pobres se beneficiaram um pouco com o fim da inflação e se esqueceram de que esta situação foi herdada por Lula.

O interessante é que o Partido dos Trabalhadores não é nem comunista (Nota do editor: aqui há um equívoco: o PT é, sim, um típico partido comunista) nem o amparador dos trabalhadores. O IBGE, a maior instituição de estatísticas do Brasil, acaba de publicar a informação de que o analfabetismo no Brasil aumentou durante o reinado de Lula. O saneamento básico está no mesmo nível que estava na época de sua coroação. 50,000 brasileiros morrem de morte violenta, a maior parte causadas por armas e drogas contrabandeadas para o país pelos terroristas marxistas das FARC, aliados de Lula. Quem liga? Eu tenho um cellular e um aparelho de tevê. A próxima Copa do Mundo vai ser no Rio.

Por outro lado, o Banco de Desenvolvimento Federal (BNDES) recebeu este ano 100 bilhões de dólares para emprestar para grandes corporações, a fim de "comprar" sua boa vontade em relação ao governo durante este ano de eleição. Os capitalistas conseguem o dinheiro entre 3,5% a 7%, enquanto que o governo paga de 10% a 12% aos bancos. O banco Itaú teve o maior lucro entre todos os bancos das Américas, incluindo os dos Estados Unidos.

Outros gestos magnânimos do governo incluem a distribuição de concessões de TV e rádio a capitalistas e políticos, uma rede de TV para os líderes de sindicatos (que tomam um dia de salário dos trabalhadores e não podem ser auditados - Lula nos livre!) e a definição de focos de investimento dos fundos de pensões de companhias estatais, na casa das centenas de bilhões de dólares. Com eles, você está feito ou frito.

FASCISMO

Esta é uma economia fascista, na mais pura acepção do termo. Mussolini ficaria orgulhoso.

É difícil para a gente comum entender como o comunismo mudou, de uma utopia social, para este fascismo cru. (Nota do editor: fascismo É socialismo) A razão é que eles mantêm a velha fachada em causas culturais, como aborto de graça, casamento gay, globalismo, radicalismo ecológico, etc. Igual à China, eles dizem como se deve viver a vida privada. Censura ou "controle da mídia" está na agenda de Dilma, como está em pleno curso na Argentina e Venezuela hoje. O sigilo fiscal dos advarsários de Dilma foi quebrado impunemente. Direitos constitucionais básicos não valem nada para o Partido dos Trabalhadores e eles estão desafiando os direitos de propriedade. Um bando de camponeses comunistas, todos financiados e liderados por agitadores profissionais, vai invadir fazendas, matar gente (como eles fazem) e a questão vai ser decidida por aclamação popular, em uma comuna.

Estamos sendo preparados para sermos peões do governo mundial.

Prevejo tempos difíceis à frente para o Brasil. Dilma é incompetente e cabeça dura. A dívida pública brasileira quase triplicou e está para explodir, devido às altas taxas de juros. O boom na exportação de minérios e agro-commodities que deu à popularidade de Lula tamanho impulso pode acabar a qualquer momento, especialmente se uma crise pesada atingir o dólar. O nível de tributação no Brasil é um dos mais altos do mundo, em 40, 5%, e a burocracia, com 85 diferentes impostos na última contagem, é astronômica. Eles não vão conseguir aumentar mais os impostos para sustentar os cabides de emprego do governo e a corrupção.

Quando o governo quebrar, os programas sociais que sustentaram a popularidade de Lula estarão em risco. Sem as exportações em expansão, haverá menos empregos e é possível que vejamos distúrbios e protestos. As coisas sempre foram fáceis demais neste país, onde a comida cresce até numa rachadura de calçada. Talvez seja hora de os brasileiros amadurecerem para o sofrimento.

PS: Dilma não é búlgara, seu pai é que era. Ele fugiu de seu país porque era um ativista comunista. Supreendentemente,(?) no Brasil ele foi um capitalista, e muito rico. Dilma teve uma vida burguesa, morando numa grande casa e estudando em escolas particulares. Sempre é bom pertencer à elite comunista.



Tradução de Larry Martins, da equipe do Blog Dextra.

Artigo original AQUI.


quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Antony Sutton: Um homem que pagou o preço da verdade

Mídia@Mais - https://www.midiaamais.com.br


Exceto pela consciência moral, consciência dispensa adjetivação. As ditas consciências ecológica, social, política, histórica, crítica, etc., são meras construções verbais de ocasião, e como tantas outras, são úteis apenas dentro dos discursos de seus autores e seguidores, dentro dos sistemas fechados de pensamento, das teologias civis que têm como traços mais ou menos comuns a obrigação de primeiro acreditar, a proibição de questionar e a sobreposição de sentidos outros às palavras, sentidos esses que só fazem sentido dentro dos respectivos sistemas. Não por acaso, essa formulação em circuito fechado é a marca de filósofos e pensadores gnósticos, revolucionários, niilistas, ou, simplesmente, propagandistas de esquerda: Kant, Rousseau, Hegel, Marx, Gobineau, Dilthey, Gadamer, Habermas, Marilenas, Franciscos, Mincs, Bettos e Betinhos.

Essa vigarice, gigantesca e pretensiosa, evidentemente já é ruim por si só, pois tais sistemas não buscam a apreensão e o conhecimento de aspectos da realidade, quer através das ciências particulares ou da filosofia, mas ao contrário, buscam encaixar, com a delicadeza de um Mike Tyson, aspectos específicos da realidade nesses sistemas, com a intenção demiúrgica de, na marra sistemática, transformá-la por inteiro. É a revolta gnóstica: não podendo de fato recriar ou alterar a estrutura da realidade, os revoltosos criam sistemas onde a transformação não somente parece possível, como é a única justificativa de sua formulação. Danem-se as consequências e calem-se os discordantes, [tal] como atualmente atestam os conflitos entre os discípulos e os hereges do ambientalismo enragé”.

