segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Doutrina Geral de Martinez de Pasqually

Como todo o Esoterismo, a doutrina Martinista, tal como foi definida por Martinez de Pasqually no seu “Tratado de Reintegração dos Seres”, necessariamente recorre ao Esoterismo para exprimir verdades metafísicas, que é pouco perceptível e pouco exprimível por sua natureza. É assim que ela está integralmente vinculada à tradição Ocidental, e mais particularmente à cristã.

Símbolo dos Elu-Cohen
Loja Ocidente - Símbolo dos Elu-CohenEm relação ao problema da Causa Primeira (Deus), o Martinismo torna suas as conclusões a que chegaram os teólogos cristãos e os cabalistas hebreus, ao menos quanto aos princípios sobre os quais as diversas escolas estão sempre em acordo: o ternário divino, “pessoas divinas”, emanação, e etc…

Relativamente ao restante, é particularmente gnóstico - se bem que o que é apresentado nesta tese tem uma conotação diferente das escolas associadas a esse nome - porque coloca em princípio a igual necessidade do Conhecimento e da Fé, e o facto de que a graça deve, para actuar efectivamente, ser completada pela acção inteligente, compreensiva e livre do homem.

É por estes motivos que Martinez de Pasqually apresenta o esoterismo de sua escola sob o aspecto da tradição judaico-cristã. A lenda, que teve o Mestre muito certamente como autor, decorre de documentos tradicionais de propriedade de sua família desde que um avô, membro de um tribunal de Inquisição, os obteve de heréticos árabes ou judeus na Espanha. Esses documentos eram constituídos por manuscritos latinos, cópias dos originais árabes, derivados de clavículas hebraicas.

O que quer que seja, eis aqui um resumo do “Tratado de Reintegração dos Seres”, obra tão rara quanto obscura para quem não está familiarizado com as tradições gerais que a têm inspirado.

* * * * * * * * *

O mundo, considerado tanto como “o domínio material”, submetido aos nossos sentidos, e as “regiões espirituais” do além, não foi obra de Deus em si mesmo, considerado como Absoluto. E é o Evangelho de João que nos ensina:
“No começo (ou seja, quando iniciavam “os tempos”, períodos nos quais se manifestavam os entes relativos), era o verbo (o Logos, a Palavra Divina)”.
“O verbo estava próximo de Deus (expressão literal, correspondendo ao texto grego, melhor do que “com Deus” das versões ordinárias)”.
“O Verbo era deus… (e não deus maiúsculo; no texto grego não tem o artigo: o verbo era portanto um dos elohim ou filho-de-Deus: a palavra elohim significando em hebreu, ‘Ele-os-deuses’)”.
“Todas as coisas foram feitas por ele, e nada foi feito sem ele…” (João - cap. I).

Esse Logos, é aquele que a Cabala denomina de Adão Kadmon, aquele que, em todas as tradições religiosas antigas, cria os seres inferiores pela sua palavra, ao chamá-los (subentendendo-se “à Vida real, manifesta”): “E Adão deu seu nome a todas as bestas e aves do céu, a todos os animais dos campos, mas para o Homem, não encontrou auxiliar que se assemelhasse…”, (Génesis-II, 20)

Esses “animais dos campos”, esses “pássaros dos céus”, não são seres ordinários com esse nome. O sentido esotérico designa as criaturas, inferiores ao Homem-Arquetípico, que habitam os “planos” ou mundos do além, “regiões espirituais” às quais faremos alusão mais adiante.

Aquando dessa criação, Deus serviu-se, portanto, de um intermediário. O que nos é confirmado pelo capítulo I do Génesis (I-2,3): “A terra, (a matéria primordial, o caos) era informe e vazia, e o Espírito-de-Deus movia-se sobre as águas” (o Nous egípcio, o elemento mais subtil dessa matéria). O termo “Espírito-de-Deus”, maiúsculo, designando assim um Espírito, distinto de Deus, e não espírito dele: o que seria um contra-senso, Deus sendo necessariamente o espírito de si mesmo! E o Génesis não nos diz que “Deus se movia sobre as águas…”. É por isso que ele nos ensina mais adiante que: “O eterno Deus tomou então o Homem, e colocou-o no Jardim do Éden, para guardá-lo e cultivá-lo…”, (Génesis-II,15).

