sábado, 6 de outubro de 2007

Nietzsche, o Pensamento e o Estilo

Acontece que o pensamento seja a tal ponto imperioso e potente, a tal ponto irresistìvel e decidido, que ele faz explodir todas as formas pelas quais ele se manifesta. Sua "voz", sua intensidade, correndo o risco de não encontrar uma saìda, são as ùnicas coisas que importam. È preciso então modificà-lo em fluxo poético ou então, exprimi-lo em formulações densas, compactas, tão precisas quanto elas podem ser, ao mesmo tempo luminosas e impenetràveis.
Nietzsche se exprimiu dessa maneira no poema ( Assim falava Zarathoustra ) e no aforismo ( Aurora, Além do bem e do mal ou os Fragmentos).
Do fato mesmo da força de seu pensamento, Nietzsche se encontrou mais do que qualquer outra pessoa confrontado ao problema da forma na qual tantas vezes se choca a juventude do pensamento. Este foi, com efeito, o caso da filosofia alemã do começo do século XIX ( Hegel, Schelling ) de quem o entusiasmo se imobilizou muito rapidamente em uma série de tiques verbais e fòrmulas imòveis que não cessarão mais de congestionar a història. A filosofia não cessarà mais de encontrar-se confrontada entre a intuição e o sistema. No livro Fragmentos, Nietzsche fala vàrias vezes da " miseràvel grisaille" da lìngua de Hegel e do alemão de burocrata de Kant. Os filòsofos alemães escrevem uma lìngua embaraçada, pesada, sem forma, e isso piorou nos dias de hoje. Apenas Ludwig Wittgenstein, entre os contemporâneos, escreve uma lìngua digna do alemão.
Como mostra o livro Fragmentos que, de 1883 até 1890, ano do desmoronamento mental, contêm tudo o que escreveu Nietzsche, que dà ao estilo uma importância muito particular.
O pensamento filosòfico de Nietzsche se discerne perfeitamente no seu vocabulàrio simples e cotidiano: nenhum termo que não seja compreensìvel universalmente, ele emprega poucas palavras técnicas, apenas para esvazia-las e reduzi-las ao "senso verdadeiro", tão bem que o leitor participa ao desdobramento do filosòfico totalmente, ele é envolto por "alguma coisa de sùtil, de muito leve e quase etérea que foge quando nòs nos aproximamos" de qual Bergson fala se referindo a Spinoza, que Nietzsche cita por sinal muitas vezes e de quem ele diz, em uma carta a seu amigo Overbeck, que ele é " um predecessor e que predecessor", da mesma maneira que Schopenhauer. Ele falarà disso muitas vezes, por exemplo no livro Humano demasiadamente humano ( I,&475) ou no livro Fragmentos até em 1889.