Não só reafirmo o que disse acima, como acrescento que o interesse em estudar essa “nova” religião política que pretende salvar o mundo de nós mesmos vem de há pelo menos dez anos e no bojo de estudos mais abrangentes sobre geopolítica e filosofia política (ou ciência política), estudos que ainda mantém a minha esperança de saber mais ou tentar conhecer melhor as formas e origens do poder que comanda grande parte das ações dos adeptos de quase todas as ideologias. Para tanto, recorri às obras de grandes autores e grandes filósofos, a começar por Platão (o fundador da ciência política), Aristóteles (seu maior e mais brilhante aluno), e para encurtar a lista e poupar o leitor, concentrei-me (até onde minha capacidade permitiu) nas obras de Eric Voegelin, que pautam as linhas acima destacadas em itálico. Porém, é um fato conhecido daqueles que tentam estudar um assunto com alguma seriedade ser praticamente impossível evitar outras leituras, menos teóricas, menos filosóficas: é preciso ler também vários documentos históricos e análises, por vezes conflitantes, mas em alguns pontos, inadvertidamente complementares e estarrecedoras, e exatamente porque não se tratam das “teorias da conspiração” que pululam na Internet, mas de fatos comprováveis e testemunhos.
Pois o que o leitor do Mídia@Mais tem logo mais a seguir é a última aparição em público, numa entrevista filmada em1980, de um dos maiores historiadores e pesquisadores do século XX, Antony C. Sutton, na qual ele relembra parte daquilo que pôde constatar ao longo de muitos anos como pesquisador da Hoover Institution, Stanford University (mais precisamente como Research Fellow do Hoover Institute of War, Revolution and Peace) e como autor e pesquisador independente a partir de 1975. A entrevista que hoje o leitor do M@M tem à disposição é relativamente antiga e já está na Internet (em partes ou em formato integral) há uns três anos, salvo engano. A grande novidade é que esta é a primeira vez que um site (ou qualquer outro veículo) brasileiro apresenta uma transcrição traduzida para a língua portuguesa dessa entrevista. Mas se coube a mim a tarefa da transcrição/tradução – e cabe também a mim a responsabilidade pelas suas falhas – o “projeto” Sutton já vinha sendo acalentado pelos editores e pela redação do M@M desde 2009: este é, com efeito, um trabalho de equipe. Como nota de rodapé, acrescento que, internamente, já vínhamos discutindo a tese de que as eleições presidenciais americanas, bem com a escolha de líderes democráticos em outros países, acima de certo patamar, eram e são um jogo de cartas marcadas. Ou em outras palavras: as disputas existem, as correntes políticas de fato se opõem, os eleitores votam naqueles candidatos que mais lhes agradam ou convencem, mas há outro poder, maior e quase invisível que há muito vem determinando quem transitoriamente ocupa os cargos ditos “de poder”. Usando de uma imagem um tanto tosca, é como se aos presidenciáveis americanos, antes ou depois de eleitos, fosse apresentada a dura realidade: “OK. Você venceu, mas você manda e faz até onde não nos atrapalhar, entendido?”. Também é possível que a escolha dos candidatos já passe por esse crivo invisível aos olhos do público. Esse poder consiste numa elite mundial, originalmente anglo-americana ou até anterior, com pretensões dinásticas, que pouco se importa com as ideologias citadas de início: essas seriam meros instrumentos de manipulação segundo a dialética hegeliana. Muitos políticos, intelectuais de segunda linha, “celebridades” e as sociedades em geral não são os verdadeiros agentes, não totalmente. Antony Sutton confirma essa tese, ou por outra, ele já a tinha comprovado, mas foi parcialmente silenciado. Assim, quem de fato age é a estrutura montada por essa elite de banqueiros internacionais que alguns chamam de “governo mundial”, “governança mundial”, “nova ordem mundial”, “comunidade internacional”, etc., etc. Mas que o leitor não tome “banqueiros” como um libelo contra o capitalismo, pois essa elite o considera útil até certo ponto, pois capitalismo implica riscos, competição, confiança e liberdade genuína (não custa lembrar: dar crédito = credere = confiar), e aquilo que é menos desejado por essa elite (que inclui próceres da esquerda) são riscos.
Na verdade, a única ideologia desse grupo antigo e renovável por cooptação e recrutamento é também a criação de um mundo novo, um mundo com cerca de 1,2 bilhão de habitantes (somos hoje mais de 6 bilhões)... E se falamos das eleições americanas com mais ênfase é por dois motivos: 1- É delas que Sutton trata; 2- Os Estados Unidos foram e são o primeiro e maior alvo de todas as grandes experiências de engenharia social desde o início do século XX até hoje. É preciso primeiro controlar e mudar o mais forte.
A entrevista de Antony Sutton revela um pouco das pressões e perseguições que sofreu por conta de suas pesquisas e livros. Sua vida profissional foi praticamente destruída: foi um homem que pagou um alto preço por dizer verdades. Para mais detalhes de sua notável biografia, clique aqui, aqui e aqui.
Finalizando esta introdução, o Mídia@Mais faz uma sugestão e um pedido ao leitor:
  1. Não tome a entrevista transcrita como se esta fosse “A” Pedra da Roseta; na medida do possível, busque mais informações nos livros citados na bibliografia e as compare com a “história” contada alhures;
  2. Há três ou quatro lacunas na transcrição, assinaladas por “(?)”. Se o leitor/ouvinte com ouvido mais apurado conseguir confirmar os nomes (com as devidas referências), agradecemos desde já.
***
Entrevista de Antony Sutton a Stanley Monteith, 1980:Wall Street and the Rise of Hitler
Vídeo legendado em português: http://vimeo.com/13790265
Entrevistador: Dr. Stanley Monteith, Radio Liberty.
Transcrição e tradução: Henrique Dmyterko
Legendas: Antony Sutton: AS, Stanley Monteith: SM
***
Transcrição:
SM: Dr. Sutton… O senhor escreveu três séries de livros enquanto foi fellow pesquisador na Hoover Institution. O senhor poderia me explicar qual é, basicamente, o tema desses livros?
AS: Sim. A primeira série de livros, enquanto eu estava na Hoover Institution, Stanford University, trata, essencialmente, das transferências de tecnologia ocidental para a URSS. Cada um dos três livros [dessa primeira série] cobre um período de tempo, começando em 1917.
SM: Então o senhor escreveu uma segunda série sobre Wall Street...
