terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Opus Dei - fatos e motivos para reflexão



De acordo com os Landmarks, “a Maçonaria impõe a todos os seus membros o respeito das opiniões e crenças de cada um. Ela proíbe-lhes no seu seio toda a discussão ou controvérsia, política ou religiosa…”.
Em minha opinião, importa clarificar se deve existir uma leitura literalista destas disposições ou se elas devem ser entendidas no contexto adequado das nossas sociedades actuais.
Existem substanciais diferenças entre discutir questões políticas gerais ou questões de índole político-partidária, bem como entre discutir questões relativas às legítimas opções religiosas de cada um ou os instrumentos perversos de dominação obscurantista das consciências humanas.
Aspectos fundamentais do progresso social e humano dos últimos 2 séculos tiveram, em diversos países, a intervenção decisiva de maçons e das próprias Ordens maçônicas.
Ora, esta intervenção teve, inevitavelmente, um conteúdo político em torno de grandes princípios e valores do progresso civilizacional, que uniram vontades e energias de muitos maçons com diferentes posicionamentos partidários e religiosos no mundo profano.

Basta lembrar as seguintes lutas:

- Contra os extremismos políticos e absolutismo religioso;
- Contra as guerras;
- Pela liberdade e igualdade dos cidadãos perante a lei;
- Pela autodeterminação dos povos;
- Pelos governos representativos e democráticos;
- Pela justiça social e de igualdade de oportunidades para todos os cidadãos;
- Pela separação entre o Estado e a Igreja;
- O ensino ao alcance de todos;
- Pela supressão da miséria e da alienação humanas;
- Criação do registo civil;
- Criação de protecção social nas doenças profissionais.

Esta enumeração sintética permite verificar que a adopção de uma rígida posição de mera actividade especulativa, não complementada com a intervenção no mundo profano e na estrutura geral da sociedade, não possibilita à nossa Ordem ter um adequado papel no aperfeiçoamento moral dessa mesma sociedade, nem contrariar as forças que buscam a instauração de um qualquer sistema obscurantista de intolerância e fanatismo.
Aliás, acontecimentos ocorridos em vários países, inclusive no nosso, permitiram a instauração de regimes totalitários e opressores que custaram a vida de muitos cidadãos livres, a começar pelos maçons, e determinaram a proibição e perseguição das Ordens maçônicas.
Ainda recentemente, a realização de um violento atentado a um restaurante em Istambul onde se encontravam maçons, matando e ferindo diversos irmãos, revela um preocupante recrudescimento das actividades de grupos fanáticos religiosos.
Os termos em que o atentado foi reivindicado pela organização terrorista Al Qaeda, torna indiscutível que se tratou de uma acção premeditada e bem dirigida a um objectivo definido com a ameaça de que outras se seguirão.
O facto de estarmos a assistir a uma acentuada degradação moral e de valores da nossa sociedade e uma crise de credibilidade dos principais instrumentos do regime democrático, os partidos políticos, coloca sérias preocupações, conferindo, em minha opinião, uma importância acrescida à nossa Ordem.
Os maçons, ao estarem unidos fraternalmente em tolerante harmonia, têm a possibilidade de manterem um amplo “denominador comum” de valores e princípios que se sobrepõem a outras opções no mundo profano, numa transversalidade indispensável às grandes mudanças da sociedade.
Estas considerações prévias têm como objectivo salvaguardar, em toda a sua plenitude, que o conteúdo desta prancha não possui qualquer questionamento de índole religioso, mas antes proceder a uma caracterização genérica de uma organização que, a coberto de uma exarcebada exaltação católica, tem meras finalidades políticas, ideológicas e econômicas.