O Jardim é um símbolo, significando o conhecimento divino, acessível aos seres relativos. Com efeito, a Cabala, tradição secreta, é frequentemente designada como o “Pomar” místico. Em hebreu, pomar é guineth, palavra formada por três letras (guimel, noun, tau) iniciais das três ciências secundárias, chaves da Cabala: Guematria, Notarikon, e Temurah.

O Homem primitivo do qual o Génesis fala, no seu discurso puramente simbólico, não é um ser formado por carne como nós, mas um espírito, emanado de Deus, composto de “forma”, que é o que o Génesis chama ao “corpo”, análogo ao “corpo glorioso” definido pelos teólogos, criado pelo Deus eterno, e de uma centelha animadora, que é, ela, integralmente divina, pois o Génesis diz-nos que esse foi o “sopro” de Deus. O nosso Homem-Arquetípico é portanto semi-divino. Ele é proveniente da Matéria primordial (do caos, composto de terra e de água - simbólicas), pela sua “forma”, ele é proveniente de Deus por esse sopro divino que anima, sopro vindo de Deus.

Adão e o Verbo Criador são semelhantes porque o Homem-Arquetípico continua, no simbólico “Jardim” do Éden, a obra iniciada pelo Espírito-de-Deus. Entretanto o Verbo Criador e o Verbo Redentor são diferentes. É certo, e é indiscutível, que Cristo (que Martinez chama de o Reparador) é simultaneamente Deus (pela sua origem) e homem (pela sua encarnação). A Teologia já o demonstrou. Mas, da mesma forma que uma criança de dez anos e um ancião que virá a ser mais tarde, são um só e o mesmo ser (com características e aspectos diferentes)!

Há entre eles continuidade de consciência absoluta, apesar de não haver semelhança de aspecto ou de reações inferiores. Num grau similar, a alma tendo animado um corpo humano comum, depois animando outro, vinte séculos após, será sempre identicamente a mesma nas suas duas manifestações diferentes, já que as ditas manifestações podem ser aparentemente opostas, em razão do “jogo” oscilante definido na expressão usual do “Karma”.

Paralelamente a Adão Kadmon (o Homem-Arquetípico ou Cósmico), há outros seres, provenientes de uma Criação anterior, diferentes em natureza e em “plano”, sem relação àqueles que nos detalha a tradição do Génesis. Essa é a criação dita dos “Anjos”, que outras tradições nos referem e que é analisada por todas as teologias. São essas duas criações diferentes que o Génesis subentende no seu primeiro versículo: “No começo Deus criou o céu e a terra”. Assim o Génesis descarta a primeira Criação (sobre a qual parece que Moisés não possuía nenhuma informação) e passa à segunda: “A terra era informe e vazia, as trevas estavam na superfície do abismo…” (Génesis - I,2).

Outros elementos da tradição judaico-cristã ensinam-nos o que são os seres dessa criação primitiva (simbolizados pelo céu), ou seja, os Anjos, que por uma prova efectuada pela Vontade de Deus se dividiram em duas categorias, os Anjos fiéis e os Anjos rebeldes. Isso tem sido mal interpretado. Deus, princípio de infinita perfeição, não poderia tentar os Anjos após emaná-los, nem rejeitá-los, após a sua involução. Ao contrário, certas entidades, chegadas ao término da Missão para a qual Deus as tinha emanado (quer dizer, libertado, dotando-as assim, necessariamente, de Livre-Arbítrio), recusaram-se a reintegrar-se no Absoluto, no Plano Divino, na fonte do Bem Supremo. Elas têm, assim, preferido o eu momentâneo, perecível e ilusório, ao eterno, real, e imperecível. Elas têm preferido viver “fora” de Deus a serem re-absorvidas, e a beneficiarem, assim, das suas perfeições infinitas.

Portanto, são elas que estão momentaneamente distanciadas de Deus, por um acto livre, porém errado. Não foi o Absoluto que as rejeitou injustamente, nem é Ele a causa do exílio delas. Entretanto, o retorno à condição anterior e a redenção permanecem possíveis, quando a entidade celeste consentir em retomar o caminho do Divino.