AS: Sim, esses eram livros comerciais, no sentido de que não eram estudos acadêmicos, mas destinados ao público em geral e tratam da construção do socialismo bolchevique na Rússia, daquilo que nos EUA poderíamos chamar de socialismo do bem-estar social [welfare state] e também do nacional-socialismo de Hitler na Alemanha. Cada um dos livros examina o financiamento e a contribuição de Wall Street, de banqueiros internacionais, para o desenvolvimento dessas formas específicas de socialismo.
SM: Em suas pesquisas e análises acaba sendo revelado o que acontece em nossa sociedade. O senhor enfrentou obstáculos ou resistências para desencorajá-lo a conseguir desencavar as origens e revelar os bastidores do envolvimento dos Estados Unidos no financiamento do comunismo internacional?
AS: Sim, definitivamente... Por exemplo, quando eu estava na Hoover Institution, em 1972, eu deveria ir a Miami Beach fazer um relato diante do RNC (Comitê Nacional Republicano). Apesar de um Congressista ter entregado em mãos às agências de notícias cópias desse meu relato/testemunho, essas agências se recusaram a transmiti-lo aos jornais. Quando voltei à Califórnia, fui chamado à sala do diretor do Instituto, que me instruiu, em termos muito claros, para não mais proferir discursos tais como aquele, e que tais informações não deveriam ser tornadas públicas.
SM: E a informação era a de que estávamos fornecendo a URSS a tecnologia para desenvolvimento de seu potencial bélico...
AS: Sim... Naquela época estávamos envolvidos no Vietnã e como você sabe, os soviéticos estavam suprindo os norte-vietnamitas...
SM: Isso foi em 1972...
AS: Sim, 1972. Por exemplo, eu sabia que a fábrica de automóveis e caminhões Gorky, que a propósito, foi construída pela Ford Motor Co. ... que a Fábrica Gorky, na Rússia, produz a linha de veículos GAZ [Gorkovsky Avtomobilny Zavod]... e esses veículos foram vistos na trilha Ho-Chi-Minh. Nós estávamos fornecendo equipamentos à Gorky em meio à guerra contra os norte-vietnamitas e esses caminhões estavam sendo usados para carregar munição e suprimentos destinados a matar americanos. Eu achava que aquilo era moralmente errado. Eu disse isso em Miami Beach e na Hoover Institution. E foi esse tipo de informação que foi suprimida.
SM: E o que aconteceu no que diz respeito às suas atividades na Hoover Institution?
AS: Bem... Eu não dei muita atenção às advertências. Publiquei um livro sobre o suicídio nacional, no ano seguinte, [National Suicide: Military Aid to the Soviet Union, 1973] livro que fazia um sumário da assistência militar que fornecíamos a União Soviética. Quando o livro ficou pronto, sofremos pressões para interromper a publicação... pressões feitas aos editores e a mim, pessoalmente. E eu... eu achei que não deveria mais aturar tais pressões e poucos anos depois deixei a Hoover Institution. Desde 1975, sou um autor independente sem mais nenhum tipo de ligação com a Hoover.
SM: Vamos voltar um pouquinho, aos antecedentes do financiamento da máquina de guerra alemã, a mesma contra a qual lutamos no período entre 1941 e 1945... Poderíamos começar, ante de mais nada, com o financiamento original de Hitler, entre 1922 e 1923, quando ele ainda estava fazendo esforços para atingir alguma proeminência na Alemanha?
AS: O financiamento original veio apenas em parte da Alemanha mesmo. Um dos mais importantes a assinalar, na questão desse financiamento em 1922 foi Henry Ford. De fato, mais tarde, Henry Ford recebeu uma medalha,em 1938, por seu apoio financeiro ao Partido Nazista (Nacional Socialista) quanto este ainda estava em sua fase de formação. Então, é claro, depois do fracassado putsch,em 1923, Hitler foi preso, dando início a uma nova era na ascensão de Hitler.
SM: E finalmente chegou ao poder em 1933, via processo eleitoral. E o que há a dizer sobre o financiamento das atividades eleitorais de Hitler em 1933?
AS: Isso eu pude rastrear. Na verdade, pude rastrear com precisão, nos registros de Nuremberg, uma série de recibos de transferências do Delbruck, SchicklerBank, em Berlim, transferências feitas para uma conta controlada por Rudolph Hess. Este foi o fundo usado para financiar o acesso de Hitler ao poder em março de 1933. Entre as grandes corporações que fizeram transferência para esse fundo, eu encontrei não apenas a IG Farben, o que já era bastante conhecido, mas também a filial alemã da General Electric, AEG (Allgemeine Elektrizitats Gesellschaft), na época diretamente controlada pela GE americana... também a OSRAM...
SM: E quais eram as ligações entre a OSRAM e a General Electric?
AS: A General Electric internacional tinha o controle da GE alemã (AEG) e também parte do controle acionário da OSRAM na Alemanha.
SM: Então temos a Ford e a GE ajudando a financiar a ascensão de Hitler ao poder. Havia outras grandes corporações americanas envolvidas?
AS: Sim, definitivamente. A Standard Oil através de sua parceria técnica com a IG Farben... Por exemplo, a Alemanha não poderia ter ido à guerra em 1939 sem o tetra-etil (chumbo tetra-etil). O tetra- etil é necessário para elevar a octanagem do combustível de aviação... A Alemanha não tinha meios para produzi-lo. O tetra-etil foi desenvolvido em laboratórios nos EUA e transferido para os alemães. A Standard Oil apareceu com a idéia de hidrogeinização, que foi essencial para os alemães nos anos 1930 aumentarem a qualidade de sua gasolina de aviação. Essa tecnologia foi transferida para os nazistas. E a ITT, p. ex., (International Telephone and Telegraph), estava intimamente ligada aos nazistas através do Dr. Schröder (Baron Kurt von Schröder ), que era o diretor-chefe das subsidiárias alemãs da ITT. A ITT controlava empresas que fabricavam não somente instrumentos elétricos, mas também a fábrica dos Focke-Wulf, aviões de caça.
SM: Então o que senhor está sugerindo é que corporações americanas ajudaram a financiar a indústria alemã envolvidas no aumento da capacidade bélica?
AS: Corporações americanas, apenas umas poucas delas, não muitas, financiaram Hitler através de suas subsidiárias, transferiram tecnologia, transferiram estoques de material, p.ex., o tetra-etil, antes que os alemães mesmos o produzissem cf. acordo posterior entre Alemanha e os EUA. E também financiaram... P.ex., a Standard Oil, em 1933, financiou o desenvolvimento da fabricação de gasolina na Alemanha, necessária para a II Guerra.
SM: Este é um ponto muito interessante. O senhor poderia dar uma idéia de como a Alemanha obteve petróleo para a II Guerra? Certamente não havia reservas de petróleo em território alemão.