As origens da OPUS DEI

O fundador da “Obra de Deus” foi José Maria Escrivá, que nasceu em 1902 na pequena cidade espanhola de Barbastro. Foi ordenado padre em 1925.
Na justificação apresentada para a sua “santificação”, é afirmado que após 3 anos de sacerdócio teve uma visão de Deus que lhe incumbiu a tarefa de iniciar esta “obra”.
Escrivá redigiu a primeira carta pastoral com a data de 24 de Março de 1930, que iniciou o programa básico da O.D., tornando-se conhecida por “Singuli Dies”. Com os primeiros recrutamentos de membros, Escrivá passou a exigir que o tratassem por “pai”.
Nos anos 30, o celibato permaneceu como um requisito preliminar para ser aceite como membro e os membros não solteiros, os chamados supranumerários, só seriam admitidos nos anos 50.
Com o posterior crescimento numérico foram criadas 4 categorias de membros: os numerários (que praticam o celibato), os supranumerários (casados), os agregados (que trabalham em exclusivo para a organização) e os cooperadores (contactos permanentes como simpatizantes).
Em 1933, a “Obra” lançou a sua primeira iniciativa através do aluguer de um apartamento no centro de Madrid que serviu para a instalação de um instituto privado que oferecia cursos complementares a estudantes universitários com o nome “DYA”. Para o exterior, estas letras significavam “Derecho y Arquitectura”, mas a alguns estudantes, considerados como recrutas certos, foi-lhes comunicado que o seu verdadeiro significado era “Deus y Audácia”.
Meses depois, este instituto foi transformado numa residência de estudantes, uma vez que foi considerado que isto iria criar uma atmosfera mais atractiva para o recrutamento de novos membros. Escrivá ficou aí com um escritório que era conhecido como o “quarto do pai”. Com a eclosão da guerra civil em 1936, Escrivá disfarça-se e passa a utilizar a aliança de casamento da mãe.
A enorme violência dos confrontos armados e a extrema radicalização de ambos os lados do conflito tinham determinado uma crescente barbaridade de métodos de actuação, com o recurso indiscriminado a torturas e fuzilamentos.
Do lado das forças republicanas, verificava-se em diversos sectores um marcado anticlericalismo que levou à perseguição e fuzilamento de um considerável número de padres em toda a Espanha. Afirmando aos seus discípulos que tinha sido encarregue de uma missão divina e que deveria fazer tudo o que estivesse ao seu alcance para continuar vivo, decidiu fugir para uma clínica psiquiátrica nos arredores de Madrid, onde aprendeu a simular o comportamento dos doentes mentais.
Alguns meses depois fugiu para a representação diplomática das Honduras, juntamente com outros elementos da “Obra”. Após 5 meses, fugiu para Valência e, posteriormente, para Barcelona. Desta cidade foram para Andorra.
A 21 de Março de 1939, Escrivá regressa a Madrid com as primeiras colunas militares franquistas. A partir desta data, esta organização deixou o seu estado embrionário e passou a um activo desenvolvimento.
A “limpeza” que se seguiu à instauração do regime fascista de Franco, através da impiedosa perseguição a todos os suspeitos de terem colaborado com a Frente Popular Republicana, acrescentou, nos anos seguintes, mais 200.000 mortes às 500.000 verificadas durante a guerra civil.
No final de 1939, Escrivá publicou o livro “O Caminho” contendo 999 máximas religiosas. Tratava-se de um manual de clericalismo autoritário que levou, por exemplo, que o professor de teologia na Universidade de Granada, José Maria Castillo, tenha afirmado que não havia no seu conteúdo lugar a qualquer discernimento e que “discernimento é a expressão do verdadeiro culto dos cristãos; põe em prática o nosso viver como filhos das luz, em vez de filhos das trevas… pode-se dizer que, bem lá no fundo, o livro não é cristão”.
Este artigo provocou a ira da “Opus Dei” e pouco tempo depois a licença deste professor para ensinar teologia foi anulada. “O Caminho” não tolera nem a dúvida nem a crítica e afirma que os verdadeiros cristãos devem ser disciplinados e obedientes a um director espiritual.
Mas o padre Castillo referiu no citado artigo que “O Caminho” conduz inevitavelmente à alienação do indivíduo e a uma cumplicidade concebida de forma doentia com o mundo, a qual Jesus rejeitava e pela qual foi rejeitado para morrer”.
O primeiro objectivo estratégico traçado por Escrivá foi controlar o ensino superior. Em Novembro de 1939, Ibañez Martin, ministro da educação de Franco, criou o Conselho Superior de Investigação Científicas (CSIC), que se tornou a principal cobertura para o assalto da Opus Dei ao ensino superior, e também ajudou a financiar a sua expansão no estrangeiro. Como vice-presidente desta estrutura foi nomeado o padre López Ortiz, que era um dos principais elementos da Opus Dei.
O Conselho Superior de Investigação Científicas determinava quem obtinha bolsas de estudo para pós-graduações e doutoramentos no estrangeiro, bem como subsídios de estudo.
Em 1940, José Maria Escrivá enviou um pedido ao Ministério da Justiça, que foi aceite, para mudar o nome de família para Escrivá de Balaguer, “de modo a distinguir-nos de outros Escrivás”.
Em 1943 é aplicada uma lei que estabelecia a exigência dos estudantes pertencerem a uma residência universitária para poderem ingressar no ensino superior. Estando preparada para esta exigência legal, e procurando atrair uma elite jovem, a Opus Dei desencadeou uma vasta operação com o objectivo de proceder à abertura do maior número possível de residências universitárias. No final da 2ª Guerra Mundial, a Opus Dei abriu a sua primeira residência de estudantes fora de Espanha, na cidade de Coimbra.
Fruto de múltiplas acções de envolvimento junto da Cúria Romana, o Papa Pio XII emitiu um decreto de reconhecimento da Opus Dei em Fevereiro de 1947. Estas acções de Escrivá e de Álvaro del Portillo, mais tarde seu sucessor, foram mediadas pelo cardeal Montini, mais tarde Papa Paulo VI. A rápida promoção de Escrivá na hierarquia clerical foi organizada por Montini, que o apresentou a um político italiano então em ascensão, Giulio Andreotti.


Desenvolvimento e diversificação da actividade

Com o claro objectivo de estar mais perto dos centros de decisão da Cúria Romana, a sede da Opus Dei é transferida, nessa altura, para Roma, em Villa Tevere. Com a ampla protecção política de Franco e com a progressiva conquista “silenciosa” de importantes lugares a nível das instituições mais relevantes, a Opus Dei começou a rivalizar com a Falange, único partido político autorizado.
A partir de 1949, é desenvolvida uma impressionante rede da Opus Dei no México que se transforma na 3ª potência, a seguir à Espanha e Itália. Logo a seguir vieram os Estados Unidos, contando com o papel de vulto de Sargent Shriver Jr. e de sua mulher, Eunice Kennedy. Eram os 2 membros da Opus Dei. Eunice Kennedy era familiar de John Kennedy e a Opus Dei teve um importante papel na respectiva candidatura presidencial.
Em 1950, foram abertos diversos centros no Chile e Argentina. Em Espanha, neste ano, já cerca de 1/3 de todos os departamentos universitários eram chefiados por membros da Opus Dei.
A partir do Verão de 1951, Escrivá passou a exigir que antes das refeições a comida passasse a ser previamente provada na sua presença, prática que manteve até ao fim da vida. Neste ano, em Espanha, emergiu um novo homem forte junto de Franco, o Almirante Carrero Blanco, também membro da Opus Dei. Outro numerário da Opus Dei, Lopez Rodó, foi nomeado para a importante tarefa de conduzir as negociações da Concordata com o Vaticano e Ibañez Martin, também da Opus Dei, foi nomeado embaixador em Portugal.
É ainda no início da década de 50 que, a nível da Opus Dei, se estabelecem 2 facções em torno do futuro político da Espanha pós-Franco: uma defendia o restabelecimento da monarquia com D. Juan, filho de Afonso XIII, que vivia exilado em Portugal, e outra que favorecia esta solução com Juan Carlos, o filho mais velho de D. Juan.
Escrivá de Balaguer decidiu fundar uma Universidade própria para a Opus Dei: o Estudo Geral de Navarra (Pamplona) ligado à Universidade de Saragoça. No final de 1953, este estudo geral foi transformado em universidade pontifícia.
Em Julho de 1957, devido à contínua degradação social, política e económica da Espanha, foi nomeado um novo governo em que as posições chave foram ocupadas por membros da Opus Dei, reduzindo a posição da Falange a 3 ministérios. Pouco depois de ter sido anunciado o novo governo, a cúpula da Opus Dei emitiu uma declaração negando o seu envolvimento na política.
Também nesse ano, o Papa entregou uma recém-criada “prelatura nullius” no Perú, a prelatura de Yanyos, à Opus Dei, e com o apoio financeiro da Fundação Adeveniat criaram uma rádio (Estrela do Sul) para difundir programas religiosos. Mais tarde, em 1964, criaram uma 2ª estação (Escolas Radiofónicas Populares Andinas) para emitir programas para mais de 300 escolas distritais.