Mas, na espera desse retorno à luz e à verdade imanentes, elas permanecem devido às suas atitudes egoístas: rebeladas (da oferta divina primitiva e permanente); desgarradas (porque estão fora do seu destino legítimo); perversas (pois vivem fora do Bem Supremo e portanto “no mal”).

Ora, toda a coisa corrompida tende, por sua natureza, a corromper o que é sadio. E, no domínio dos seres espirituais, e sobretudo naquele dos seres que possuem corpos materiais, porque nele se combinam: a inveja e o ciúme (consciência, apesar de tudo, de uma inferioridade real), o orgulho (vontade de ter a última palavra) e a inteligência (que permanece a mesma, mas na manifestação activa do máximo de seus defeitos).

É por isso que a tradição nos diz que a Colectividade dos Seres espirituais pervertidos (a Egrégora do mal), designada pela imagem da Serpente, ficou enciumada desse ser, superior a eles, e “imagem” de Deus ao qual essas entidades decaídas pretendiam subtrair.
Elas agem portanto (telepaticamente, sem dúvida) sobre Adão Kadmon, incitando-o a ultrapassar os limites de suas possibilidades naturais.
Ser misto por sua natureza, meio espiritual e meio formal, andrógino no qual a Forma e o Espírito se penetravam mutuamente, o Homem-Arquetípico deveria manter uma certa harmonia, um equilíbrio necessário, nesse Domínio no qual Deus o tinha situado. Ele devia respeitar a sua ordem e fazer a sua obra, continuar a tarefa desse “Espírito-de-Deus” do qual ele era o reflexo, o intendente, o “Mestre-de-Obras” celeste imediato… É a esse papel, o de Arquitecto do Universo, que Adão Kadmon tinha sido candidato, mas de um Universo mais subtil que o nosso, o “Reino que não é deste mundo”, do qual falam os Evangelhos.

Sob o impulso de entidades metafísicas pervertidas, o Homem-Arquetípico converteu-se em demiurgo independente. Reiterando a sua falta, ele modificou e perturbou as leis que tinha por tarefa fazer cumprir. Ele tentou, audacioso e rebelde, fazer-se criador por sua vez, e igualar por suas obras o próprio Deus. Ele só logrou modificar o seu Destino primitivo.

É o que as duas lendas idênticas, a de Lúcifer, primeiro dos Anjos, e aquela de Adão primeiro dos homens, nos informam em seus desenvolvimentos paralelos. É talvez dessa tradição que decorre o costume de consagrar aos deuses ou a Deus as primícias de uma colheita ou o primogénito das manadas. E é um facto que na simbólica história da Humanidade que nos conta o Génesis, todos os descendentes: Caim, Cam, Ismael, Esaú, etc… são misteriosamente marcados por um destino contrário.

Mas enquanto Deus, com suas possibilidades infinitas, pode tirar qualquer coisa do Nada, o homem, criatura com possibilidades limitadas, pode apenas modificar o que já existe, sem nada extrair desse mesmo Nada. O Homem-Arquetípico querendo criar seres espirituais como Deus havia criado os Anjos, só conseguiu objectivar os seus próprios conceitos. Desejoso de lhes dar corpos, ele nada pôde além de integrá-los na matéria mais grosseira. Querendo animar o caos (as trevas exteriores) como Deus havia animado o mundo metafísico que lhe tinha sido primitivamente confiado, ele nada fez além de se enterrar a si próprio.

Com efeito, Deus “sendo”, no sentido mais absoluto da palavra (”eu sou aquele que é”, disse a Moisés no Monte Sinai), não existe coisa nenhuma pré-existente. Para criar a matéria primitiva, Deus tem simplesmente reconstruído uma parte das suas infinitas perfeições, a partir de uma porção da sua essência infinita. Essa reconstrução parcial da perfeição espiritual mais absoluta tem inevitavelmente conduzido à criação da imperfeição material relativa. Isso justifica que a Criação, qualquer que seja, não possa jamais ser perfeita. Ela é necessariamente imperfeita pelo facto que ela não é Deus. Em imitação do Absoluto, Adão Kadmon vai portanto tentar criar uma “matéria primeira”. Alquimista inexperiente, isso será a origem de sua Queda.

