Um país livre da corrupção não é utopia, de acordo com o juiz Mozart Valadares, presidente da AMB. Viajando pelo Brasil para divulgar o projeto ´Eleições Limpas´, encampado pela entidade, desde 2006, ele afirma que a mobilização da sociedade é o único caminho rumo à ética e à transparência na administração pública. ´Se a sociedade não estiver mobilizada não vai acontecer absolutamente nada´, diz.
O Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao poder pregando a transparência e a ética na administração pública. Escândalos de corrupção, contudo, permearam os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O senhor acredita que o fim da corrupção é uma utopia?
Tenho convicção que não. Muita gente pensava que a ditadura iria se perpetuar neste país e, no entanto, a sociedade conquistou a democracia. Da mesma forma, vamos conquistar um país mais decente, mais ético. É uma questão da sociedade estar mobilizada e consciente do seu papel no processo da escolha da nossa representação política. A corrupção é o ponto negativo do governo Lula. O PT chegou ao poder reivindicando a ética e a transparência na política deixa muito a desejar neste campo. A relação com o Congresso Nacional, por exemplo, não foi institucional; foi uma relação que aprofundou uma troca de favores. Mas, mobilizada, tenho certeza que a sociedade brasileira conquistará um país menos desigual e corrupto. As maiores conquistas sociais deste país foram alcançadas durante a Constituinte porque a sociedade estava dentro do Congresso Nacional. Representantes de diversos segmentos estavam lá, houve mobilização. Não há outro mecanismo, outro instrumento. Todo o resto é ilusão. Se a sociedade não estiver mobilizada não vai acontecer absolutamente nada neste país.
Sendo assim, o senhor acredita que o PT ainda tem condições de empunhar a bandeira da transparência?
O partido pode fazer uma reflexão e uma refundação de suas raízes, expurgando todo este lixo no campo ético. Ao mesmo tempo, os escândalos são sucessivos, e, portanto, acho muito difícil e não enxergo nenhuma postura mais ativa de seus dirigentes para que o PT volte a ser identificado como aquele partido que defende a ética e a transparência e pratica estes valores na administração pública.
O senhor acredita que os casos de corrupção que ganham visibilidade contribuem mais para aumentar a descrença dos eleitores ou para fortalecer a democracia, a medida em que, pelo menos aparentemente, são investigados?
Há estes dois sentimentos. A descrença existe porque a corrupção foi praticada por um segmento político no qual o povo depositava muita confiança na ética, na transparência, na honestidade. Ao mesmo tempo, serve para que a população possa se mobilizar e começar a fazer uma fiscalização maior, principalmente num ano eleitoral. Só assim será possível identificar aquele político que vem servir ao interesse público e aquele que vem se servir do Estado e fazer fortuna, o que é incompatível com o Estado Democrático de Direito.
Onde está a raiz da corrupção no Brasil?
Temos que observar que o País mudou muito. Já tivemos o impeachment de um presidente, vez por outra temos parlamentares cassados, magistrados perdem seus cargos. Isso é típico da juventude da nossa democracia e, em sua consolidação, temos avanços e recuos. A sociedade está mais exigente, o controle social está mais rigoroso. Isso é bom para que possamos alcançar, num curto espaço de tempo, um patamar de país de cuja classe dirigente possamos nos orgulhar de verdade.
Então, não há uma única raiz para a corrupção...
Existe uma mobilidade muito grande quanto à forma como essa corrupção se manifesta. No entanto, sou extremamente otimista e crente que vamos combater com muita eficácia e conseguir ultrapassar esse momento e chegar a um país que tenha um índice do corrupção suportável, mínimo; que as pessoas possam acreditar na esmagadora maioria de sua classe dirigente, seja no Judiciário, no Legislativo ou no Executivo.
Para o senhor, as medidas adotadas neste sentido têm sido adequadas?
A atitude mais correta para mudança de um país, de uma mentalidade é a mobilização da sociedade. Não há mudança, se não houver uma mobilização, uma consciência da população de que o país precisa mudar. Além de já ter criado duas cartilhas em torno do tema, uma delas voltada para o público infantil - cujo protagonista é o personagem Menino Maluquinho, de Ziraldo -, a Associação dos Magistrados iniciou, em 2006, a campanha ´Eleições Limpas´. A idéia era despertar a sociedade para a necessidade de participar do processo político eleitoral, escolhendo seus candidatos e mudando a representação política e não utilizando aquele discurso da omissão, de que todos os políticos são ladrões. Nós temos um instrumento de cidadania como o voto e poderemos mudar este país. É preciso que as pessoas saibam que há políticos honestos, que estão interessados em melhorar o país. A sociedade tem que participar ativamente para que possamos pôr fim a esta epidemia de corrupção que vem assolando a nação brasileira.
Qual o peso da impunidade na proliferação deste problema?
O sentimento de impunidade é extremamente prejudicial para todos. A autoridade, seja de qual esfera do poder for, que utilizar o seu cargo para condutas ilícitas tem que ser punido exemplarmente. Quem deveria dar o exemplo não o faz. A sociedade precisa ter certeza de que todos são iguais perante a lei. A impunidade gera uma sensação de que é vantajoso ser corrupto, tirar proveito do serviço público. É preciso empenho das três esferas do poder: Judiciário, do Legislativo e do Executivo.