O escândalo Matesa

Em Julho de 1956, o empresário Juan Vilá Reyes fundou uma companhia de apoio técnico para a indústria têxtil com o nome de “Maquinaria Têxtil del Norte de España, Sociedade Anónima”, que abreviou para Matesa. Tratou-se do primeiro grande escândalo no âmbito financeiro com o directo envolvimento da Opus Dei. Na sequência desta gigantesca fraude desapareceu, sem qualquer rasto, uma avultada soma de dinheiro e 2 banqueiros apareceram mortos.
Vilá Reyes, em 1958, inscreveu-se no curso de gestão do Instituto de Estudos Superiores de la Empresa (IESE), que pertencia à Opus Dei. O IESE estava incorporado na Universidade de Navarra e mais tarde associou-se com a Harvard Business School.
Após a licenciatura, os jovens eram acompanhados nas suas carreiras para que, directa ou indirectamente, ficassem ligados à Opus Dei. Um dos primeiros licenciados foi Juan António Samaranch, futuro presidente do Comité Olímpico Internacional.
A ampla e obscura rede tentacular desenvolvida em torno dos negócios da Matesa envolveram os então ministro do comércio, o numerário da Opus Dei Alberto Ullastres, o ministro das finanças Juan José Espinosa San Martin, da Opus Dei, Mariano Navarro Rubio, governador do Banco de Espanha, da Opus Dei, Giscard d’Estaing ministro francês das Finanças, e o Príncipe Jean de Broglie, um dos fundadores do partido de Giscard d’Estaing (Partido Republicano Independente).
A Matesa criou, entretanto, várias sociedades tipo “holding” no Luxemburgo, nomeadamente a Sodetex que envolvia o referido príncipe e Robert Leclerc, principal accionista do Banco de l’Harpe de Genéve, mais tarde Banco Leclerc. O escândalo torna-se público no Verão de 1969, em função da acção do ministro da informação, Fraga Iribarne, um dos poucos ministros falangistas e opositor assumido da Opus Dei.
Segundo diversas referências bibliográficas, Franco terá ficado enfurecido com os ministros falangistas e pendeu para a Opus Dei neste processo, possibilitando um autêntico golpe de Estado palaciano com a nomeação de um novo governo, em Outubro de 1969, chefiado por Carrero Blanco e constituído hegemonicamente por membros da Opus Dei: dos 19 ministros, 10 eram numerários e os restantes colaboradores muito próximos.
Apesar das tentativas desesperadas da ocultação dos factos, o escândalo teve grande impacto na opinião pública e acabou por determinar a nomeação de uma comissão de inquérito que teve de reconhecer a existência de financiamentos à Universidade de Navarra, ao IESE e até à campanha de reeleição do Presidente Nixon.
Um dos bancos que desempenhou uma importante função na fuga de capitais foi o “Credit Andorra”, que foi adquirido em 1955 com a intervenção do Banco Popular e por uma companhia auxiliar da Opus Dei, a Esfina, presidida por um numerário, Pablo Bofill Quadras. O “Credit Andorra” era o veículo privilegiado da transferência regular de elevadas somas de dólares para a conta da Opus Dei no IOR (Banco do Vaticano).
Só em Maio de 1975, Vilá Reyes foi condenado a 3 anos de prisão. Mas, seis meses mais tarde, quando Franco morreu, um dos primeiros actos do Rei Juan Carlos foi perdoar-lhe a pena. Entretanto, o Príncipe de Broglie foi morto, no final de 1975, numa rua de Paris por um atirador profissional.
Em Maio de 1977, foi declarada a falência do Banco Leclerc e dias depois o seu administrador geral, Charles Bouchard, apareceu afogado no Lago de Genéve. Curiosamente, era conhecido como um excelente nadador.


