domingo, 29 de abril de 2007

"O cultivador sabe mais do que a administração"

O objeto dos governantes, ao procurar influir na produção, é, ou de determinar a produção de certos produtos que eles acreditam mais dignos de ser favorizados do que outros, ou então de prescrever maneiras de produzir que eles julgam preferíveis a outras maneiras. Os resultados dessa dupla pretensão, relativamente à riqueza nacional, serão examinados nos dois parágrafos desse capítulo. [...]
Através desse exame, nós veremos quais são as circunstâncias onde razões suficientes parecem comandar algumas derivações no caminho que parecem prescrever os princípios gerais. Na administração, os grandes males não vêm das exceções que nós acreditamos dever fazer às regras; eles vêm das falsas noções que nós formamos da natureza das coisas, e das falsas regras que nós impomos em conseqüência. Então nós fazemos o mal em grande, nós agimos sistematicamente ao contrário.[...]
A natureza das necessidades da sociedade determina a cada época, e segundo as circunstâncias, uma demanda mais ou menos enérgica de tais ou tais produtos. O resultado é que, nesse tipo de produção, os serviços produtivos são um pouco melhor pagos do que nos outros setores da produção, quer dizer que os benefícios que nós fazemos sobre o emprego da terra, dos capitais e do trabalho, são um pouco melhor. Esses benefícios atraem desse lado os produtores, e é dessa maneira que a natureza dos produtos se conforma sempre naturalmente às necessidades da sociedade. Nós já vimos que essas necessidades aumentam na medida em que a produção é bem maior, e que a sociedade em geral compra mais na medida em que ela tem mais coisas para comprar.
Quando, através essa marcha natural das coisas, a autoridade se mostra e diz: o produto que nós queremos criar, aquele que dá os melhores benefícios, e em conseqüência àquele que é o mais procurado, não é o que convêm; é preciso nos ocuparmos de outro produto, ela dirige evidentemente uma parte dos meios de produção em direção de um gênero em que a necessidade não é tão grande, prejudicando outro produto em que a necessidade é bem maior. [...]
A administração dizia [em 1794] que o valor produzido importava menos que a natureza dos produtos, e que ela preferia que um hectare de terra produzisse 20 francos de trigo em vez de 30 francos de forragem. Ela calculava mal; pois se o terreno produzia um hectolitro de trigo valendo 20 francos, esse mesmo hectare cultivado no prado, e dando um produto de 30 francos, teria fornecido um hectolitro e meio de trigo em vez de um hectolitro. Porque se o trigo estivesse assaz raro e assaz caro para que o hectolitro valesse mais que a forragem, a decisão era supérflua: o interesse do produtor era suficiente para lhe fazer cultivar o trigo.
Então só é preciso saber agora quem, a administração ou o cultivador, sabe melhor qual o gênero de cultura será mais vantajoso; e é permitido de supor que o cultivador que vive no terreno, o estuda, o interroga, que está interessado bem mais do que qualquer outra pessoa a ter o melhor proveito sabe bem mais sobre ele do que a administração.
Se nós insistimos, e se nós dissermos que o cultivador só conhece o preço normal do mercado, e não saberia prever, como a administração, as necessidades futuras do povo, nós podemos responder que um dos talentos dos produtores, talento que o interesse deles obriga a cultivar cuidadosamente, é não somente de conhecer, mais de prever as necessidades. [...]
O interesse pessoal é sempre o melhor juiz da dimensão do sacrifício e da indenização que nós podemos nos prometer; e se bem que o interesse pessoal se engana algumas vezes, é, considerando bem a situação, o juiz menos perigoso, é àquele em que os julgamentos custam menos. Mas o interesse pessoal não oferece mais nenhuma indicação, quando os interesses particulares não servem de contrapeso uns para os outros.

- Traité d'Èconomie Politique (1803),chap.17 - Tratado de Economia Politica- Jean-Baptiste Say


ESTADO E LIBERDADE DE COMÉRCIO

Teórico da economia política e empresário - ele dirigiu uma fiação de algodão, Jean-Baptiste Say (1767-1832), é incontestavelmente o chefe de fila da escola liberal francesa em economia política. A apresentação clara que ele propôs no seu "Tratado de Economia Política " (1803 ) da obra de Adam Smith lhe assegurará um renome imediato na Europa e nos Estados-Unidos. Essa celebridade porta até hoje com a célebre "loi de Say" ou "loi des débouchés", segundo a qual é a produção que abre novas oportunidades à produção porque o valor dos serviços produtivos pagos é igual ao valor da produção. Em conseqüência, não pode existir crises gerais de produção excessiva; somente crises locais podem aparecer se houve uma má repartição dos meios de produção entre os setores da economia.


Méritos da concorrência

No texto acima, Say examina a questão da intervenção do Estado e, mais particularmente, os efeitos nocivos de uma política intervencionista. Essa questão é crucial para os economistas liberais depois do debate sobre a liberdade do comércio dos grãos lançada pelos "physiocrates" a partir dos anos 1760. Say continua esse combate em favor da liberdade das trocas explicando que a intervenção do Estado implica deslocamentos de recursos produtivos de um setor a um outro, menos proveitoso. A argumentação é primeiro em termos de valor: é melhor produzir 30 francos de forragem do que 20 de trigo, pois a venda da forragem permitirá de obter mais trigo. Ele continua em seguida com o problema da informação que dispõe de um lado a administração, do outro o indivíduo: a primeira não é capaz de fazer melhor do que o segundo que sabe melhor o que pode ser proveitoso e possível de fazer. Say admite plenamente a conseqüência: os indivíduos podem se enganar, mas eles se enganam menos e com menos de conseqüências do que a administração. Mas Say insiste cuidadosamente sobre um ponto crucial: para que os interesses particulares possam chegar a um resultado socialmente favorável, eles devem ser postos em uma situação de concorrência.
O combate pela liberdade das trocas internacionais continua durante todo o século XIX, ainda mais que o protecionismo reaparece no fim do século.
O pensamento econômico liberal pode explicar esse último fenômeno? Say fornece o elemento de base, que foi em seguida completado pelo economista liberal italiano Vilfredo Pareto. O argumento repousa na diferença de sensibilidade do indivíduo de encontro aos efeitos de proteção da alfândega: nós vemos claramente os ganhos que nos beneficiamos (concorrência mínima, que provoca preços superiores), mas nós percebemos menos os inconvenientes (custo superior dos bens que beneficiam da proteção), ou porque estes não são relacionados à proteção da alfândega, ou porque eles são dificilmente perceptíveis para o consumidor dentre o conjunto de suas despesas.


Um liberalismo temperado

No entanto, o liberalismo de Say é repleto de seus engajamentos revolucionários (ele foi um dos voluntários do ano II) e de seu ideal republicano em favor de uma implicação do cidadão nas decisões política. Se o mercado libera os indivíduos das pressões Etàticas e pessoais, ele não assegura sempre a independência dos trabalhadores desqualificados, que correm o risco de sofrer com os efeitos negativos da potência econômica dos "senhores". Nesse caso, Say deixa pensar que uma ação do Estado relativa a esses "senhores" seria menos injusta que o fato de deixá-los em uma situação onde eles sofreriam uma dominação do mercado.

- Philippe Steiner, autor de "La sociologie économique" - A sociologia econômica - (La Découverte, 2005 )


Physiocrates

Economistas do século XVIII que, considerando a agricultura como a riqueza essencial das nações, preconizam uma política econômica liberal para assegurar seu desenvolvimento

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