O senhor consegue apontar algum exemplo que mostre este empenho?
O Judiciário tem dado alguns exemplos, mas, infelizmente, os outros poderes ainda não. Hoje proibimos e combatemos o nepotismo; conseguimos abrir o voto secreto para a movimentação da carreira de juiz, coisa que o Legislativo ainda não conseguiu; e temos nossos ganhos limitados e de conhecimento público. Foram três conquistas que o Judiciário deu exemplo ao país. Isso mostra a vontade política de tornar este poder mais transparente e mais próximo da sociedade. Há, claro, algumas iniciativas do Legislativo e Executivo no sentido de se ter mais ética dentro do serviço público. Temos, em nível nacional, uma Controladoria Geral da União, que faz auditoria em todos os órgãos da administração pública. Além disso, hoje, raramente, a Câmara dos Deputados impede que um deputado seja investigado. São medidas que tentam avançar no campo moral. Mas temos que ter a compreensão da nossa democracia, que é jovem. Vamos completar esse ano 20 anos, apenas 20 anos de democracia. Essa democracia ainda tem muito a avançar, a se consolidar, fortalecer.
Em muitos casos, a compra de votos está diretamente relacionada à miséria da população. Por onde deve começar o combate à prática?
A Justiça Eleitoral está mais atuante, a legislação está mais rigorosa e a população está mais vigilante, denunciando esses casos de abuso de poder político e econômico nas eleições. Por isso que há tantas ações e cassações decorrentes do período eleitoral, quando se tenta comprar votos. Mas isso é um processo lento. Houve uma redução substancial, mas atualmente a prática ainda existe. A tendência é que a cada eleição vá diminuindo este segmento de pessoas que ainda acham que o voto tem preço e não graves conseqüências.
Que conseqüências um voto vendido pode ter?
Elas aparecem no caos da saúde pública, na falta de qualidade na educação, na violência, no déficit habitacional. São problemas decorrentes de um período eleitoral viciado. O eleitor vendeu um instrumento através do qual poderia mudar o país. Desperdiçou o voto.Quais as expectativas da AMB para as próximas eleições?A expectativa é que a sociedade esteja mais consciente do que em 2006 e estará muito mais consciente em 2010 do que em 2008. É um processo que tende a consolidar definitivamente a democracia no país. Temos convicção de que a sociedade irá cassar a maior parte dos políticos que utilizam a vida pública para atender interesses pessoais. O Brasil escolherá melhor os seus representantes este ano.
FILIPE PALÁCIO
Repórter
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=526856
O Partido dos Trabalhadores (PT) chegou ao poder pregando a transparência e a ética na administração pública. Escândalos de corrupção, contudo, permearam os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O senhor acredita que o fim da corrupção é uma utopia?
Tenho convicção que não. Muita gente pensava que a ditadura iria se perpetuar neste país e, no entanto, a sociedade conquistou a democracia. Da mesma forma, vamos conquistar um país mais decente, mais ético. É uma questão da sociedade estar mobilizada e consciente do seu papel no processo da escolha da nossa representação política. A corrupção é o ponto negativo do governo Lula. O PT chegou ao poder reivindicando a ética e a transparência na política deixa muito a desejar neste campo. A relação com o Congresso Nacional, por exemplo, não foi institucional; foi uma relação que aprofundou uma troca de favores. Mas, mobilizada, tenho certeza que a sociedade brasileira conquistará um país menos desigual e corrupto. As maiores conquistas sociais deste país foram alcançadas durante a Constituinte porque a sociedade estava dentro do Congresso Nacional. Representantes de diversos segmentos estavam lá, houve mobilização. Não há outro mecanismo, outro instrumento. Todo o resto é ilusão. Se a sociedade não estiver mobilizada não vai acontecer absolutamente nada neste país.
Sendo assim, o senhor acredita que o PT ainda tem condições de empunhar a bandeira da transparência?
O partido pode fazer uma reflexão e uma refundação de suas raízes, expurgando todo este lixo no campo ético. Ao mesmo tempo, os escândalos são sucessivos, e, portanto, acho muito difícil e não enxergo nenhuma postura mais ativa de seus dirigentes para que o PT volte a ser identificado como aquele partido que defende a ética e a transparência e pratica estes valores na administração pública.
O senhor acredita que os casos de corrupção que ganham visibilidade contribuem mais para aumentar a descrença dos eleitores ou para fortalecer a democracia, a medida em que, pelo menos aparentemente, são investigados?
Há estes dois sentimentos. A descrença existe porque a corrupção foi praticada por um segmento político no qual o povo depositava muita confiança na ética, na transparência, na honestidade. Ao mesmo tempo, serve para que a população possa se mobilizar e começar a fazer uma fiscalização maior, principalmente num ano eleitoral. Só assim será possível identificar aquele político que vem servir ao interesse público e aquele que vem se servir do Estado e fazer fortuna, o que é incompatível com o Estado Democrático de Direito.