A tomada do Poder

A solução da restauração da monarquia em Espanha e a escolha do Príncipe Juan Carlos para sucessor de Franco na chefia do Estado foram delineadas pela Opus Dei, em consonância com o ditador, e tiveram em Lopez Rodó o seu principal estratega.
Em 22 de Julho de 1969, Franco anunciou a sua decisão de designar o Príncipe Juan Carlos para lhe suceder. Escrivá de Balaguer foi informado com grande antecedência da solução em desenvolvimento através do seu “filho” no governo, Lopez Rodó. Segundo algumas referências, esta solução teria sido estabelecida no final de 1966.
Assim, Escrivá de Balaguer encontrou-se no ano seguinte com D. Juan de Borbón, pai de Juan Carlos, que vivia exilado no Estoril, em Portugal. E ainda no decurso desse ano, solicitou ao Ministério da Justiça a reabilitação ao título de marquês de Peralta, argumentando que um hipotético familiar seu o tinha adquirido em 1718.
Um supranumerário da Opus Dei, sub-secretário do ministério, assinou favoravelmente o pedido, tendo Escrivá de Balaguer requerido também o baronato de San Filipe. Esta apetência desmedida por títulos da nobreza, desmentia a apregoada extrema humildade que a propaganda apresentava como uma das suas principais características pessoais.
Segundo uma teoria que circulou nos meios políticos, Escrivá de Balaguer pretendia ser nomeado regente no período transitório entre a designação do sucessor de Franco e a respectiva coroação, tendo em conta a conhecida doença que já afectava o ditador.
A nível do Vaticano, e apesar de estreitos contactos anteriores, o Papa Paulo VI acabou por não ceder em aspectos fundamentais das pretensões de Escrivá de Balaguer, tendo em conta a enorme influência que sobre ele exercia o Arcebispo Giovanni Benelli, o maior opositor da Opus Dei na Cúria Romana.
Com a morte de Paulo VI a 6 de Agosto de 1978 é eleito o Papa Albino Luciani que adopta o nome de João Paulo I. A sua eleição verificou-se num período em que se encontravam em desenvolvimento diversos processos financeiros de corrupção e as contas do Vaticano apresentavam notórios sinais de degradação.
João Paulo I, ao pretender desencadear um vasto conjunto de medidas que implicavam o afastamento de figuras envolvidas nesses processos, suscitou a ira dos sectores da Opus Dei na Cúria. Após 39 dias de papado apareceu morto na sua cama, tendo sido feito o diagnóstico de ataque cardíaco. O facto de se preparar para nomear Benelli seu secretário de estado, tinha constituído um dos factores essenciais dessa ira. Benelli iria a substituir o Cardeal Villot, um dos homens centrais da Opus Dei.
Além de Villot, o Papa tinha decidido também demitir Paul Marcinkus, presidente do IOR, Sebastiano Gaggio e Ugo Polleti, todos eles elementos chave da Opus Dei na Cúria para conseguir a canonização de Escrivá, a criação de uma prelatura pessoal e o próprio controlo das finanças do Vaticano.
Após uma disputada eleição com o Arcebispo Benelli, o cardeal polaco Wojtyla conseguiu atingir o lugar de Papa com o nome de João Paulo II. O cardeal Wojtyla já era conhecido como um incondicional elemento da Opus Dei, com visitas anteriores à sua sede em Villa Tevere.
Com a sua eleição todos os grandes objectivos da Opus Dei foram sendo concretizados, tendo procedido, gradualmente, à colocação de numerários em importantes cargos. Joaquín Navarro Valls foi nomeado seu porta-voz, Eduardo Martínez Somolo substituiu Paul Marcinkus como presidente da IOR e Rafaello Cortesini como responsável da “Congregação para a Causa dos Santos”.


Escândalo do Banco Ambrosiano

Este enorme escândalo culminou, em meados da década de 80, com o assassinato do principal responsável do Banco Ambrosiano, Roberto Calvi, que apareceu enforcado num andaime sobre o Tamisa, em Londres. Este processo envolveu inúmeras fraudes, utilização de diversas entidades bancárias e financeiras, algumas das quais fictícias, conhecidos políticos de vários países, entre os quais sobressai o nome de Andreotti, o IOR e, sobretudo, o aparelho da Opus Dei.
Importa referir que, em pleno desenvolvimento deste processo, o arcebispo Benelli, o opositor mais implacável da Opus Dei no Colégio dos Cardeais, morreu de ataque cardíaco, aos 62 anos.


Escândalo Rumasa

Em Fevereiro de 1983 surgiu também o escândalo da Rumasa. O dono da Rumasa, Ruiz Mateos, era um católico fanático, supranumerário da Opus Dei, que tinha em cima da sua secretária uma cópia encadernada de “O Caminho”.
Neste processo ficaram provados múltiplos financiamentos a diversas estruturas ligadas à Opus Dei e o facto da Rumasa ter servido de instrumento para que a Opus Dei controlasse uma rede internacional de bancos e instituições financeiras.
Ruiz Mateos fugiu para a Grã-Bretanha e mais tarde foi para a Alemanha, acabando por ser extraditado para Espanha em Novembro de 1985. Nas suas declarações aos magistrados revelou todo o tipo de fugas de dinheiro praticadas e os seus montantes. O destinatário destas enormes somas de dinheiro foi a Opus Dei, conforme os documentos apresentados.
Em 1989, foi operado de urgência a uma trombose mesentérica. Posteriormente, foi para a Clínica Mayo (EUA), tendo o relatório médico considerado como causa provável um envenenamento.
Em vários países, a Opus Dei foi adquirindo, por métodos indirectos, vários bancos, designadamente em Espanha, Suíça, França e EUA, destacando-se como exemplos o Banco Popular Español, o Banco Bilbao-Vizcaya, o Banque des Intérêts Français, o Nondfinanz Bank, o Banco Ocidental e o Continental Illinois Bank.
Já em 1963, Gregório Ortega, administrador regional em Portugal, tinha adquirido para a Opus Dei o controlo do Banco da Agricultura, uma importante participação no Banco de Angola e fundou a Lusofin, uma companhia financeira que gozou de apoio da ditadura portuguesa. Em 1965, este numerário foi preso em Caracas com malas cheias de dólares e jóias, e extraditado para Espanha. Neste país, quando chegou foi internado numa clínica psiquiátrica dirigida por um médico da Opus Dei.
Noutros campos, a Opus Dei foi também adquirindo empresas editoras, revistas e hotéis, neste caso através do Banco Ocidental, e criando fundações ou entidades de “caridade” que se tornaram instrumentos de penetração política e de movimentação de capitais. Já em 1979, a Opus Dei controlava, em todo o mundo, 52 rádios, 12 produtoras de cinema, 694 publicações diversas e 38 agências de informação.


