segunda-feira, 15 de outubro de 2007

As figuras da consciência

" Eis a relação do mestre e do servidor "

O conteùdo concreto da certeza sensìvel [ a certeza dada pelos sentidos ] a faz aparecer imediatamente como o conhecimento mais rico [....]. Esse conhecimento aparece além disso, como o mais verdadeiro; pois ele ainda não afastou nada do objeto mais o tem diante de si-mesmo em toda a sua plenitude. Na realidade todavia, essa certeza se revela de maneira explìcita como a mais abstrata e a mais pobre verdade. [....]
À pergunta: o que é o agora ? nòs respondemos, por exemplo, o agora é a noite. Para experimentar a verdade dessa certeza sensìvel, uma simples experiência serà suficiente. Nòs anotamos por escrito essa verdade; uma verdade não perde nada ao ser escrita e também pouco a ser conservada. Vamos rever agora a meio-dia essa verdade escrita, nòs devemos então dizer que ela se alterou. [....]
O mesmo caso se produz para a outra forma do isto, quer dizer para o aqui. O aqui é, por exemplo, a àrvore. Eu me viro, essa verdade desapareceu e se transformou em verdade oposta: o aqui não é uma àrvore, mais uma casa. O aqui ele mesmo não desaparece, mas ele é e permanece no desaparecimento da casa, da àrvore, etc. ; além disso ele é indiferente a ser casa ou àrvore. Novamente, o isto se mostra como simplicidade mediatizada, ou como universalidade.
A certeza sensìvel demonstra nela mesmo o universal como verdade de seu objeto.

- La Phénoménologie de l'esprit, tome I, I ( " La Certitude sensible ou le Ceci et ma visée du Ceci "), Hegel - Trad. J. Hyppolite, Aubier-Montaigne, 1941


Primeiro, a consciência de si mesmo é ser-para-si mesmo simples igual a si mesmo excluindo de si mesmo tudo o que é outro; sua essência e seu objeto absoluto são o Eu, e nessa immédiateté ou nesse ser de seu ser-para-si, ela é alguma coisa de singular. O outro para ela é objeto não essencial, marcado do caràter do negativo. Mas o outro também é uma consciência de si mesmo.

- La Phénoménologie de l'esprit, tome I, IV ( " La vérité de la certitude de soi-même" ), Hegel - Trad. J. Hyppolite, Aubier - Montaigne, 1941.


Existe combate; pois eu não posso me saber eu mesmo no meu contràrio [ o outro eu ] durante todo o tempo que ele é uma consciência imediata para mim. [....] O combate que traz o reconhecimento recìproco é um combate para a vida e para a morte. [....] Como a vida é tão essencial quanto a liberdade, esse combate, na qualidade de negação exclusiva, conduz primeiro à desigualdade, no fato que um dos combatentes preferindo a vida se conserva como consciência de si mesmo individualmente, mais ele abdica seu direito de ser reconhecido como livre; enquanto que o outro permanece na sua independência, e é reconhecido pelo primeiro como mestre. Eis a relação do "mestre" e do "servidor". Este, o servidor, trabalhando para o mestre, utiliza sua vontade individual e egoista, suprime a immédiateté do desejo, e por essa abdicação dele mesmo e pelo temor do mestre, traz o começo da sabedoria, a passagem para a consciência de si mesmo geral.

- Encyclopédie des sciences philosophiques, 431SQ., - Hegel - Trad. A.Véra, Germer - Baillière, 1867 - 1869.

A consciência vive na angùstia de sujar o esplendor de sua interioridade pela ação e l'être-là [o ser determinado ], e para preservar a pureza de seu coração ela foge o contato da efetividade e persiste na impotência teimosa, impotente a renunciar a seu Si Pròprio afinado até o supremo grau de abstração, a se dar uma substancialidade, a transformar seu pensamento em ser e a se confiar a diferença absoluta.
O objeto oco que ela cria para si mesma a enche então da consciência do vazio. [.....] Nessa pureza transparente de seus momentos, ela torna-se uma bela alma infeliz, como nòs a chamamos, sua luz se apaga pouco a pouco nela mesma, e ela se esvanece como um vapor sem forma que se dissolve no ar.