O Homem-Arquetípico é um ser andrógino. O Génesis (cap. I, 27, 28) diz-nos que “Deus criou o Homem à sua imagem: macho e fêmea, ele criou-os”. É o elemento negativo, feminino, que Adão vai objectivar fora de si mesmo. É esse “lado” esquerdo, feminino, passivo, lunar, tenebroso, material que se vai separando do “lado” direito, masculino, activo, solar, luminoso, espiritual, dando nascimento a Eva. A Fêmea-Arquetípica é portanto extraída de um dos dois “lados”do andrógino, e não de uma das suas “costelas”…(todas as religiões antigas conheceram um ser divino, original, que era simultaneamente macho e fêmea).

Lê-se no Génesis (cap. II,23, 24): “E Adão disse: Esta é enfim os ossos dos meus ossos e a carne da minha carne”, ele conserva portanto o espírito, a alma. Ela será chamada Fêmea - em hebraico Isha -, porque ela foi tirada do Homem - em hebraico Ish.

É essa Matéria nova, a Eva do Génesis, a Fêmea simbólica, que Adão “penetra” para criar nela a Vida. O Homem-Arquetípico degradou-se, assim, tentando igualar-se a Deus. O seu novo domínio, é o mundo hílico da Gnose, o nosso universo material, mundo pleno de imperfeições e de maldades. O pouco de bem que nele reside provém das antigas perfeições do Homem-Arquetípico.Cindidas, pois, em dois seres diferentes, a soma dessas perfeições originais não pode ser total em nenhum deles… Houve, portanto, uma queda.

É por isso igualmente que a natureza tem sido deificada pelos cultos antigos. Ela era, portanto, a Mãe de tudo que é, mas de tudo isso que está “sob os Céus”, simplesmente Ísis, Eva, Deméter, Rhéa, Cibele, não são mais do que símbolos da natureza Material, emanada de Adão Kadmon, personificada pelas Virgens Negras, símbolos da Matéria prima.

A essência superior de Adão Kadmon, integrado no seio da matéria nova, tornou-se o Sopro, expressão alquímica que designa a alma do mundo. A essência secundária, o mediador plástico, e que constituía a “forma” do Adão, o seu duplo superior, tornou-se o Mercúrio, outra expressão alquímica designando o Astral dos ocultistas, o plano intermediário. A matéria vinda do Caos secundário, é o Sal alquimista, o suporte, o receptáculo, a prisão. Paralelamente, podemos dizer que Adão se tornou o Sopro, que Eva doou o Sal, e que o Caim do Génesis é o Mercúrio dessa tríade simbólica. Temos o que a alquimia conhecia também pelos nomes de Rei, de Rainha e de Servidor dos sábios…

Compreende-se também porque é que, em todos os seus graus, a Matéria Universal é vivente, assim como o admite a antiga alquimia e a moderna química, e como, nas suas manifestações, ela pode ser mais ou menos consciente e inteligente. Através dos quatros reinos da Natureza, mineral, vegetal, animal, hominal (entre os quais não há qualquer solução de continuidade), é o Homem-Arquetípico, o Adão Kadmon, a Inteligência demiúrgica, que se manifesta, dispersa, esbanjada, aprisionada. É esse o revestimento das “peles de besta” de que nos fala o Génesis: “E Deus fez para o Homem e para a Mulher ‘vestes de peles’ e os revestiu delas…” (III,21). Esse Universo novo tem-se igualmente tornado o refúgio das Entidades decaídas. Elas têm-se refugiado aí para se distanciar ainda mais do Absoluto, na quimérica esperança de escapar das Leis eternas, omnipresentes.