AS: Sim, a Alemanha não tem reservas de petróleo, é um fato. Durante a II Guerra, usou combustível sintético, obtido a partir do carvão e os processos tecnológicos básicos para o desenvolvimento de combustíveis a partir do carvão vieram dos Estados Unidos, essencialmente da Standard Oil, que tinha um acordo de assistência técnica com a IG Farben. E porque a IG contribuiu com cerca de 60% do explosivos usados pela Wehrmacht, entre 40 e 50% da gasolina para a Wehrmacht e para a Luftwaffe, a força aérea alemã.
SM: E como era o entrelaçamento entre a IG Farben e a Standard Oil?
AS: O entrelaçamento era no nível técnico, na troca de patentes, e na assistência tecnológico-financeira. Havia outros laços da IG Farben com os EUA, através de subsidiárias da IG Farben nos Estados Unidos.
SM: E é verdade o que foi afirmado sobre membros do conselho diretor da Standard Oil serem também membros do conselho diretor da subsidiária americana da IG Farben?
AS: Sim... Walter Teagle é um nome que me vem à mente... mas havia vários outros.
SM: Também havia ligações da IG Farben com a Ford Motor Company...
AS: Humm... Não que eu me lembre agora.
SM: Então, basicamente, o que vemos até aqui são companhias americanas fornecendo material, tecnologia e financiamento que tornaram possível a Hitler construir a sua máquina de guerra...
AS: Sim, isto está correto.
SM: Em seu livro “Wall Street and the Rise of Hitler” o senhor fala do padrão de bombardeios aéreos aliados durante a II Guerra e sobre o fato notável e surpreendente de que certas fábricas não foram atingidas, enquanto a maioria das fábricas alemãs foi dizimada. Algumas fábricas ligadas a esses acordos já aludidos, por alguma estranha razão, escaparam aos devastadores bombardeios de saturação dos aliados.
AS: Durante a II Guerra Mundial, o setor industrial alemão de produtos e equipamentos elétricos, era, ou deveria ser um dos alvos primordiais dos bombardeios aliados. Mas na prática, as fábricas da GE alemã não foram bombardeadas. Das dez maiores fábricas, nenhuma foi bombardeada e cerca de meia dúzia de outras tiveram danos mínimos, tais como vidros quebrados, etc. Logo, o que temos aqui é um caso muito interessante: indústrias que deveriam ter sido bombardeadas, não o foram. Por outro lado, temos uma marca de propriedade de tais indústrias, o que levanta algumas suspeitas sobre o porquê de não terem sido bombardeadas.
SM: Mas no que diz respeito a fábricas de material elétrico de propriedade alemã, elas sofreram bombardeios mais pesados?
AS: Eu pesquisei sobre isso. A Siemens, p.ex., foi bombardeada, não há dúvida sobre isso. Mas esse setor industrial, e a Siemens também, não foi tão bombardeado quanto às fábricas de tanques ou de aviões, esse tipo de coisas.
SM: Antes o senhor mencionou uma instalação industrial em Colônia. Esse era um alvo militar prioritário?
AS: A fábrica da Ford em Colônia [Alemanha] deveria ter sido um alvo militar prioritário. P.ex. a RAF (Royal Air Force) bombardeou a fábrica da Ford em Poissy, na França, mas a fábrica da Ford em Colônia, de longe a maior de todas, não foi bombardeada.
SM: Mas os planejadores militares pretendiam bombardear essas fábricas. Ou elas não estavam nos relatórios de alvos?
AS: Bem... Eu vi os relatórios de alvos em Colônia. A existência das fábricas da Ford lá era bem conhecida; eles sabiam que essas fábricas estavam produzindo equipamentos para a Wehrmacht, mas não a bombardearam. Ela estava na lista de alvos designados, mas não foi atingida.
SM: Então, em algum ponto ao longo da linha de comando e planejamento alguém apagou o nome da Ford em Colônia como alvo, enquanto a cidade de Colônia foi totalmente destruída.
AS: Colônia foi destruída, assim como muitas outras cidades na Alemanha foram destruídas. Mas em algum lugar da linha de comando... bem, algo aconteceu. Eu suspeito que isso se deu nos comitês de designação de alvos. E sem dúvida, ordens foram emitidas para não bombardear determinados alvos, ainda que esses fossem alvos militares vitais.
SM: Isso, de alguma maneira, faz lembrar a Guerra da Coreia e Guerra do Vietnã, quando alvos importantes no campo inimigo foram também deixados intocados pelos bombardeios estratégicos.
AS: Eu concordo que isso aconteceu, mas não investiguei o assunto.
SM: Em seu livro “Wall Street and the Rise of Hitler” há uma seção muito interessante a respeito de um fundo especial em nome de Heinrich Himmler. O fluxo de dinheiro para esse fundo, que se estendeu até 1943, 1944, envolvia empresas alemãs fortemente ligadas a empresas americanas e às suas matrizes americanas.O senhor poderia nos falar um pouco a respeito do Fundo Keppler?
AS: O Fundo Keppler, também conhecido como Control S Fund (?), e era o que poderíamos chamar de fundo de reserva pessoal de Heinrich Himmler; ele o usava para seus projetos pessoais... e o que me deixou espantado foi que em 1933 e em 1944, os anos cujos arquivos desse fundo eu pesquisei, mais da metade do dinheiro para esse fundo proveio de corporações americanas. P.ex., em 1933 , a ITT, a Standard Oil, GE e possivelmente a OSRAM, foram contribuintes desse fundo. Até mesmo em 1944, durante a II Guerra Mundial, a ITT estava financiando Heinrich Himmler através de Schröder [Barão Kurt von Schröder ], que era o diretor-chefe das subsidiárias alemãs da ITT. Também descobri que a DAPAG (Deutsche-Amerikanische Petroleum AG), a subsidiária da Standard Oil na Alemanha, também estava financiando Himmler. E isso durante a II Guerra!
SM: Algum desses fatos veio à tona durante as audiências do tribunal de Nuremberg?
AS: Não. Nenhum veio à tona em Nuremberg, ainda que os documentos existam nos arquivos, mas eles não foram publicados.
SM: E o senhor teve acesso direto a esses arquivos?
AS: Sim. Há cerca de quatrocentas toneladas (400 t) disponíveis desses arquivos e muitos deles estão na Hoover Institution, ou cópias de tais documentos, e é por isso que eu os encontrei.
SM: Eu acho que esse é um episódio trágico da história americana, quando o público não percebe as íntimas relações de grandes corporações americanas com o financiamento do nacional-socialismo alemão (nazismo). Agora, eu gostaria de falar um pouco a respeito dos julgamentos de Nuremberg, pois durante esses julgamentos, os nazistas, os generais alemães, os criminosos de guerra alemães foram considerados culpados diante das provas. Algum americano foi indiciado ou condenado em função desse financiamento?
AS: Definitivamente, não! Eu estudei os critérios de definição de “crimes de guerra” segundo o Tribunal de Nuremberg e eu não tenho dúvida de que determinados americanos se encaixavam nos critérios que determinavam o indiciamento por crimes de guerra, mas nenhum deles foi a julgamento.
