segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Os Vedas, textos fundadores

"Os deuses estenderam o Sacrifício com o homem para a oferenda"

O Homem com mil cabeças, mil olhos, mil pés, /Após ter coberto a terra de todos os lados, ele transbordou de dez dedos. / O Homem é tudo o que é, o que foi e o que será./ Ele também é mestre do imortal através de qual pelo alimento ele ultrapassa o crescimento/ Tal é seu tamanho, e maior ainda é o Homem/ Todos os seres são um quarto de sua dimensão, os três outros são o imortal no céu/ Com seus três quartos, o Homem subiu lá em cima/ Mas outro quarto permaneceu aqui, onde ele desenvolveu em todos os sentidos/ As coisas que comem e as que não comem./ Dele nasceu a Viraj, e da Viraj, o Homem/ Assim que ele nasceu, ele ultrapassou a terra detrás e de frente/ Quando os deuses estenderam o Sacrifício com o Homem para a oferenda,/ A primavera foi sua Manteiga, o verão sua Madeira, o outono sua Oferenda./ Sobre o junco, eles regaram a Vitima, o Homem, nascido no começo/ Os Deuses o sacrificaram e também os santos e os poetas./ Desse Sacrifício para a consumição total, a Manteiga diaprée foi recolhida/ Disso foram fabricados os animais do ar, da floresta e das aldeias./ Desse Sacrifício para a consumação total nasceram hinos e melodias/ Os metros nasceram delas, nasceram as cabras e as ovelhas./ Quando eles dividiram o Homem, em quantas partes eles o arrumaram?/ O quê tornou-se sua boca, o quê tornaram-se seus braços?/ Como se chamam suas pernas e seus pés?/ Sua boca foi o Brahmane, de seus braços fizeram o Guerreiro/ Suas pernas, é o lavrador, o Servidor nasceu de seus pés./ A Lua nasceu de seu espírito, o Sol nasceu de seu olho/ De sua boca Indra e Agni, de seu sopro nasceu Vâyu/ O Ar é oriundo de seu umbigo, de sua cabeça o Céu desenvolveu-se./ De seus pés a Terra, de sua orelha as Regiões: assim se constituiu o mundo/ [....] Quando os Deuses estendendo o sacrifício, amarraram o Homem por Vitima./ Os Deuses sacrificaram o Sacrifício ao Sacrifício: tais foram as leis primordiais./ Os poderes desse ato atingiram o céu, lá onde estão os santos antigos e os Deuses.

- Rig-Veda, " Hymne De L'Homme"


Nós invocamos Agni, as Árvores, as Plantas, os Vegetais, Indra, Brhaspati, Surya: que eles nos livrem da angústia ! Nós invocamos o rei Varuna, Mitra, Vishnou e Bhaga, Amsa e Vivasvant [....], o Deus Savitar, o Criador, Pusan e Tvastar que anda na frente do cortejo: que eles nos livrem da angústia! Nós invocamos os Gandharva e os Apsara [....], o Dia e a Noite, o Sol e a Lua [.....]: que eles nos livrem da angústia! Nós invocamos o Vento, Parjanya, o Espaço e as Regiões, todas as orientações celestes: que eles nos livrem da angústia ! Que eles me livrem da angústia, o Dia e a Noite e a Aurora: que ele me livre da angústia, o rei Soma [....] Nós invocamos aqui Bhava e Sharva, e Rudra o rei do rebanho: suas flechas que nos são familiares, que elas nos sejam sempre propícias! [.....] Os Deuses que residem no Céu e aqueles que residem no Espaço, e os Deuses poderosos que habitam na Terra: que eles nos livrem da angústia! Nós invocamos o Sacrifício, o Sacrificante, os Versos, as Melodias, os Remédios; nós invocamos as Fórmulas, as Libações: que eles nos livrem da angústia! [....] Nós invocamos as Estações, os Gênios das estações, os Casais de estações e os Anos, os Anos, os Anos, os Meses: que eles nos livrem da angústia! Venham, ô Deuses, du midi! Levantem-se do ocidente em direção do oriente; do oriente, do norte, os Poderosos, todos os Deuses, se reunindo aqui, que eles nos livrem da angústia! Nós invocamos aqui Todos-os-Deuses, fiéis a suas promessas, autores da ordem divina, com suas esposas: que eles nos livrem da angústia! Nós invocamos o Ser, o Senhor do Ser e o Soberano dos Seres: que todos os Seres reunidos nos livrem da angústia!