Os Seres maléficos têm assim um interesse primordial em que esse Homem, disperso mas omnipresente no seio da Matéria constitutiva do Universo visível, continue a organizar e animar esse domínio, desde então o deles. Como a alma do Homem-Arquetípico é prisioneira da Matéria universal, a alma do homem individual é prisioneira do seu corpo material. E a morte física (o único efeito significativo que ele ganhou, como nos diz o Génesis….) e as reencarnações que se sucedem são os meios pelos quais as Entidades decaídas manifestam a sua ascendência sobre o Homem. Compreende-se melhor a palavra do Redentor, “ouvida” pelos Profetas, com Isaías: “Ó morte, onde está tua vitória? Ó morte onde está teu aguilhão?” (o aguilhão dos sentidos, que incita a alma separada a se reencarnar em seu corpo material).

O Poder, a Sabedoria, a Beleza que se manifestam ainda neste Universo material, são esforços do Homem-Arquetípico para retornar ao que era antes da sua Queda. As qualidades contrárias são provenientes das entidades decaídas, a fim de manter o “clima” que elas quiseram fazê-lo criar, para substituir aí tal como elas quiseram anteriormente, quando deliberadamente interromperam seu retorno ao Absoluto.

O Homem-Arquetípico não retomará a posse do seu primitivo Esplendor e da sua Liberdade a não ser que se separe dessa matéria que o engolfa por todos os lados. Para isso, é necessário que todas as células que o compõem (ou seja, os homens individuais) possam, após as suas mortes naturais, reconstituir o Arquétipo, reintegrar-se aí definitivamente, escapando assim dos ciclos de reencarnação.

Assim, os Microcosmos reconstituirão o Macrocosmos. Os Homens-Arquetípicos, reflexos materiais do Arquétipo, são, portanto, igualmente (alguns degraus abaixo) reflexos divinos. Como o Arquétipo é, ele também, o reflexo de Deus, do primitivo Verbo Criador ou Logos, do “Espírito-de-Deus” do qual fala o Génesis.

Nisto consiste portanto o “Grande Arquitecto do Universo”. Todo o culto de adoração dedicado a este último é portanto um culto “satânico”, porque é prestado ao homem e não ao Absoluto. É por isso que a Maçonaria o invoca sem o adorar. Mas, porque o Homem mergulhado na atmosfera demoníaca do mundo Material onde respira a cada instante o intelecto maléfico, diz-nos Martinez de Pasqually, e porque parece estar em má posição para aí resistir, o criador reestabeleceu o equilíbrio destacando do seu Círculo Espiritual Divino um Espírito Maior para ser o guia, o conselheiro e o companheiro do Menor que foi emanado e desceu da Imensidade Celeste para ser incorporado no Mundo Material (ou centro da matéria elementar) para seguir actuando, segundo o seu Livre-arbítrio, na esfera terrestre.

Mas, o conselho de um Espírito Maior não é suficiente. É necessário ainda o socorro operativo de um Eleito Menor. A capacidade que lhe confere a sua “reconciliação” é dupla. Ele transmite directamente as instruções do Criador acerca do culto teúrgico que deve ser prestado; ele comunica aos “homens de desejo” aos quais são enviado os dons que ele próprio recebeu, marcando no carácter deles o “selo” místico sem o qual nenhum Menor pode ser reconciliado.

Essa ordenação misteriosa é a condição essencial de sua “reconciliação”, pois sem ela, quaisquer que seja seus méritos pessoais, um Menor permanece “na privação”, quer dizer, sem comunicação com Deus.

a) Os seres espirituais são os Eons da gnose, as Ideias-Matrizes que vivem no seio da Divindade.
b) Os Espíritos Superiores, ditos ainda Espíritos Denários, ou Espíritos Divinos, são as entidades sephiróticas da Cabala, os Nomes Divinos.

Os Espíritos Maiores asseguram a correspondência do homem com Deus, limitando o domínio inferior, composto pelos mundos celestes e terrestres. Agentes das Leis do Universo, estes seres Supra-celestes são responsáveis pela conservação do “tempo”, ou seja, da Energia Vital no Mundo Material, mas eles não têm poder de produzir essências materiais.

Os Espíritos Inferiores garantem a existência da Matéria. São as Forças dos Elementos, os Seres da Região Celeste astral Superior, os Génios Planetários, estelares, etc.