Fundador irrealizado


Durante toda sua vida ( 1844 - 1900 ), Nietzsche encontrou-se confrontado em dois momentos, no cruzamento do excesso e da precisão. O transbordamento do pensamento é canalizado por uma expressão rigorosa. Jacques Derrida descreve esse cruzamento patético no seio da filosofia que também conheceu a audàcia de Descartes: Nietzsche a renova de maneira radical fazendo aparecer a necessidade desse "outro pensamento" que não cessa de perfilar-se embaixo dos grandes edifìcios filosòficos. Nietzsche com efeito não é o grande destruidor, mas de uma certa maneira o grande gerador de pensamentos que ainda não existiram, das coisas deixadas no nìvel subjetivo.Ele é o fundador do irrealizado. O escritor André Gide não se enganou " Sim, Nietzsche destròi, ele escreve em 1899, ele arruina, mas não é para perder a coragem, é feroz: é com nobreza, gloriosamente, "surhumainement", " como um conquistador novo violenta as coisas velhas", mas Nietzsche não podia imaginar a que ponto " as coisas velhas" iam com Staline e Hitler, submergir e destruir a Europa, essa Europa que era a sua maior preucupação, pois ele é com Heinrich Heine ( 1795 - 1856 ), no século XIX, aquele que sonha muito da Europa.
Contrariamente ao que foi muitas vezes escrito, ele também não é aquele que elogia a "besta loura" ou algum outro culto de força, tudo isso é o resultado das falsificações feitas na sua obra pela irmã, Elisabeth Ferter-Nietzsche ( 1846-1935), um espìrito estreito e fanàtico, grande admiradora de Hitler. Ora não existe nada mais afastado do nazismo do que o pensamento de Nietzsche, que se situa fora de todo programa e de toda ideologia.
A famosa " vontade de potência" que foi apenas o tìtulo de um livro possìvel e de qual tanto se falou, não é nada mais do que " perseverança no ser", resistência às injunções e aos mandamentos de todas formas, perseverança pronta a dar a volta sobre si mesma e que parece transformar-se, Wille zur Macht, ( vontade em direção da potência ) e não exercìcio de algum poder.
Indo do panfleto a forma poética ou retornando a formulação filosòfica, o pensamento de Nietzsche é essencialmente livre, nòs não podemos jamais situà-lo em uma dimensão sem falsificar pela omissão todas as outras.
Também não existe frases neutras na obra de Nietzsche, em permanência interpretada por mal entendidos: o " Surhomme" é dessa maneira a tradução aproximativa do alemão Übermensch: o " Surhumain"; der Mensch, é com efeito o ser humano e esse conceito não implica nenhuma procura de virilidade que o termo "Surhomme" portanto dà a entender. Zarathoustra, no livro Assim falava Zarathoustra (1883) não profetisa nada e ele não tem discìpulos: cada um é responsàvel de si-mesmo.
È da mesma maneira para o livro Além do bem e do mal ( 1886): trata-se na realidade do bem na medida em que ele é bom ( Gut ) e da malevolência ( das Böse ). O mal é um estado, mas das Böse ( a malevolência ), uma intenção. A moral é um risco e não uma certeza.

Interpretações imòveis


Tudo é sem cessar a reconsiderar, nada é definitivo, toda certeza é sempre feita para ser reconsiderada. O pensamento de Nietzsche recusa todo acomodamento, mas não se liga a nada, ele guarda os olhos bem abertos e não reprime nada : nisso ele é predecessor de Freud, que é incompreensìvel sem ele. Tudo o que Nietzsche escreve està presente na obra de Freud.
A filosofia contemporânea é então muito tributària de Nietzsche que fez circular esse ar novo de qual precisava um pensamento imòvel em uma representação constante de conceitos "definitivos".Nietzsche revigora os temas passados mas, justamente, ele não os destròi, ele não denuncia nada e não renuncia a nada.
Se ele critica Kant que ele chama " o grande chinês de Königsberg" ( a cidade que Kant nunca deixou) ou Hegel que ele acusa no seu livro Considerações intempestivas de 1876 de ter divinizado o sucesso, é para melhor ressaltar a importância capital. Se Nietzsche procede de Schopenhauer, o " grande Arthur, meu primeiro e ùnico educador" como ele escreve no livro Humano, demasiadamente humano, é porque ele estabeleceu os primeiros fundamentos de um pensamento que ele explora profundamente. Ele conservou o temperamento mais criticou severamente o pessimismo.
Foi Albert Camus que no livro o Homem revoltado, definiu da melhor maneira Nietzsche como o espìrito mais livre de todos, e contra quem são feitas muitas interpretações imòveis. È porque esse filòsofo, da mesma maneira que Kafka, em uma forma de expressão totalmente diferente, nunca pàra de "desviar" e surpreender: ele recusa as adesões, as submissões de toda ordem ou os fanatismos. Como Spinoza, Kant ou Hegel, justamente, ele sempre "combateu unicamente com a força do pensamento a superstição, a intolerância e o irracional".
Nietzsche de ontem é para amanhã.

- Georges-Arthur Goldschmidt, crìtico, tradutor de Peter Handke e de Nietzsche ( Assim falava Zarathoustra, LGF, 1983). Escritor, ele é o autor de Celui qu'on cherche habite à côté ( Verdier, 2007 ).

Nietzsche

Filòsofo mùltiplo com idéias revolucionàrias, Nietzsche rompeu com a rigidez da tradição racionalista, transformando a maneira de pensar e de exprimir a filosofia.

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