SM: O senhor acha que houve um esforço consciente para ocultar esses fatos do Tribunal de Nuremberg e do público americano?
AS: Houve tal esforço, uma vez que esses homens de negócios americanos foram muito assertivos ao dizer, em 1946, que não tinham o menor conhecimento sobre o que Hitler estava fazendo. E, no entanto, estavam intimamente ligados ao rearmamento promovido por Hitler. Eu creio que isso não foi publicado pelos jornais da época, mas eu não verifiquei esse detalhe. Mas certamente, nada foi publicado sobre o papel de corporações americanas e de executivos americanos na ajuda a Hitler.
SM: E sobe o financiamento, sobre os empréstimos de grandes bancos americanos e britânicos feitos ao governo de Hitler no período entre 1933 e 1939, quando ele estava se preparando para a guerra?
AS: Bem, é preciso recuar um pouco mais no tempo e dar uma olhada nos chamados empréstimos Young, que eu considero muito importantes, pois do meu ponto de vista, tais empréstimos levaram ao colapso financeiro da Alemanha em 1933.
SM: Esse era o Plano Young (1928)...
AS: Sim, Owen Young, que a propósito, era o presidente do conselho de administração da General Electric. Young atuou como o representante do governo dos EUA nesse plano que levou ao colapso financeiro alemão em 1933, que por sua vez, permitiu a ascensão de Hitler. E subsequentemente, a partir de 1933, há uma série de outros empréstimos. Um bom exemplo é o empréstimo da Standard Oil à Alemanha, no valor de vários milhões de dólares, para construir as instalações alemãs de produção de combustível de aviação. E há outros exemplos.
SM: Bem, eu agora gostaria de entrar no tema do financiamento do bolchevismo, porque eu acho que isso é de importância vital. Poderíamos voltar ao período logo após a 2ª revolução russa, entre outubro e novembro de 1917? O financiamento inicial do movimento de Lênin... como ele estava ligado às corporações americanas?
Houve algum envolvimento americano naquele período entre 1917 e 1918, quando o bolchevismo estava começando se estabelecer firmemente na Rússia?
AS: Sim, houve vários incidentes. O mais importante envolve o “Coronel” William Boyce Thompson, que era o maior acionista do Chase Bank, o atual Chase Manhattan Bank. Num dos meus livros eu publiquei a cópia de um cabograma registrando a transferência de um milhão de dólares, de Nova York a Petrogrado [São Petersburgo], em dezembro de 1917 e mais tarde, o “Coronel” Thompson declarou que esse dinheiro foi dado aos bolcheviques para ajudar a consolidar o seu poder. À época, os bolcheviques controlavam apenas Moscou e São Petersburgo. Esse é um exemplo muito significativo: fundos americanos, um milhão de dólares, transferidos através de um homem de Wall Street aos bolcheviques.
SM: E o senhor publicou esse documento em seu livro “Wall Street and the Rise of Bolshevism”?
AS: Eu publiquei duas declarações. Uma na forma de cópia do referido cabograma e outra, uma cópia do news clip da época, onde Thompson fazia a declaração acerca dessa contribuição
SM: E por que um capitalista americano, um financista americano, ajudaria o bolchevismo?
AS: A única resposta... e isso me intrigou durante anos: “Por quê?”. Pois de acordo com o senso comum, estaríamos em confronto. A única resposta a que eu pude chegar é: mercados cativos. Os Estados Unidos não queriam outro “Estado s Unidos” no mundo. Se você der uma olhada no mapa do mundo, a Rússia é duas, três vezes maior que os Estados Unidos. Imagine tudo isso se transformando num outro “Estados unidos”, num competidor. O que os EUA queriam, ou ainda, o que Wall Street queria era um mercado cativo. E é claro, o socialismo, conforme meus estudos iniciais em Stanford, o sistema socialista é incapaz de inovar; terá de importar inovações e tecnologias do Ocidente. Assim, creio que o objetivo por trás dessa ajuda era encorajar o desenvolvimento do marxismo e de outros tipos de socialismo, por que isso daria as esses banqueiros o controle do mercado mundial, um mercado cativo.
SM: No final da I Guerra Mundial, a Rússia estava devastada pela fome. Os EUA enviaram uma missão de socorro e ajuda; foi a missão Hoover. O senhor conhece os fatos que envolveram a missão Hoover?
AS: Não há dúvida de que em 1922, 1923, a Rússia estava acabada. A produção industrial russa equivalia a oito ou dez por cento da produção em 1913. As pessoas estavam morrendo de fome, centenas de milhares de pessoas. E é claro, a missão Hoover foi organizada para ajudar a Rússia, mas a maior parte dessa ajuda foi para os bolcheviques, que controlavam uma porção muito pequena da Rússia até então. Apenas uma pequena porção da ajuda foi para os “Russos Brancos” (Exército Branco) ou para o extremo oriente.
SM: E então, em 1922-23, Lênin lançou a chamada NEP (Nova Política Econômica), ou série de planos quinquenais. O senhor poderia falar a respeito dos planos quinquenais e do papel desempenhado por grandes corporações americanas e grandes corporações mundiais na construção da União Soviética?
AS: Bem, houve duas fases distintas. A NEP, iniciada em 1923 por Lênin. Eu descobri, e publiquei num trabalho em Stanford, que cada uma das indústrias russas foi reconstruída, reiniciada, por corporações estrangeiras; em sua maioria, alemãs, britânicas, francesas e americanas. Por volta de 1928, a Rússia tinha uma produção industrial quase igual ao dos níveis pré-guerra, ou seja, dos níveis de 1913. Neste ponto, a Rússia passou a pensar em termos daqueles grandiosos planos quinquenais. E em 1928 o GOZ Plan, o comitê de planejamento econômico do governo soviético, apresentou um projeto de desenvolvimento econômico quinquenal inicial, mas esse plano era tão inadequado que recorreram a corporações americanas. Assim, na realidade, os dois primeiros planos quinquenais foram arquitetados nos EUA, por corporações americanas.
SM: E quais eram essas corporações, especificamente?
AS: O projeto do primeiro plano quinquenal foi feito por uma empresa provavelmente muito pouco conhecida do público americano, a firma de arquitetura industrial de Albert Kahn. Albert Kahn era o principal arquiteto industrial nos EUA. Foi a firma dele que estabeleceu os conceitos básicos do primeiro plano quinquenal. E então, nós encontramos, mais uma vez, as mesmas corporações, agora envolvidas na construção de fábricas na União Soviética: a General Electric internacional, Du Pont, Ford Motor Co., Hercules Motor, Cutiss-Wright [motores de aviões] e algumas outras cujos nomes já estão esquecido hoje: Vultee Aircraft e Chance-Vault Aeoronautical. Então, companhias americanas entraram em cena, construíram o primeiro plano quinquenal, mas o mais importante é que os soviéticos então copiaram esses planos e isso dá conta do enorme aumento da produção industrial. Os soviéticos pegaram esses equipamentos iniciais e os copiaram, às centenas.