- Atharva-Veda-- ( In Le Veda, Trad.J.Varenne, Les Deux Océans, 2003)


Os Veda, textos fundadores.

Os Aryens, povo indo-europeu, se instalaram na Índia durante o segundo milenário antes de nossa era. Eles trouxeram no sub-continente a santa tradição oral deles que eles anotaram entre 1500 e 500 anos antes de Cristo. Os Veda (saber, em sânscrito) constituem um fascinante conjunto scripturaire, comparável à Bíblia por sua antiguidade, seu tamanho e sua qualidade literària. Ele dá seu nome à primeira religião indiana, o vedismo. Seus dados místicos, litúrgicos e especulativos serão a fonte principal do hinduísmo, como mostram os textos acima.


O sacrifício original

Extraído do Rig-Veda, ou "Veda das estrofes", a mais antiga e prestigiosa antologia védique, o primeiro texto é central: os brahmanes piedosos ainda o recitam cotidianamente. Mito cosmogonique, ele enuncia também as leis primordiais - naturais, religiosas e sociais - que fundam o vedismo, em seguida o hinduísmo. Sendo uma ordem cósmica possuindo duas dimensões, uma em si, o dharma, a outra em ato, o rita: nos humanos, ela se manifesta pelo rito e pela palavra sagrada.
No centro desse edifício simbólico e pratico, o sacrifício, rito par excellence pois ele reproduz a criação do mundo, que o mantém e regenera tudo dando um lugar essencial ao ser humano. O universo não nasceu do misterioso sacrifício do "O Homem" primordial (Purusha), pessoa divina e criadora "que é tudo o que é, o que foi e o que será?” Desmembrado, seu corpo gigantesco é a fonte do visível e do invisível: regiões do universo, estações, animais, humanos, "hinos e melodias" sagrados, deuses enfim (Viraj, Lua, Sol, Indra, Agni, Vayn).
Extraídos do mesmo organismo original, esses diferentes órgãos constituem um tudo harmonioso e hierarquizado, onde cada um leva ao mesmo tempo aos outros e a seu princípio comum: o deus anthropomorphe sacrificado. Esse mito explica e torna legítima a organização social indiana, stratifiée em quatro castas - brahmanes, guerreiros, lavradores e servidores - , segundo a dignidade relativa do órgão que foi a fonte de cada um.
Uma questão permanece, todavia: quem sacrifica quem, se tudo vem da oferenda do Purusha inicial, incluindo os próprios deuses que o sacrificam? Condicionado pelos limites da linguagem, esse paradoxo revela a prioridade do sacrifício ele mesmo, essência ao mesmo tempo do agir divino e da criação. Idéia sutil que resume esse démiurge original, simultaneamente ato sacrifical, destinatário, vítima e sacrificador através os deuses, os homens e o mundo que emanam todos dele mesmo.


Politeísmo e deus único

Nós o vemos, o politeísmo védique não exclui a existência de um único princípio divino, primordial e indefinido, de qual os inúmeros deuses particulares parecem os "aspectos", as "energias" específicas. Oração ligando essas dimensões único e plural do divino, o segundo texto ressalta a passagem de uma para outra. As divindades védiques secundárias (como os Gandharva e os Apsara) ou principais (rei Varuna, Mitra, Savitar e Soma, que se acrescentam às divindades citadas) são com efeito invocadas em primeiro cada uma com seu nome próprio antes de ser como um conjunto indiferenciado. "Todos-os-Deuses", "o Ser, o Senhor do Ser e o Soberano dos Seres".Aliando mitologia abundante e metafísica abstrata, essa dialética do um e do múltiplo anuncia o desenvolvimento futuro do hinduísmo, em torno do mistério da personalidade humana, cósmica e divina. As três figuras celestes que dominarão essa religião nascente jà foram citadas aqui, como : Vishnou, Rudra - quer dizer Shiva - e "o Criador", a saber Brahma - que é o misterioso Purusha sacrificado no primeiro hino.

- Èric Vinson - jornalista - Le Point - Les Textes Fondamentaux Des Grandes Religions D'Asie - Janvier - Février 2006.

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