- La Phénoménologie de l'Esprit, tome II, VI ( " L'Esprit " ), Trad. J. Hyppolite, Aubier -
Montaigne, 1941.


As figuras da consciência


O livro La Phénoménologie de l'esprit ( 1807 ) examina os diferentes estados que percorre a consciêcia no seu debate interior com a verdade. Esse trabalho tem um começo e um fim. Ele começa com a " certeza sensìvel " e ele se termina no " saber absoluto ".



O saber absoluto


Essa ùltima expressão pode surpreender. Mas pouco antes Hegel, seu amigo de juventude Schelling afirmava que a filosofia tinha por objeto o absoluto de onde "émanaient" a subjetividade e a objetividade, o espìrito e a natureza.Contrariamente a essa filosofia dita da identidade, Hegel considera que o saber absoluto é uma verdadeira conquista da consciência, o resultado de um trabalho sobre ela mesma. Ele se encarna mais precisamente na filosofia, de qual os objetos são conceitos, por conseguinte produções do espìrito. Na filosofia, o espìrito não encontra nada de estrangeiro, ele està " auprès de lui-même ", por essa razão o caràter absoluto no sentido em que Schelling o compreendia.

A certeza sensìvel


Entre essas figuras da consciência, as que foram mencionadas acima são particularmente representativas. A primeira, a " certeza sensìvel ", constitue uma crìtica rigorosa do empirismo vulgar. A consciência " naïve " coloca com efeito a verdade mais correta au-dehors dela mesma, nas coisas concretas percebidas pelos sentidos. Mas dessa maneira, a consciência é imediatamente levada a se contradizer e a constatar que a verdade muda. Com efeito, a verdade sensìvel varia segundo os movimentos do "eu", que faz "office de point d'ancrage" para a certeza sensìvel, sem que ela o admita.

O mestre e o escravo


A segunda figura é a difìcil dialética " de la maîtrise " e da servidão. Ela apresenta a consciência que conseguiu se despreender da pura objetividade para se voltar em direção dela mesma e se afirmar como uma " consciência de soi ". Sua verdade consiste então em um mundo exterior e na sua pròpria consciência. Pois esse outro "eu" não é o seu e também não é um simples objeto. Cada uma dessas duas consciências reivindica sua verdade que ela vai querer impor a outra. Mas ela sò pode fazer isso pela força. È dessa maneira que s'engaje a "luta pelo reconhecimento". Esta se termina quando um eu aceita de se submeter ao outro. Ele se coloca assim ao serviço do "mestre".
Mas essa dialética terminarà se virando contra o mestre. Pois o serf, ou o escravo ( Knecht), para obedecer ao mestre, deve trabalhar. Seu trabalho o obriga a formar as coisas para o uso do mestre. Assim ele abandona a pura reivindicação da consciência de si pròprio para exprimir sua subjetividade no fruto de seu trabalho.Dizendo de outra maneira, a servidão permite à consciência de formar os objetos à sua imagem. Ela se reconcilia com a exterioridade objetiva, enquanto que a consciência do mestre " tourne à vide ".
Essa dialética influenciou demasiadamente o marximismo, que via nela um argumento em favor do proletariado contra o capitalismo. Em particular na França, graças aos cursos de Kajève, aos quais assistia uma boa parte da intelligentsia do começo dos anos 1930: Raymond Queneau ( 1903 - 1976 ), o autor do livro Dimanche de la vie, mais também o filòsofo e escritor George Bataille ( 1897 - 1962 ) e o psychanalyste Jacques Lacan ( 1901 - 1981 ).
Quanto a figura da " bela alma ", que é uma crìtica do romantismo segundo Novalis e da afirmação da infinita superioridade da alma sobre um mundo de qual ela não quer se rebaixar, ela interessou Lacan e seus alunos que a assimilaram à patologia do narcissisme.

F.G.

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