SM: E quanto à Ford Motor Co.? Qual o seu papel nisso? Foi importante?
AS: Certamente. A Ford construiu a fábrica Gorky. A Gorky produz a série de veículos GAZ [Gorkovsky Avtomobilny Zavod]; são caminhões e automóveis. E logo no início dos anos 1930 você vê que a GAZ tinha potencial militar e a Ford sabia disso quando construiu a fábrica Gorky e nós sabemos disso porque eu encontrei declarações a esse respeito nos arquivos do Departamento de Estado.
SM: Às vezes ouvimos o nome de Averell Harriman. Ele teve um papel na construção da tecnologia soviética?
AS: Certamente. Averell Harriman voltou da União Soviética com lucros. Ele obteve a concessão das minas de manganês na Geórgia no início dos anos 1920. Ele as tornou operacionais novamente para os soviéticos.O manganês se tornou um dos principais produtos de exportação dos soviéticos. Com a exportação do manganês os soviéticos obtiveram divisas que financiaram a industrialização. Em 1929, os soviéticos compraram os direitos de Averell Harriman, pagando um milhão de dólares a mais do que ele tinha investido.
AS: Armand Hammer é um exemplo muito interessante. Hammer recebeu a primeira concessão estrangeira em 1922 sobre asbesto (amianto) nos Montes Urais e ele também conduziu outros empreendimentos para os soviéticos, tais como a fabricação de canetas e lápis. Mas Armand Hammer é interessante por que seu pai, apesar de Armand ser até hoje (ano de 1980) presidente da Occidental Petroleum Corporation... seu pai era Julius Hammer, que em 1919 era o Secretário-Geral do Partido Comunista nos Estados Unidos, o que enfatiza o argumento que permeia meus livros: o de que nos níveis mais altos não há diferença entre os comunistas principais e os capitalistas principais. Eles estão entrelaçados. Você tem Armand Hammer, presidente da Occidental Petroleum, e seu pai, Secretário-Geral do PC americano em 1919.
SM: Então, basicamente, é uma tomada de poder.
AS: É uma tomada de poder [ ] e uma tomada de poder internacional.
SM: Agora... Durante a II Guerra Mundial, quando a Rússia foi praticamente destruída novamente pela forças alemãs, qual foi o papel do programa “Lend Lease” na reconstrução da capacidade industrial russa após a II Guerra?
AS: Bem, o programa “Lend Lease” (empréstimo e arrendamento) expandiu e modernizou a capacidade industrial soviética durante a II Guerra, e houve uma continuação até 1948, talvez 1949. Havia um programa supostamente destinado exclusivamente ao fornecimento de comida e material industrial,mas na verdade, e eu verifiquei os registros dos depósitos em ...?... Maryland, descobri que mesmo depois da II Guerra, e isto era contrário às intenções do Congresso, acredito eu, houve uma maciça transferência de equipamentos industriais de última geração à União Soviética sob a cobertura do chamado programa Lend Lease.
SM: Em 1948 saiu um livro fascinante, de autoria do Major (George) Racey Jordan no qual ele falava da assistência americana aos comunistas no que diz respeito à sua capacidade de construir armas nucleares. O senhor teve a oportunidade de verificar se realmente fornecemos água pesada a eles, se fornecemos os recursos para que construíssem armas atômicas?
AS: Bem, como parte do trabalho que eu estava fazendo em Stanford, investiguei os documentos de embarque do programa Lend Lease. Eu peguei uma amostra desses documentos e os comparei com os dados do Major Jordan e de maneira geral, Jordan estava certo quanto a mais ou menos cinco por cento do conteúdo do embarques. O Major Jordan evidentemente fez a acusação de que tínhamos enviado material aos soviéticos em 1944-45, material que mais tarde foi usado no desenvolvimento do seu programa atômico. Não há dúvida de que ele estava correto ao afirmar que enviamos água pesada, que é essencial. Mas nós enviamos outros itens, que talvez sejam menos óbvios ao leigo. Por exemplo, enviamos tubos de alumínio, essenciais ao desenvolvimento da energia atômica... Enviamos grafite, outro componente essencial. Assim, de maneira geral e até onde pude verificar... E eu verifiquei os documentos governamentais originais do Lend Lease, o Major Jordan estava certo.
SM: À medida que os anos passam, vemos uma crescente ameaça nuclear soviética. Os soviéticos agora têm mísseis MIRV[multiple independently-targeted reentry vehicle = míssil balístico com vários alvos/várias ogivas]. O senhor poderia explicar como a União Soviética, que realmente não tinha a tecnologia necessária para desenvolver esses mísseis MIRV que hoje ameaçam as nossas cidades... Como é que eles foram capazes de desenvolver essa capacidade?
AS: Bem, para começar é preciso voltar e entender como os soviéticos foram capazes de desenvolver um foguete, a tecnologia espacial. O que eles fizeram depois da II Guerra foi... As forças americanas foram retidas por um tempo, enquanto os soviéticos ocupavam o leste da Alemanha. Eles tiraram tudo da Alemanha Oriental, levaram o que havia de mais recente na tecnologia de bombas V2 de Peenemünde e de outros lugares e a V2 se tornaram a base da tecnologia espacial soviética. Bem, se você pular o período intermediário, no início do anos 1970 os russos ainda não tinham a capacidade MIRV em seus mísseis. Em especial, eles careciam da capacidade tecnológica para produzir os rolamentos de micro-esferas de alta precisão, necessários para os sistemas de controle. Havia apenas um única empresa no mundo, a Bryant Chucking Grinder Company, capaz de fabricar as máquinas de usinagem de alta precisão que faziam as pistas para rolamento das esferas. E sem essas pistas de esferas de rolamento, não é possível produzir mísseis MIRV em quantidade. Pode fazer um, mas não em quantidade. A Bryant Chucking Grinder Company teve permissão de vender quarenta e cinco dessas máquinas aos soviéticos, numa época em que só havia trinta e três em uso nos Estados Unidos.
SM: Houve alguma objeção a isso?
AS: Eu fiz objeção naquela reunião em Miami Beach, em 1972. Outras pessoas fizeram objeções, mas esta foram sufocadas, caladas. Os maiores culpados disso foram Henry Kissinger e a administração Nixon (2º mandato). [Em tenho certeza de que isso era conhecido no DOD (Dep. de Defesa)...se eu sabia, certamente o Departamento de Defesa sabia. Mas, as objeções foram silenciadas e as informações, suprimidas.