A sua acção política

No seu desenvolvimento e ascensão, a Opus Dei contou com todos os apoios políticos, institucionais e financeiros da ditadura fascista de Franco, tendo Escrivá de Balaguer sido um dos seus mais directos conselheiros. Rapidamente ultrapassou as fronteiras espanholas para se assumir como uma força política defensora de soluções de extrema-direita.
Em 1949, dois supranumerários, Alfredo Sanchez Bella e o arquiduque Otto Von Habsburg, criaram o Centro Europeu de Documentação e Informação (CEDI), com o objectivo de constituir em torno dos Borbóns espanhóis uma federação de estados europeus unidos pelo cristianismo e anticomunismo. Embora sediado em Munique, efectuava as suas reuniões anuais no Mosteiro do Escorial, perto de Madrid.
O Prof. Luc de Hensch, da Universidade Livre de Bruxelas, afirmou, em 1993, que a rainha belga Fabíola, supranumerária da Opus Dei, tinha sido o veículo de inserção da Opus Dei na aristocracia católica da Europa.
As ligações do CEDI chegaram, mais tarde, a vários políticos americanos como o director da CIA, William Colby, o banqueiro David Rockefeller e Crosby Kelly. Também o conhecido político alemão de extrema-direita Franz Josef Strauss participava regularmente nas reuniões.
Durante a presidência de Reagan, nos EUA, Carl Anderson, um dos seus principais conselheiros e detentor de grande influência em todo o aparelho da Casa Branca, era supranumerário, e vários cardeais como Terence Cooke, de Nova Iorque, eram conhecidos como membros da Opus Dei.
Posteriormente, o então presidente Bill Clinton nomeou, em 1993, como director do FBI um conhecido supranumerário, Louis Feech. A sua mulher também detinha esse estatuto e os respectivos 2 filhos frequentavam a escola da Opus Dei em Washington, “The Heights”.
Na Irlanda, um dos principais numerários da Opus Dei era Seamus Timoney, um professor de engenharia mecânica na University College, em Dublin. Dedicava-se a projectar avançados sistemas de armas e em 1957 juntou-se à “Industrial Engineering Designers Limited”, que se tornou uma das sociedades auxiliares da Opus Dei, em que 5 dos 6 fundadores eram numerários. Os armamentos produzidos foram vendidos a exércitos de vários países, com particular destaque para a ditadura de Pinochet, no Chile.
Michael Adams, outro dos principais numerários irlandeses, era conhecido por apoiar o lançamento de bombas pelo IRA. Aliás, existem diversas referências a eventuais financiamentos do Vaticano aos católicos do I.R.A., em paralelo com o que foi efectuado, e amplamente reconhecido, no início da década de 80, a nível do Solidariedade polaco, em que através da rede do Banco Ambrosiano foram fornecidas importantes somas de dinheiro.
Em Itália, G. Andreotti e Flaminio Picolli foram os políticos que desempenharam um papel de extrema importância para a concretização dos objectivos da Opus Dei. Andreotti era conhecido por manter uma cópia de “O Caminho” na sua mesa de cabeceira e de se vangloriar de ter sido a primeira pessoa a pedir ao Papa Paulo VI a santificação de Escrivá de Balaguer após a sua morte. Desde há largos anos que o papel desempenhado por estes 2 políticos tem sido assegurado por Silvio Berlusconi.
Em Espanha, o papel político hegemónico da Opus Dei sofreu um grave golpe com o assassinato de Carrero Blanco e com o escândalo da Rumasa. No entanto, com a eleição de Aznar para primeiro-ministro houve uma clara recuperação de posições. Aznar e a sua mulher encontram-se intimamente ligados à Opus Dei como supranumerários e o candidato designado por ele para disputar, pelo PP, as recentes eleições parlamentares espanholas, Mariano Rajoy, também é conhecido como supranumerário.
Vários membros do governo de Aznar eram membros da Opus Dei, sendo os mais conhecidos Angel Acebes, ministro do interior, José Maria Michavila, ministro da justiça, e Abel Matutes, ministro dos negócios estrangeiros. O comissário europeu espanhol, Marcelino Oreja-Aguirre é também membro da O.D., bem como o anterior presidente do Congresso de Deputados de Espanha, Federico Trillo.
Em Itália, a presidente do Congresso dos Deputados, Irena Pivetti, que é da extrema confiança de Silvio Berlusconi e indicada por ele, é da Opus Dei. Também em Portugal, o presidente da Assembleia da República, Mota Amaral, é conhecido como numerário.
A Agência Efe, que é a agência pública espanhola de notícias, constituiu, no início deste ano, um polémico assunto de discussão política e parlamentar, onde as acusações da sua instrumentalização pela O.D. foram claramente formuladas por um deputado galego, baseadas nos factos dos seus principais cargos estarem ocupados por supranumerários e do seu ostensivo comportamento noticioso de manipulação político-partidária. A própria TVE, empresa pública de televisão, tem sido acusada de comportamento idêntico, sendo presidida por Alfredo Urdaci, outro supranumerário.
Em Fevereiro deste ano, um dirigente político catalão, Joan Puigcercós, denunciou publicamente o facto do governo espanhol estar a desviar fundos públicos destinados a ajuda humanitária para entidades ligadas ao P.P. e à Opus Dei.
Logo após a 2ª Guerra Mundial, a Opus Dei utilizou 2 colaboradores directos do General de Gaulle, seus membros activos, para proceder à reciclagem de importantes católicos fascistas franceses, colaboradores dos nazis durante a ocupação e do governo do general Pétain, e colocá-los em cargos destacados. Estes colaboradores de De Gaulle eram Maurice Schumann e a condessa Teresa, mulher do Marechal Leclerc de Hautecloque.