Os Espíritos Menores, ou Menores Espirituais asseguram a Terrestre edificação do Mundo Material. São principalmente as Almas Humanas.
Esta última classe subdivide-se em quatro séries:

a) Menores Eleitos: são dez grandes guias da Humanidade - Abel, Enoque, Noé, Melquisedek, José, Moisés, David, Salomão, Zorobabel, Jesus.
b) Menores Regenerados: os Adeptos, os Mestres na doutrina espiritual. Este estágio é aquele a que chegam os Rosa-Cruzes.
c) Menores Reconciliadores: os iniciadores da ordem, dos graus inferiores.
d) Menores em Privação: os Profanos.

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Para escapar dos ciclos das reencarnações sucessivas neste mundo infernal (inferno: lugar baixo), é necessário que o Homem individual se dissocie de tudo o que o arremessa na Matéria, livrando-se assim da escravidão das sensações materiais. É-lhe necessário também elevar-se moralmente. Contra essa tendência rumo à Perfeição, as Entidades decaídas lutam sem cessar, tentando de mil maneiras, a fim de atirá-lo no seio do mundo visível e de conservar sobre ele o seu império oculto.

O homem individual deve lutar contra elas, desmascarando-as e rejeitando-as para fora do seu domínio. Ele assim chegará, por um lado, à Iniciação - que o re-liga aos elementos do Arquétipo já reunidos e constituindo a esotérica “Comunhão dos Santos” -, por outro lado, pelo Conhecimento Libertador, que lhe ensina os meios de apressar, para o resto da Humanidade cega, e pelo seu trabalho pessoal, a ultrapassagem definitiva.

Nessas últimas possibilidades, então principalmente as grandes Operações Equinociais, que tendem a purificar a Aura terrestre pelo meio de exorcismo e de conjurações, submetidos aos ritos de Alta Magia e que os Elu-Cohens denominavam os “Trabalhos” ou o “Culto”.

Somente aquando desta definitiva liberação individual ocorrerá enfim a grande liberação colectiva, a única a permitir a reconstituição dos arquétipos, e a sua posterior reintegração no Divino que a emanou outrora. Abandonada a si mesma pelo seu animador, o Mundo da matéria dissolver-se-á, não sendo mais vivificado, harmonizado, conduzido, pelo Arquétipos. Sob o impulso, naturalmente anárquico, das Entidades decaídas, esta desagregação das partes do Todo acelerar-se-á. O Universo acabará então; será o “fim do Mundo” anunciado pelas tradições universais.

“Como um livro que viramos, o céu e a terra passarão…”. A essência divina recuperará gradualmente as “regiões” da sua essência de onde ela foi primitivamente retirada. As ilusões momentâneas, baptizadas com o nome de criaturas, de seres, de mundos, desaparecerão porque Deus é tudo, e Tudo está em Deus, embora nem Tudo seja Deus! O Absoluto nada tirou de um Nada ilusório, que somente tivesse existido fora de Si, sem ser Ele-mesmo.

Nada além desta reconstrução da divina essência, teria permitido a Criação dos Mundos, angélicos, materiais, etc… Como foi também a reconstrução desta mesma essência, que permitiu a emanação dos Seres espirituais. E desta maneira efectuar-se-á a simbólica “vitória” do Bem sobre o Mal, da Luz sobre as Trevas, por um simples retorno das coisas ao Divino, por uma re-assimilação dos seres purificados e regenerados.

Este é o esotérico desenvolvimento da Grande Obra Universal.

Robert Ambelain

Traduzido originalmente de Ambelain, Robert : Le Martinisme: história et Doutrine, Paris, Editions Niclaus, 1946, pp 30-40

Adaptado do original em http://www.martinismo.hpg.ig.com.br/pasqually.htm


2 comentários:

Daniel R. Placido disse...

Vi um comentário seu deixado em meu blog, propondo uma parceria entre nós; vim aqui visitar seu blog, e gostei do conteúdo, principalmente esta postagem sobre martinismo, tradução do R. Ambelain.

Podemos fazer uma parceria: proponho que cada um de nós, coloque link do blog do outro, na página de rosto, como indicação.

Daniel Placido
Abraços.

Daniel R. Placido disse...

Olá,

Como combinado, já coloquei o link para este blog, no layout do meu.

Vamos nos falando.

Abraços.