SM: Então, mais uma vez, vemos a América contribuindo para o crescimento da capacidade militar da ameaça nuclear soviética...
AS: Bem, quando você está falando de mísseis MIRV, você está tratando de um grande salto em sua tecnologia militar. Ora, eu não sou militar, mas para mim, a habilidade de fazer isso é um avanço maciço na capacidade militar, e nós permitimos isso consciente e deliberadamente.
SM: Durante a Guerra do Vietnã, a União Soviética e os países satélites do leste europeu eram os principais fornecedores de suprimentos bélicos aos norte-vietnamitas que estavam matando rapazes americanos no Vietnã do Sul. O senhor poderia comentar sobre a nossa ajuda e comércio com a União Soviética e os países do leste europeu durante aquele período?
AS: Não há dúvida de que os soviéticos eram os principais fornecedores de equipamentos e suprimentos militares aos norte-vietnamitas. Deixe-me dar-lhe um exemplo: Os pilotos americanos, enquanto voavam sobre a Trilha Ho-Chi-Minh, descreveram os caminhões que viam como caminhões americanos. Bem, eles eram americanos, uma vez que vieram da fábrica Gorky e essa fábrica foi construída por Henry Ford. Então, você tem uma situação onde nós estávamos fornecendo para os dois lados na Guerra do Vietnã.
SM:Se os caminhões estavam sendo fabricados na União Soviética, eles receberam algum equipamento americano para fabricá-los?
AS: Sim. Especificamente no início dos anos 1970, tomei conhecimento de embarques de equipamentos para a fábrica Gorky enquanto a guerra transcorria, os quais permitiram que os soviéticos produzissem mais caminhões a serem utilizados pelos norte-vietnamitas.
SM: E quanto a empréstimos? Os Estados Unidos estavam concedendo empréstimos aos soviéticos durante esse período em que eles eram os principais financiadores dos norte-vietnamitas?
AS: Sim. Começando por volta de 1970, houve uma enorme concessão de empréstimos à União Soviética. Em 1976, tais empréstimos totalizavam talvez 40 (quarenta) bilhões de dólares. Um valor extraordinário.Obviamente, tais empréstimos permitiram que a União Soviética adquirisse equipamento industriais dos Estados Unidos. Em parte, esse equipamento industrial foi usado para produzir suprimentos militares usados contra nós no Vietnã.
SM: E quanto à marinha mercante russa no transporte de suprimentos ao Vietnã do Norte?
AS: As remessas pela marinha mercante russa são exemplos muitos interessantes porque a frota russa, umas seis mil embarcações...e eu analisei cada um desses navios: a origem da tecnologia do navio em si, a capacidade de carga e os motores. A maioria era equipada com motores diesel marítimos. Eu descobri que sessenta por cento da marinha mercante soviética, que obviamente tem utilidade militar, foi construída em estaleiros estrangeiros, e quarenta por cento na União Soviética, mas basicamente usando projetos ocidentais .Agora, quando você trata de motores diesel marítimos, você descobre algo realmente fascinante. Você descobre que oitenta por cento dos motores diesel da frota mercante soviética são ocidentais : Bermeister&Wein, de Copenhague, Sulzer, da Suíça, FIAT, da Itália...esse nome já veio à tona anteriormente. Mas os outros vinte por cento dos motores diesel da frota mercante russa foram fabricados de acordo com projetos ocidentais e acordos de assistência técnica com a Sulzer e a Bermeister&Wein. Portanto, para qualquer efeito, não haveria marinha mercante russa sem a assistência do Ocidente.
SM: E quanto à construção da fábrica do Rio Kama (tributário do rio Volga, Rússia)?
AS: A fábrica do Rio Kama foi construída entre o final dos anos 1960 e o início dos anos 1970. O projeto básico foi entregue à italiana FIAT. Giovanni (Gianni) Agnelli é o presidente da empresa. Isso é importante, por que Agnelli tem ligações com o Chase Manhattan Bank. Ele está no International Advisory Committee (IAC) do Chase Manhattan (Rockefeller) O que chamou minha atenção foi o fato de que a FIAT não produz equipamentos para a fabricação/montagem de automóveis. Todas as fábricas da FIAT na Itália usam máquinas e equipamentos americanos. O que eu descobri foi que 60-70 por cento dos equipamentos da fábrica do Rio Kama vieram dos Estados Unidos, dos principais fornecedores de máquinas para a indústria automobilística nos Estados Unidos.Eu penso que a fábrica ser conhecida como sendo da FIAT foi talvez um disfarce para desviar a atenção do fato de que, durante a Guerra do Vietnã, estávamos construindo a maior fábrica de caminhões do mundo, cobrindo uma área de 36 milhas quadradas (aprox. 93 km²) .Nós estávamos construindo para os soviéticos, com equipamento americano, a maior fábrica do mundo e esta levava o nome da FIAT. Então eu acho que foi uma fachada.
SM:Então eles estavam fabricando seus caminhões, veículos blindados de transporte de pessoal e outros coisa que poderiam ser usadas na guerra no Vietnã do Sul?
AS: Nós sabíamos que a fábrica em Kama tinha potencial militar e em 1972 eu escrevi “National Suicide [Suicídio Nacional]”. Eu disse basicamente o mesmo em Miami Beach em 1972: essa fábrica tem potencial militar, pode produzir veículos militares. Sabíamos disso. E é claro, hoje [ano 1980], no Afeganistão, os veículos produzidos por essa fábrica construída por companhias americanas e italianas estão lá.
SM: E foi depois que senhor apresentou essas informações que surgiram pressões para a supressão de seu livro “National Suicide” e também de outros estudo seus?
AS: Sim, sim. Porque eu revelava o fato de que a fábrica do Rio Kama tinha potencial militar, que estávamos capacitando os mísseis soviéticos com tecnologia MIRV ao vender-lhes máquinas da Bryant Chucking Grinder Company, e é claro, outros fatos correlacionados.
SM: E que tipo de pressão foi feita sobre o senhor e sobre a editora de seu livro “National Suicide”?
AS: A pressão sobre a editora foi para evitar a publicação. A editora se recusou a fazer isso. A pressão sobre mim, primeiramente, foi no sentido de desistir da publicação. E então, um tipo bastante fraudulento de pressão. Na Hoover Institution que eu havia plagiado o volume 3 da minha série sobre tecnologia ocidental, que estava sendo publicada pela Stanford University. Bem, primeiramente, eu os desafiei a apontar o plágio e ninguém foi capaz de encontrar nem sequer duas frases plagiadas... Então eu ressaltei que eu não poderia plagiar o meu próprio trabalho. Eu sou detentor do copyright de ambos os livros, logo não haveria maneira de plagiar a mim mesmo... É uma impossibilidade lógica. Então, a pressão foi gradualmente crescendo nos ano seguintes no sentido de que minhas pesquisas estavam caminhando num sentido...que talvez, não fosse requerido, ou bem-vindo, na falta de termo melhor e que deveria se restringir a limites mais estreitos . Nesse ponto, em 1975 eu deixei a Hoover Institution e me tornei um pesquisador independente, com liberdade para publicar o que eu quiser.