A nível das próprias instâncias da União Europeia a penetração crescente de membros da Opus Dei suscita, em amplos sectores, grandes preocupações. Esta influência determinou que, em 19 de Junho de 2000, Javier Solana tenha decido impedir, por pressões da Opus Dei, a realização de uma reunião mensal da associação de funcionários da União Europeia, que tinha convidado Thierry Meyssan, presidente do “Reseau Voltaire”, precisamente para discutir a ameaça da Opus Dei sobre a vida democrática das instituições europeias.
Importa também referir que o último presidente do Banco Central alemão, Hans Tiettmeyer, é membro da Opus Dei.
Um artigo da revista “Kale Gorria” revelou que Raymond Barre, ex-primeiro-ministro francês, Christine Boutin, ex-secretária de estado, o príncipe Michel Poniatowski, ex-ministro do interior, Louis Schweitzer, patrão da Renault, Bernardette Cordón de Courecel, mulher de Jacques Chirac, Ettore Bernabei, ex-presidente da RAI, Jeanne Kirpatrick, ex-embaixadora dos EUA na ONU, e Jacques Santer, ex-presidente da União Europeia, são todos membros da Opus Dei. Referiu ainda, que os patrões das companhias seguradoras AXA e AGF são também membros da Opus Dei.
A nível da América Latina existe um conjunto de factos que importa referir no âmbito de vários países. Na Argentina, em Junho de 1966, o general Juan Carlos Organía, membro da Opus Dei, fez um golpe de Estado fascista, na sequência de um “retiro” religioso num centro desta organização. Procedeu à destruição das várias conquistas sociais em vigor, com particular destaque para a escola pública laica.
Durante as ditaduras posteriores, verificou-se uma íntima ligação da O.D. com o Poder ditatorial, em particular com o general Jorge Videla que mereceu o seu apoio total e empenhado, existindo múltiplos membros nas mais destacadas posições institucionais do regime fascista. Durante o governo de Carlos Menem, a Opus Dei conseguiu um poder substancialmente acrescido devido às íntimas ligações existentes entre eles e ao facto de vários ministros serem assumidamente supranumerários.
Ao longo das últimas décadas, os diversos escândalos financeiros envolveram diversos empresários membros da Opus Dei e até membros do clero com o mesmo estatuto. No início da década de 80, o empresário José Rafael Trozzo levou à falência fraudulenta o Banco de Intercâmbio Regional com o desaparecimento de uma soma superior a 1.000 milhões de dólares. Refugiou-se no México.
A família Trusso, no final da década de 90, esteve envolvida no escândalo de falência fraudulenta do Banco de Crédito Provincial, com o desaparecimento de 200 milhões de dólares, tendo este processo dado origem a várias prisões, incluindo o monsenhor Renato Toledo, também membro da Opus Dei. A família Trusso é conhecida por possuir ligações directas ao Vaticano.
Outros escândalos envolveram negócios de droga e cheques fraudulentos, em que as dependências do Banco Ambrosiano assumiram um papel decisivo nas respectivas operações bancárias. Há que referir também o escândalo da mútua militar “Sociedade Militar Seguros de Vida” que procedeu a empréstimos de 10 milhões de dólares ao próprio arcebispado.
Em 2002, a Universidade Austral, pertencente à Opus Dei e ligada a diversos escândalos financeiros, apresentou a candidatura para a realização de cursos de formação de dirigentes para o desenvolvimento de comunidades locais, abrangendo 700 pessoas, e cujo objectivo é formar quadros político-administrativos para serem inseridos a nível dos governos municipais e regionais.
Com a eleição do actual presidente Néstor Kirchner e a posterior constituição do governo, existe pelo menos um ministro da Opus Dei, Gustavo Béliz, na pasta da justiça. Tinha sido ministro do interior de Carlos Menem e conhecido como um dos mais importantes operacionais desta organização.
Na Nicarágua, os últimos presidentes têm mantido estreitas relações com a Opus Dei, com particular destaque para o actual presidente Enrique Bolaños. O presidente do Conselho Superior Eleitoral, Roberto Rivas, é amplamente conhecido como membro da Opus Dei e tem estado envolvido em casos de corrupção e de cheques desaparecidos desta instituição. Também o canal estatal da televisão tem estado envolvido em escândalos com protagonistas referenciados à Opus Dei.
No Peru, a influência da Opus Dei atingiu o auge com o governo totalitário de Fujimori, a quem manteve um apoio total. O cardeal de Lima, Juan Luis Cipriani, conhecido como um activo e importante membro da Opus Dei, foi um infatigável defensor das atrocidades do regime de Fujimori e chegou a declarar que “as mortes, os desaparecimentos e os abusos fazem parte da confrontação vivida pela sociedade peruana durante duas décadas”.
Estas palavras recordam as declarações do próprio Escrivá na sua visita ao Chile, em 1974, considerando que o sangue derramado por dezenas de milhares de patriotas assassinados “era necessário”. O próprio escritor conservador Vargas Llosa declarou, em Janeiro de 2001, na Universidade Peruana de Ciências Aplicadas, que a Opus Dei “é um sector muito minoritário, mas poderoso, totalmente integrado na ditadura e que vai ser um obstáculo para a democratização”. Fujimori, de quem se dizia ser supranumerário, foi apoiado politicamente pelo movimento “Renovação”, cujo presidente, Rafael Rey, é numerário.