Onde está a raiz da corrupção no Brasil?
Temos que observar que o País mudou muito. Já tivemos o impeachment de um presidente, vez por outra temos parlamentares cassados, magistrados perdem seus cargos. Isso é típico da juventude da nossa democracia e, em sua consolidação, temos avanços e recuos. A sociedade está mais exigente, o controle social está mais rigoroso. Isso é bom para que possamos alcançar, num curto espaço de tempo, um patamar de país de cuja classe dirigente possamos nos orgulhar de verdade.
Então, não há uma única raiz para a corrupção...
Existe uma mobilidade muito grande quanto à forma como essa corrupção se manifesta. No entanto, sou extremamente otimista e crente que vamos combater com muita eficácia e conseguir ultrapassar esse momento e chegar a um país que tenha um índice do corrupção suportável, mínimo; que as pessoas possam acreditar na esmagadora maioria de sua classe dirigente, seja no Judiciário, no Legislativo ou no Executivo.
Para o senhor, as medidas adotadas neste sentido têm sido adequadas?
A atitude mais correta para mudança de um país, de uma mentalidade é a mobilização da sociedade. Não há mudança, se não houver uma mobilização, uma consciência da população de que o país precisa mudar. Além de já ter criado duas cartilhas em torno do tema, uma delas voltada para o público infantil - cujo protagonista é o personagem Menino Maluquinho, de Ziraldo -, a Associação dos Magistrados iniciou, em 2006, a campanha ´Eleições Limpas´. A idéia era despertar a sociedade para a necessidade de participar do processo político eleitoral, escolhendo seus candidatos e mudando a representação política e não utilizando aquele discurso da omissão, de que todos os políticos são ladrões. Nós temos um instrumento de cidadania como o voto e poderemos mudar este país. É preciso que as pessoas saibam que há políticos honestos, que estão interessados em melhorar o país. A sociedade tem que participar ativamente para que possamos pôr fim a esta epidemia de corrupção que vem assolando a nação brasileira.
Qual o peso da impunidade na proliferação deste problema?
O sentimento de impunidade é extremamente prejudicial para todos. A autoridade, seja de qual esfera do poder for, que utilizar o seu cargo para condutas ilícitas tem que ser punido exemplarmente. Quem deveria dar o exemplo não o faz. A sociedade precisa ter certeza de que todos são iguais perante a lei. A impunidade gera uma sensação de que é vantajoso ser corrupto, tirar proveito do serviço público. É preciso empenho das três esferas do poder: Judiciário, do Legislativo e do Executivo.
O senhor consegue apontar algum exemplo que mostre este empenho?
O Judiciário tem dado alguns exemplos, mas, infelizmente, os outros poderes ainda não. Hoje proibimos e combatemos o nepotismo; conseguimos abrir o voto secreto para a movimentação da carreira de juiz, coisa que o Legislativo ainda não conseguiu; e temos nossos ganhos limitados e de conhecimento público. Foram três conquistas que o Judiciário deu exemplo ao país. Isso mostra a vontade política de tornar este poder mais transparente e mais próximo da sociedade. Há, claro, algumas iniciativas do Legislativo e Executivo no sentido de se ter mais ética dentro do serviço público. Temos, em nível nacional, uma Controladoria Geral da União, que faz auditoria em todos os órgãos da administração pública. Além disso, hoje, raramente, a Câmara dos Deputados impede que um deputado seja investigado. São medidas que tentam avançar no campo moral. Mas temos que ter a compreensão da nossa democracia, que é jovem. Vamos completar esse ano 20 anos, apenas 20 anos de democracia. Essa democracia ainda tem muito a avançar, a se consolidar, fortalecer.
Em muitos casos, a compra de votos está diretamente relacionada à miséria da população. Por onde deve começar o combate à prática?
A Justiça Eleitoral está mais atuante, a legislação está mais rigorosa e a população está mais vigilante, denunciando esses casos de abuso de poder político e econômico nas eleições. Por isso que há tantas ações e cassações decorrentes do período eleitoral, quando se tenta comprar votos. Mas isso é um processo lento. Houve uma redução substancial, mas atualmente a prática ainda existe. A tendência é que a cada eleição vá diminuindo este segmento de pessoas que ainda acham que o voto tem preço e não graves conseqüências.
Que conseqüências um voto vendido pode ter?
Elas aparecem no caos da saúde pública, na falta de qualidade na educação, na violência, no déficit habitacional. São problemas decorrentes de um período eleitoral viciado. O eleitor vendeu um instrumento através do qual poderia mudar o país. Desperdiçou o voto.Quais as expectativas da AMB para as próximas eleições?A expectativa é que a sociedade esteja mais consciente do que em 2006 e estará muito mais consciente em 2010 do que em 2008. É um processo que tende a consolidar definitivamente a democracia no país. Temos convicção de que a sociedade irá cassar a maior parte dos políticos que utilizam a vida pública para atender interesses pessoais. O Brasil escolherá melhor os seus representantes este ano.
FILIPE PALÁCIO
Repórter
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=526856
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