SM: O senhor soube de outras situações de esforços para suprimir publicações de livros na Hoover Institution?
AS: Eu sei de um exemplo, como qual eu tinha bastante familiaridade, e trata-se do livro de Julius Espstein sobre a “Operation Keelhaul”, um livro muito importante sobre o tratamento dados a prisioneiros de guerra russos na Alemanha logo após a II Guerra. Esse livro ficou em manuscrito por vários anos e sua publicação não foi permitida. Eu soube disso em primeira mão do próprio Julius.
SM: Certo. No final das contas acabou sendo publicado...
AS: Foi, mais tarde foi publicado.Outro exemplo que posso dar é da minha própria série sobre tecnologia ocidental. O terceiro volume foi mantido no prelo por um ano. Ora, custa muito dinheiro manter um livro parado no prelo, pois você quer recuperar o dinheiro investido. Esse livro ficou parado por um ano porque não era politicamente aceitável naquela época, apesar de ser um livro acadêmico.
SM: Então o senhor fez estudos fascinantes sobre a Comissão Trilateral. O senhor poderia nos falar a respeito da Comissão Trilateral?
AS: A Comissão Trilateral é uma organização privada, fundada por David Rockefeller em 1973. Era financiada principalmente por Rockefeller e algumas outras fundações... a [Charles F.] Kettering Foundation, a ... (?) Foundation, a Ford Foundation. A Ford Foundation era uma das maiores contribuidoras. E o objetivo declarado era encorajar a discussão entre o que eles chamavam de regiões trilaterais: eu devo ressaltar que dos trezentos membros da comissão, um terço vinha dos Estados Unidos, um terço do Japão e um terço da Europa. Mas na verdade, eu descobri que as ações da Comissão Trilateral têm muito mais a ver com os interesses da comunidade de banqueiros internacionais em Nova York.
SM: No que diz respeito à influência da Comissão Trilateral sobre o governo americano, tem sido dito que houve excessiva participação de membros da Comissão no gabinete [ministério] de Jimmy Carter e na administração de Jimmy Carter.
AS: Bem, “excessiva participação” é um eufemismo, penso eu... Há cerca de duzentos milhões de habitantes nos EUA [ano de 1980]; da Comissão, setenta e sete membros são americanos, e destes, nada menos que dezoito faziam parte do governo Carter. O próprio Presidente Carter era membro da Comissão Trilateral, além dos Srs. Walter Mondale [vice-presidente], Harold Brown, Cyrus Vance, Michael Blumenthal… Brown era o Secretário da Defesa. Em outras palavras, ocuparam todos os postos-chave do gabinete e também de importantes comitês do governo; os de inteligência e defesa, p.ex., totalmente compostos por “trilaterals”. Então você tem setenta e sete americanos selecionados por um homem, David Rockefeller, então presidente do Chase Manhattan Bank, que se tornam ocupantes dos principais cargos em Washington no governo Carter.
SM: Isso lhe sugere que nós não escolhemos nossos governantes, mas que estes são escolhidos por aqueles trabalham por trás da cena?
AS: Não há outra conclusão a tirar disso. Se você olhar para quem é candidato hoje, você tem Bush (pai), um “trilateral”, Anderson, “trilateral”, Carter...
SM: Há artigos nas revistas Newsweek,TIME, US News &World Report,... muitos na grande mídia nos dizendo que não realmente há nada a se preocupar com a Comissão Trilateral. Há alguma interligação entre a Comissão Trilateral e a grande mídia nos Estados Unidos?
AS: Sim, há uma interligação, particularmente na mídia de notícias, p.ex., no Chicago Sun Times, o editor-executivo James F. Hoge é um “trilateral”. Também Saul Linel (?) editor da revista TIME,..Henry Schut (?), um diretor da CBS. Então, definitivamente sim, há ligação entre a Comissão Trilateral e a mídia.
SM: Então talvez por isso minimizem a influência da Comissão Trilateral no atual governo americano.
AS: Através de um computador cheguei ao número total de artigos publicados sobre a Comissão Trilateral desde 1973, no mundo todo; e o número é de apenas setenta e três artigos.
SM: Qual a relação entre a Comissão Trilateral e o CFR (Council on Foreign Relations)?
AS: Bem, o CFR é uma organização muito mais antiga, fundada em 1920. Eu fiz um estudo sobre os membros da Comissão e do CFR e há uma sobreposição de aproximadamente cinquenta por cento.
CORTE
LEGENDA FINAL: Esta entrevista e outras entrevistas a Stanley Monteith foram filmadas no verão de 1980. Pouco depois disso, o Professor Sutton não mais esteve disponível para aparições públicas.
Transcrição e tradução: Henrique Dmyterko
Bibliografia de Antony Cyril Sutton, com alguns links para versões online:
  • Western Technology and Soviet Economic Development: 1917-1930 (1968)
  • Western Technology and Soviet Economic Development: 1930-1945 (1971)
  • Western Technology and Soviet Economic Development: 1945-1965 (1973)
  • National Suicide: Military Aid to the Soviet Union (1973)
  • What Is Libertarianism? (1973)
  • Wall Street and the Bolshevik Revolution (1974, 1999) (Online version) (Online Russian version)
  • Wall Street and the Rise of Hitler (1976, 1999) (Online version)
  • Wall Street and FDR (1976, 1999) (Online version)
  • The War on Gold: How to Profit from the Gold Crisis (1977)
  • Energy: The Created Crisis (1979)
  • The Diamond Connection: A manual for investors (1979)
  • Trilaterals Over Washington - Volume I (1979; with Patrick M. Wood)
  • Trilaterals Over Washington - Volume II (1980; with Patrick M. Wood)
  • Gold vs Paper: A cartoon history of inflation (1981)
  • Investing in Platinum Metals (1982)
  • Technological Treason: A catalog of U.S. firms with Soviet contracts, 1917-1982 (1982)
  • America's Secret Establishment: An Introduction to the Order of Skull & Bones (1983, 1986, 2002) (Online version)Back up online [1]
  • How the Order Creates War and Revolution (1985) (Online Russian version)
  • How the Order Controls Education (1985)
  • The Best Enemy Money Can Buy (1986) (Online version)
  • The Two Faces of George Bush (1988)
  • The Federal Reserve Conspiracy (1995) (Online Russian version (as Vlast' dollara))
  • Trilaterals Over America (1995) (Online version) (Online Russian version)
  • Cold Fusion: Secret Energy Revolution (1997)