Em El Salvador, o arcebispo deste país, Fernando Saenz Lacalle, destacado numerário da Opus Dei, tem sido um dos principais sustentáculos de sucessivos governos ditatoriais e é conhecido pelas suas ligações aos sectores militares extremistas e aos grupos paramilitares responsáveis por milhares de assassinatos, incluindo personalidades da Igreja como foi o caso do Arcebispo Óscar Romero.
No Uruguai, na sequência da crise financeira de Julho e Agosto de 2002 foram presos diversos membros da família Peirano, todos membros da Opus Dei, por fraudes financeiras. Esta família da Opus Dei está ligada ao Banco de Montevideo, Banco Velox e outras instituições financeiras no Paraguai e Brasil. Só no Banco de Montevideo a fraude ascendeu a 390 milhões de dólares. Por seu intermédio, a Opus Dei controla vários jornais e revistas.
No início da década de 80, a Opus Dei estabeleceu uma aliança com a seita Moon para sustentar o governo fascista do general Gregório Alvarez. O actual governo do presidente civil Luis Alberto Lacalle conta com diversos ministros da Opus Dei. O ministro da saúde, Carlos Delpiazzo, suspendeu as campanhas de luta contra a SIDA e outro ministro, Mariano Brito, proibiu as fecundações in vitro. O director do Banco Central, Ramon Diaz, é membro da Opus Dei.
Nas Honduras, em 1992, o então presidente, Rafael Leonardo Callejas, emitiu um decreto que concedeu o “título de filho predilecto das Honduras” a Escrivá de Balaguer.
No Haiti, a Opus Dei conseguiu o apoio directo do Vaticano para desencadear múltiplas acções políticas contra o presidente democraticamente eleito, o padre Bertrand Aristid.
Na Venezuela, os acontecimentos políticos dos últimos 3 anos têm sido planeados e desenvolvidos por membros da Opus Dei, na contestação activa ao governo de Hugo Chavez e em estreita articulação com a actual cúpula do Poder nos EUA. Charles Shapiro, embaixador americano em Caracas, e Otto Reich, assessor do presidente americano para os assuntos latino-americanos, são membros destacados da Opus Dei.
O falhado golpe de Estado de Abril de 2002 teve em destacados membros da Opus Dei os seus organizadores principais. A proclamação política do golpe foi redigida por membros da Opus Dei e o empresário Pedro Carmona, que se autoproclamou presidente, também é membro da Opus Dei. José Rodriguez Iturbe, deputado, membro destacado da Opus Dei, tem sido um dos organizadores mais activos da conspiração política em desenvolvimento neste país. O cardeal Baltazar Porras, grande animador do plano golpista, é dado como um elemento da extrema confiança da Opus Dei. A PDVSA, a empresa petrolífera estatal, era completamente dominada por gestores da Opus Dei e desempenhou um papel central na sabotagem económica.
O Chile constitui, talvez, o caso mais paradigmático da sinistra intervenção política da Opus Dei. Durante a década de 60, a Opus Dei enviou o jovem padre espanhol José Miguel Ibañez Langlois, que se tornou rapidamente no seu principal ideólogo na América Latina. Dois dos seus primeiros recrutas foram os activistas de direita Jaime Guzman e Alvaro Puga, que se tornaram editores do jornal “El Mercúrio”.
Este jornal, em que o próprio Ibañez Langlois desempenhava as curiosas funções de crítico literário, desempenhou um papel fundamental na preparação do golpe fascista de Pinochet, de que resultou a morte do grande patriota e maçon Salvador Allende, presidente da República do Chile eleito democraticamente.
Os 3 principais membros da junta militar que tomou o Poder, general Augusto Pinochet, o general Jaime Estrada Leigh e o almirante José Merino, eram membros supranumerários ou cooperadores da Opus Dei. Algumas semanas após o golpe, Escrivá de Balaguer deslocou-se a Santiago do Chile para celebrar uma acção de graças em honra do que chamou o seu “filho espiritual”, Augusto Pinochet.
A operação ordenada pela CIA com vista à execução do golpe, foi planeada dentro do “Instituto de Estudos Gerais” pertencente à Opus Dei. Este instituto teve como fundadores Álvaro Puga, Herman Cubillos, Pablo Barahona e Jaime Guzmán… todos membros da Opus Dei.
Após o golpe, Álvaro Puga foi o porta voz de Pinochet, Herman Cubillos ministro dos negócios estrangeiros, Pablo Baraona ministro da economia e Jaime Guzman foi o redactor da nova constituição. Pablo Baraona foi o responsável pelo desencadeamento das medidas económicas que conduziram ao empobrecimento da grande maioria dos chilenos, fazendo parte da Escola de Chicago, de Milton Friedman.
Mais tarde, Pinochet foi nomeado como um dos mais altos dignitários da Ordem de Malta e divulgada a sua condição de supranumerário. Há alguns anos atrás, quando Pinochet foi objecto de prisão domiciliária em Londres na sequência de um processo internacional desencadeado por um juiz espanhol, foi o Vaticano e a Opus Dei que moveram todas as suas influências para conseguir a sua libertação e o regresso ao Chile.
Em 1993, João Paulo II, a propósito dos 50 anos de casamento do ditador, enviou-lhe felicitações e a sua benção, e em 1994, a propósito de mais um aniversário, enviou-lhe a benção através de vídeoconferência e chamou-lhe “defensor da fé”. Ainda hoje, a Opus Dei continua a dominar grande parte das Forças Armadas e a grande maioria das universidades chilenas.


Considerações Finais

A Opus Dei constitui uma poderosa máquina política e ecómica, caracterizada por concepções profundamente totalitárias, um funcionamento paramilitar de obediência cega, métodos sofisticados de manipulação de consciências e de eliminação física, bem como de hegemonização das finanças e do poder de decisão do Vaticano.
Simultaneamente, tem sido a portadora de uma visão fundamentalista e intolerante da religião católica, defensora da “guerra santa”, e sempre aliada de ferozes ditaduras de extrema-direita e o seu principal sustentáculo político-ideológico.
O jurista nicaraguense Gustavo Adolfo Vargas, afirmou que o livro “O Caminho” é a expressão de um catolicismo de cruzada, de luta e extermínio, da exaltação da vontade com fins belicistas e a divisão simplista dos homens em bons e maus”.
O seu desenvolvimento durante a ditadura de Franco, acabou por traduzir-se num sustentáculo decisivo para o prolongamento deste regime. E no que se refere às divergências que surgiram em diversos momentos com o partido falangista, importa ter em conta que elas não derivaram de questões políticas, mas pelo facto da Opus Dei se considerar, pela sua composição, uma estrutura de élite a quem caberia assumir a definição das opções estratégicas.
A criação da Opus Dei por Escrivá de Balaguer inspira-se nos conceitos de intolerância persecutória da Inquisição e em experiências fundamentalistas católicas como a Sapiniére de Umberto Benigni que contribuiu para a ascensão de Mussolini ao poder italiano na década de 20. A inspiração na Sapiniére foi, aliás, confirmada pelo então reitor da Universidade de Salamanca, António Tovar.
A influência decisiva junto de Franco foi conseguida, em grande medida, através da agitação do perigo de uma permanente conspiração judaico-maçónica-comunista. Franco era conhecido nos meios políticos como possuindo uma obsessão, quase patológica, contra a maçonaria.
A liberdade de pensamento foi sempre ferozmente combatida por Escrivá de Balaguer. Auto-intitulou-se “pai”, elaborou “indexes” de livros proibidos para os seus “filhos” e proclamava o princípio de “humilha-te perante o teu superior”.
Escrivá de Balguer, como não reconhecia ninguém superior à sua autoridade, adoptou práticas violentas de auto-flagelação desde o início da sua liderança da Opus Dei, chicoteando-se até sangrar e usando cintos metálicos com bicos. Muitas vezes, a casa de banho do seu quarto foi encontrada com sangue abundante nas paredes e no chão.
Seria uma forma de se humilhar a si próprio?
O jornalista Héctor Ruiz Núñez, no seu livro “A Cara Oculta da Igreja”, referiu que a Opus Dei foi criada por um intelectual medíocre, ainda que dinâmico propagandista, que por detrás da sua fachada religiosa e espiritual é uma empresa privada de gestão.
Um dos principais teólogos de Espanha, Juan Martín Velasco, declarou que “Não podemos apresentar como modelo de vida cristã alguém que serviu o poder do Estado (referindo-se ao fascismo espanhol) e que usou este poder para catapultar o seu movimento. Um movimento que Escrivá dirigiu com critérios obscuros - como se comandasse uma Mafia de colarinho branco - sem aceitar a orientação dos papas que não coincidissem com a sua maneira de pensar”.
Em diversos meios, a Opus Dei tem sido designada por “Santa Mafia”.
Na América Latina, um dos principais objectivos foi o impiedoso combate político à crescente importância adquirida pela Teologia da Libertação junto do clero e dos crentes. Nesse sentido, e apesar dos casos já relatados de mortes “estranhas”, é indispensável relatar os casos de monsenhor Arturo Rivera Damas e do padre Giuliano Ferrari, que se inseriam nesta corrente católica.
O monsenhor Arturo Rivera Damas substituiu o monsenhor Óscar Romero como arcebispo de S. Salvador. Este último, era um padre humanista, adversário intrasigente da ditadura salvadorenha e conhecido como “um defensor dos pobres”. Enquanto celebrava missa foi assassinado, em 24 de Março de 1980, por esquadrões da morte que, como vimos, tinham ligações a políticos da Opus Dei.
Arturo Rivera Damas foi um continuador do seu antecessor, tendo despertado rápidas animosidades dos mesmos sectores, o que determinou que tivesse sido chamado ao Vaticano em Novembro de 1994.
Ao fim de alguns dias, teve um violento ataque cardíaco e morreu instantaneamente. Na véspera tinha dado uma entrevista em que à pergunta do jornalista sobre se a Teologia da Libertação estava morta, respondeu que “a salvação trazida por Nosso Senhor inclui o conceito de libertação de toda a opressão. Esta visão fundamental de salvação tem que estar sempre em mente. É por isso que eu acredito que esta forma de teologia não está acabada mas ainda tem bastante a dizer”.
Foram palavras fatais!!!
Giuliano Ferrari, nomeado pelo Papa para dirigir a “Sociedade de Deus para a Humanidade na América Latina” foi para a Guatemala no final de 1969, depois de passar pelo Equador e El Salvador onde teve graves problemas de perseguições com membros dos respectivos cleros. Na Guatemala, a hierarquia católica estava integralmente dominada pela Opus Dei, que desencadeou idênticas perseguições a este padre.
Após 8 anos de trabalho missionário nas favelas e nas comunidades rurais mais pobres, Ferrari foi retirado dos seus aposentos por 2 padres da Opus Dei e levado ao aeroporto com um bilhete para a Europa.
Alguns meses depois foi encontrado morto num comboio entre Genéve e Paris. Com 48 anos de idade, morreu com um violento ataque cardíaco. Não foi feita autópsia e não existe qualquer certidão de óbito.
A hegemonização do poder político e econômico do Vaticano com a intervenção activa de João Paulo II, permitiu que em 28 de Novembro de 1982 a Opus Dei fosse transformada na única prelatura pessoal. Uma igreja dentro da Igreja, em que o principal prelado da Opus Dei responde directa e exclusivamente ao Papa.
Em Outubro de 2002, concretizou-se a canonização de Escrivá de Balaguer pelo Vaticano, a mais rápida de toda a história da religião católica.
Segundo a descrição contida no livro “Os Espanhóis e Portugal”, na cerimônia realizada na Praça de S. Pedro, em Roma, esteve uma delegação portuguesa constituída por Mota Amaral, Ramalho Eanes e Manuela Eanes, Maria Barroso, Paulo Portas, Arlindo Cunha, Rui Machete e Messias Bento (juiz do Tribunal Constitucional). Neste livro, também é referido que um dos actuais vice-presidentes da Assembléia da República, Narana Coissoró, é cooperador da Opus Dei.
No nosso país, a nível do governo, outro ministro, o do trabalho, é conhecido pela sua clara inserção na Opus Dei.
A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, uma das entidades que mais dinheiro movimenta no nosso país, é dirigida por uma equipa ligada à Opus Dei, o mesmo acontecendo com a administração recentemente nomeada para a chamada “entidade reguladora da saúde”.
Em minha opinião, torna-se indispensável acompanhar atentamente, no nosso país, esta acção organizada, e dotada de vultuosos meios financeiros de infiltração das instituições. Os abundantes exemplos de outros países, mostram quais são os resultados dramáticos desta infiltração que não olha a meios para atingir os seus fins implacáveis.
Não é por acaso, que o Parlamento belga, há cerca de 3 anos, incluiu a Opus Dei na lista das 10 seitas mais perigosas do mundo e que nos EUA foi constituída a associação “Opus Dei Awareness Network Inc.” para defender os cidadãos das actividades da “Obra”.
Para que possam continuar a existir liberdade de pensamento, liberdades cívicas, democracia política, direitos sociais e progresso civilizacional, não pode ser adoptada, em minha opinião, uma atitude indiferente ao desenvolvimento de uma estratégia deste tipo.
Há que fortalecer, e muito, a Luz para que o regime das trevas não se torne ameaçador.

José Martí

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